
A semana começa sob intensificação da crise entre Brasil e Estados Unidos e risco de novas sanções, em desdobramento dos mandados cumpridos na sexta-feira (18) contra Jair Bolsonaro. O ex-presidente está usando tornozeleira eletrônica e sem acesso às redes sociais por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Em Brasília, aliados de Bolsonaro acreditam que mais punições serão impostas por Donald Trump.
O presidente estadunidense já anunciou a taxação de produtos brasileiros em 50% a partir de 1º de agosto e vinculou a medida ao que considera "uma perseguição contra Bolsonaro", réu no STF por tentativa de golpe de Estado. Agora, com a determinação de ações cautelares pela Corte, que apontou risco de fuga do ex-presidente, a dúvida é se Trump responderá com outras retaliações no campo econômico, o que prejudica todo o país, ou se focará em punições direcionadas a ministros do STF.
— Mais medidas restritivas econômicas e políticas virão dos Estados Unidos. Não queremos prejuízos para a população, mas isso não está e nunca esteve na nossa alçada — afirma o deputado federal Ubiratan Sanderson (PL-RS).
Ele menciona a possibilidade de agentes políticos serem proibidos de entrar nos Estados Unidos e cogita a hipótese de Trump orientar os cidadãos do seu país a não viajarem para o Brasil, a exemplo do que foi feito em maio com a Venezuela, sob alegação de "perigo extremo".
— É uma situação que poderá surgir e teria repercussão grande no turismo — diz Sanderson.
Sexta-feira tensa
Na sexta-feira, horas após Bolsonaro ter recebido a tornozeleira de monitoramento, os Estados Unidos responderam com a revogação dos vistos de Moraes e de outros sete ministros da Corte: Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Cármen Lúcia, Edson Fachin e Gilmar Mendes. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também sofreu a suspensão do direito de entrar nos Estados Unidos.
Também na sexta, após o anúncio das retaliações aos magistrados, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) escreveu em uma rede social: "De garantido só posso falar uma coisa: tem muito mais por vir!" Ele está morando nos Estados Unidos, onde se vale das conexões políticas com o trumpismo para articular a aplicação de sanções ao Brasil na tentativa de obter uma anistia em favor de seu pai, conforme as investigações.
Eduardo, que estava licenciado do mandato na Câmara até o domingo (20), tem requisitado abertamente a aplicação da chamada Lei Magnitsky contra Moraes. A medida traria restrições financeiras ao ministro e a outros alvos. A norma tem o condão de proibir empresas estadunidenses de realizar transações e negociações com os penalizados, o que pode dificultar o acesso a cartões de crédito, serviços do sistema bancário, companhias aéreas e multinacionais.
Eduardo também menciona outra legislação: a International Emergency Economic Powers Act (Ieepa), instrumento norte-americano que permite restrições financeiras e congelamento de ativos de indivíduos e entidades estrangeiras.
Opiniões divididas
Uma parcela de aliados de Bolsonaro avalia que as sanções deveriam se restringir aos membros do STF. A penalização no campo econômico irá prejudicar as exportações do Brasil e atingir diversos setores da economia, o que deverá impactar negativamente no Produto Interno Bruto (PIB).
Pesquisas de opinião mostraram que a população brasileira, em maioria, considera as medidas de Trump injustas. Isso reacendeu um sentimento de defesa da nação e permitiu recuperação de popularidade para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem discursado a favor da soberania do Brasil e das suas instituições.
O tarifaço de Trump também desgastou a imagem de Bolsonaro. Nesse aspecto, uma parte do bolsonarismo tem receio de ficar marcada no imaginário popular como responsável pelas penalidades impostas ao Brasil, um passivo eleitoral. A reação, até o momento, é a tentativa de culpar Lula, Moraes e o STF pela crise. Outra consequência da iniciativa de Trump foi a divisão da direita brasileira, gerando embate público entre Eduardo e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Embora uma parcela do bolsonarismo prefira limitar as punições aos membros do STF, Eduardo já defendeu as sanções tarifárias de Trump. O ex-presidente Bolsonaro afirmou que a taxa de 50% poderia ser retirada com a aprovação de uma anistia para os envolvidos nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023.
Apesar do recesso, aliados tentarão articulação no Congresso
Na sexta-feira, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), divulgaram notas confirmando o recesso parlamentar por duas semanas, conforme estabelecido previamente. Nesse período, não serão realizadas votações em plenário nem reuniões das comissões. As atividades legislativas serão retomadas somente na semana do dia 4 de agosto. Foi uma resposta dos líderes do Congresso ao movimento de bolsonaristas que, após o ex-presidente ser alvo de mandados, tentaram suspender o recesso para avançar em medidas contra o que chamam de "politização do judiciário".
Apesar da manutenção do recesso, aliados de Bolsonaro estarão em Brasília nesta segunda-feira (21). Sanderson afirma que ele e outros parlamentares tentarão falar pessoalmente com o líder de direita "para ver qual direcionamento ele vai dar". Em outra frente, será retomada a insistência para a votação do projeto de lei que prevê anistia para os envolvidos com os atos golpistas.
— Vamos conversar com o Hugo Motta para que a anistia seja levada à pauta e votada. A minha percepção é de que, se for à votação na Câmara, será aprovada. Só não foi votado porque o presidente da Câmara não quis, achou que não era oportuno — diz Sanderson.
O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) protocolou no sábado (19) um requerimento solicitando o cancelamento do recesso parlamentar e a convocação de sessão extraordinária no Senado. O parlamentar, em nota, mencionou suposta "escalada de arbitrariedade" do Judiciário e defendeu a apreciação de pedidos de impeachment contra ministros do STF.
Medidas cautelares
As medidas cautelares contra Bolsonaro, adotadas pela Justiça como alternativa mais branda à prisão, foram cumpridas na última sexta-feira por determinação de Moraes, a pedido da Polícia Federal e com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Os despachos são parte de um novo inquérito que apura os possíveis crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação penal envolvendo organização criminosa e atentado à soberania nacional.
Eduardo e o seu pai, Bolsonaro, são investigados. Além da tornozeleira, Bolsonaro sofreu buscas na sua casa, teve o telefone apreendido e ficou impedido de utilizar as redes sociais e de falar com o filho Eduardo. O ex-presidente também deve cumprir recolhimento domiciliar noturno e está impedido de se aproximar de sedes de embaixadas estrangeiras.
O entendimento da PGR, acatado pelo STF, é de que havia risco de fuga do ex-presidente. Ele estaria auxiliando Eduardo na busca por retaliações de uma nação estrangeira para interferir nos processos judiciais que correm no Brasil.


