Após um final de semana de inédita tranquilidade, 45 dias depois da delação da JBS, o Planalto voltou a viver momentos de tensão extrema nesta segunda-feira (3) com a prisão de Geddel Vieira Lima. O ex-ministro e amigo do presidente Michel Temer foi detido em Salvador (BA), suspeito de obstrução à Justiça. Teve prisão preventiva decretada pelo juiz Vallisney Oliveira, titular da 10ª Vara da Justiça Federal no Distrito Federal.
Geddel é um dos expoentes do seleto grupo do PMDB que desde os anos 1990 desfruta de absoluta confiança de Temer. Além dele, a primazia é (ou era) concedida a Henrique Eduardo Alves, Moreira Franco e Eliseu Padilha. Alves foi preso em decorrência da Operação Cui Bono, da qual Geddel também é alvo. Moreira (Secretaria-Geral da Presidência) e Padilha (Casa Civil) são ministros e despacham no Planalto.
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A prisão de Geddel foi reflexo de informações prestadas ao Ministério Público Federal (MPF) por Lúcio Funaro. Preso desde julho de 2016, ele era operador financeiro do deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e vinha sendo assediado por Geddel para evitar que fechasse acordo de delação premiada. Em negociação para aderir à colaboração, Funaro entregou à Polícia Federal (PF) registros de chamadas telefônicas do ex-ministro para sua mulher, Raquel, por meio do aplicativo WhatsApp.
Contato logo após delação da JBS
Há pelo menos 12 "prints" das ligações de "Carainho" – como Geddel era identificado na agenda de Raquel – em oito dias diferentes. Todas as ligações ocorreram após a divulgação do conteúdo da delação da JBS – o primeiro telefonema ocorreu às 22h59min de 17 de maio, poucas horas após a eclosão do escândalo. Funaro também disse ter repassado a Geddel R$ 20 milhões em dinheiro vivo, a título de propina pela liberação de empréstimos da Caixa Econômica Federal a frigoríficos (leia mais clicando aqui).
No pedido de prisão preventiva, o MPF também cita revelações sobre Geddel feitas por dois delatores da JBS, o empresário Joesley Batista e o diretor jurídico do grupo, Francisco de Assis e Silva. De acordo com os executivos, Geddel era o principal interlocutor do governo com a empresa. Resolvia pendências e cobrava pagamentos periódicos da JBS para Lúcio e Cunha permanecerem em silêncio na cadeia. Foi para Geddel que Cunha pediu ajuda ao receber a PF na porta de casa, em outubro do ano passado.
– Geddel, vou ser preso! Vocês precisam fazer alguma coisa – disse Cunha, ao telefone.
Nas últimas semanas, o ex-ministro pressentia que poderia ser detido a qualquer momento. Em 12 de junho, entregou petição ao relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, na qual colocava à disposição seu passaporte e sigilo bancário. No documento, seu advogado citou notícia veiculada na imprensa segundo o qual seria "o próximo alvo do Ministério Público". Além de sustentar que não havia motivos para medidas mais graves contra si, Geddel se comprometia a não movimentar mais do que R$ 30 mil em suas operações bancárias.
Líder do governo no Senado evita comentar
No despacho assinado nesta segunda, o juiz Vallisney Oliveira diz que "a prisão de Geddel Lima é medida que se impõe, por haverem provas, até o momento, de sua participação no supramencionado esquema ilícito, havendo o perigo de que se permanecer solto possa atrapalhar as investigações na Operação Cui Bono".Transferido no início da noite para Brasília, está sob custódia na Superintendência da PF, onde até sábado estava preso o ex-assessor da Presidência Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), indicado por Temer para suceder o ex-ministro como interlocutor do governo junto a JBS.
– Geddel Vieira Lima era uma pessoa que fazia a interface entre Joesley e o Palácio. Segundo Joesley, falar com Geddel era o mesmo que falar com Michel Temer – disse Assis e Silva aos procuradores da Lava-Jato.
A prisão do ex-ministro desfez ambiente de otimismo no Planalto. Desde que a delação da JBS veio à tona, em 17 de maio, o governo não se sentia tão seguro em meio à crise política. As decisões do STF que devolveram na sexta-feira o mandato de Aécio Neves (PSDB-MG) e tiraram Rocha Loures da cadeia haviam dado a Temer confiança para convencer a base governista a barrar na Câmara a denúncia por corrupção passiva. Ele passou o final de semana se reunindo com auxiliares para traçar a estratégia de defesa e os argumentos que os parlamentares deveriam usar para arquivar a acusação. Tão logo a notícia da detenção de Geddel chegou ao Planalto, interlocutores de Temer evitaram traçar prognósticos.
– Acho que a prisão deve ser o último recurso, mas não conheço o processo, então prefiro não comentar. Isso (denúncias) não pode ser encarado como a única pauta. É preciso tocar o país – desconversou o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).