Em geral, as regiões centrais das cidades são consideradas o "coração" delas, porque devem ser pulsantes. Em Caxias do Sul, isso não é diferente. Mas, além das atividades comerciais, é preciso pensar em como transformar o espaço em um local de convivência para os moradores, e se essa é a escolha estratégica quanto ao modelo de cidade a ser buscado.
Recentemente, o centro de Caxias do Sul recebeu quatro eventos de grande porte: a programação da Temporada da Cultura Negra, os shows do Caxias Soul Duetos, o 15º Mississippi Delta Blues Festival e, a partir de agora, a 8ª edição do Grande Espetáculo de Natal e outras programações natalinas. E com eles, reacendeu o debate de como a ocupação do espaço pode ser mais voltada para a população. Contudo, a infraestrutura precisa acompanhar esses movimentos.
O diretor da fiscalização municipal da Secretaria de Urbanismo, Rodrigo Lazzarotto, ressaltou que há a intenção de manter programações que tornem o centro da cidade pulsante.
— O governo está alinhado com essa ideia de valorizar e ocupar os espaços públicos. Eu não tenho dúvida de que a gestão do prefeito Adiló Didomenico, principalmente com o apoio da vice Paula Ioris, se preocupou com isso e foi bastante implementado. Inclusive, cresceram os eventos nesse período. E agora com o (Edson) Néspolo (próximo vice), eu acredito que vai se dar continuidade para esse tipo de pensamento — destacou Lazzarotto.
Ele salienta que, mesmo que essas ações causem transtornos temporários, elas são necessárias para a cidade.
— Os espaços centrais precisam ser valorizados, e Caxias tem vocação para eventos. Eu li uma frase, que não é minha, mas fala que qualquer projeto disruptivo, ele vai enfrentar críticas e ele é uma questão de risco, mas o risco deve ser sempre enfrentado. Eu acho que a cidade tem que evoluir e se adaptar aos eventos, não pensar em não fazer — comentou Lazzarotto.
No entanto, o diretor de fiscalização entende que o evento do Mississippi, por exemplo, trouxe muitas reclamações, mas pensa que é possível resolver melhorando a comunicação com a população.
— A gente tem que incentivar a realização dos eventos e se comunicar melhor com a população para que se cause menos dano. Uma pessoa que é comunicada com antecedência, que sabe que aquilo vai atrapalhar ela naquele tal dia, ela pode se programar diferente. Mas agora deixar de liberar os eventos, eu vejo como uma estratégia errada. Eu acho que a gente tem que trabalhar na liberação e trabalhar na contenção dos eventuais prejuízos que possam causar — disse Lazzarotto.
A questão da melhora da comunicação e do planejamento também foi um ponto levantado pela vice-presidente de Comércio do CIC Caxias, Idalice Manchini.
— A ocupação do Centro é positiva, mas é preciso planejamento. Claro que não se faz um bom omelete sem quebrar os ovos, então, sempre tem que ter os dois lados, mas eu estou falando para o lado do comércio e serviços juntos: desde que esteja planejado, é positivo — destacou Idalice.
Já para o presidente da União das Associações de Bairros de Caxias do Sul (UAB), Valdir Walter, a ocupação do Centro revela-se essencial para melhorar a segurança dos espaços.
— Nós sempre aconselhamos as associações a incentivar os moradores a ocupar os espaços públicos. A partir disso, a gente sabe que a coisa fica melhor, a segurança se torna melhor para todo mundo — frisou Walter.
O Pioneiro buscou a opinião de especialistas para entender de que forma é possível oferecer mais espaços de convivência em um lugar que liga todos os bairros, ao mesmo tempo que não cause impactos excessivos a segmentos e atividades.
Como o Centro pode ser ocupado
TAÍSA FESTUGATTO - Arquiteta e urbanista
"A criação de ruas exclusivas para pedestres é um exemplo de solução que favorece a utilização de centros urbanos, uma vez que podem ser criados espaços de lazer e convívio. A Avenida Júlio de Castilhos tem uma forte vocação para ser um grande parque linear, que poderia ter um lado aberto apenas para pessoas, mantendo apenas um sentido de veículos. Com isso os passeios se tornam mais agradáveis, podendo as lojas expandirem seus serviços para as calçadas. Isso poderia iniciar gradualmente, em datas específicas, para verificar o comportamento da população como uma atividade de urbanismo tático, onde as soluções são implementadas em pilotos para serem avaliadas."
DANIELA FASTOFSKI - Coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da FSG
"É importante pensar em parcerias que envolvam todos os agentes que fazem parte desses momentos, como o comércio local, os artistas, as instituições que ajudam para esses eventos acontecerem e diferentes grupos para que a comunidade se sinta envolvida nisso. Mas, para isso, é preciso investir na ideia de receber as pessoas de forma mais permanente, como investir em um mobiliário, em uma iluminação adequada, em áreas que possam ser cobertas não necessariamente o tempo todo, mas numa arquitetura transitória que permita a ocupação do espaço em diferentes condições climáticas. Já sobre o trânsito, é uma restrição temporária e é possível pensar em coordenar com horários estratégicos para que as pessoas sintam um impacto um pouco menor, além de facilitar o acesso ao Centro com a adequação do transporte coletivo, por exemplo. É bem importante pensarmos nessas questões de ocupação, de humanização do Centro. Não apenas no sentido de trazer vida ao espaço, mas também incentivar uma economia local e promover um uso mais interessante e sustentável da cidade."
MATEUS PANIZZON - Professor e integrante do City Living Lab (Programa de Pós-Graduação em Administração da UCS)
"É preciso estabelecer mecanismos de consulta com a população para perguntar quais são as necessidades dos moradores permanentes, dos moradores temporários, dos trabalhadores e dos vários grupos que coexistem no centro da cidade. Assim, é possível analisar o que precisa melhorar na infraestrutura da área. Já para humanizar o Centro, tem a questão da Praça Dante Alighieri, que já passou por revitalizações, mas que, diferentemente de outras praças, de centros históricos de outras cidades, ela não tem muitos serviços de alimentação, que se tornam espaços de convívio. É necessário ter esses tipos de serviços, porque senão, o comércio, ele é importante, mas ele vai ser um ponto de passagem."
IDALICE MANCHINI - Vice-presidente de Comércio da CIC Caxias
"Pela perspectiva do comércio, toda a ação traz uma movimentação na economia. Sendo assim, ele (Centro) necessita desses eventos como a Feira do Livro, o Festival Mississippi, os espetáculos de Natal. Só a gente precisa tomar um pouco de cuidado no planejamento para ocupar esses espaços, principalmente no que tange ao trânsito e ao funcionamento do comércio e dos serviços, para que os mesmos não sejam tão impactados."
VALDIR WALTER - Presidente da União das Associações de Bairros de Caxias do Sul (UAB)
"Eu acho que a ocupação do Centro é bem importante, porque quanto mais áreas públicas nós ocuparmos, menos bandidagem vai ter, não só no Centro, mas nas áreas verdes e nos bairros. A partir do momento que as pessoas começam a ocupar esses espaços, sabemos que a segurança torna-se melhor para todo mundo. Sobre as melhorias de infraestrutura, acho que é preciso investir em áreas com mais sombra, principalmente ali no Calçadão (na Praça Dante) e melhorar a questão dos locais para sentar, algo que atraia o pessoal para ir ao Centro não só para o comércio, mas para também conseguir trocar uma ideia, ter mais convivência com o outro."