As relações entre prefeito e vice-prefeito de Caxias do Sul recebem um olhar especial depois do racha entre Daniel Guerra (Republicanos) e Ricardo Fabris de Abreu, ocorrido ainda antes da posse, em janeiro de 2017. O resultado final é bem conhecido: o impeachment do então chefe do Executivo.
Em meio às desavenças e consequências, é fato que a escolha do vice tem que ser bem avaliada. Não pode ser apenas uma figura para satisfazer interesses político-partidários, embora esse requisito pese bastante nas alianças. No caso de Guerra e Fabris, o curioso é que foi o ex-prefeito quem escolheu o vice e, mesmo assim, o "casamento" desandou logo após vencerem a eleição.
A situação chegou ao extremo, levando à renúncia do vice-prefeito e o encaminhamento de pedidos de cassação de Guerra, culminando com a aprovação do impeachment. Portanto, não subestime um vice.
A função básica do detentor deste cargo é substituir o prefeito em suas ausências ou até mesmo definitivamente. A partir da eleição indireta do prefeito Flávio Cassina (PTB) e do vice Elói Frizzo (PSB), consta no site da prefeitura de Caxias: "O gabinete do vice-prefeito reúne os principais assuntos que envolvem a comunidade. Também cabe ao setor a coordenação do trabalho de todas as unidades da administração municipal."
O cientista político Adão Clóvis Martins dos Santos diz que o vice é importante porque, além de substituir o prefeito, tem uma série de atribuições, como o auxílio da realização de projetos, de buscar verbas e de contatos com a comunidade. O problema todo, explica ele, decorre quando deixam de ver a eficiência de um projeto de governo substituído por um projeto eleitoral.
Ele destaca que o protagonismo dos vices se potencializou nos últimos anos em toda a América Latina com o impeachment de Fernando Lugo, no Paraguai, em 2012, e de Dilma Rousseff em 2016. Esses dois momentos traduzem uma crise institucional e uma modificação muito grande no processo político, diz Santos, que vai passar a ser chamado de golpe político parlamentar ou judicialização, no caso da política.
– As divergências podem ocorrer numa democracia? Claro que podem. Para essas divergências ou até rupturas, dentro de uma certa normalidade institucional, existem previsões constitucionais, e não causam maiores problemas para a comunidade. O grande problema é anterior, além da fragmentação partidária na Câmara de Vereadores, existe uma carência de projetos de governo, o que existe na realidade são projetos eleitorais – declara o cientista político.
Ele diz que o ideal é que o vice resultasse de um projeto e o partido apresentasse um candidato com traços que pudessem viabilizar esse projeto. Para o cientista político, o vice ideal é aquele que se mantém fiel ao projeto pelo qual foi eleito. Mas o problema maior, acrescenta, é quando o chefe do Executivo não tem maioria no Legislativo.
– Como governar uma cidade quando o prefeito não tem sequer 15% do Legislativo? – salienta, numa referência ao caso de Guerra.
Ele assinala que uma fragilização assim incentiva as ações dos agentes que querem minar a institucionalidade.
– Em um momento de crise institucional, as divergências entre prefeito e vice passam a sofrer uma interferência muito grande de uma série de outros interesses, que culminam com apresentação de pedidos de impeachment. Sempre que tiver um prefeito sem maioria na Câmara e que possa ter certa longevidade (reeleição), teremos esses processos.
E reforça:
– Quando os mecanismos institucionais eram preservados, quando não havia as ações de judicialização, as divergências eram administradas institucionalmente, porque existia o entendimento de que o projeto de governo era maior. Rupturas podem ocorrer, mas quando ocorrem dentro de um quadro institucionalizado, legalizado e legitimado, as soluções ocorrem quase ao natural, sem sinalizar para a sociedade a fragilidade.
Sobre uma eventual repetição de instabilidade no governo em Caxias, analisa:
– Sem maioria na Câmara, vai depender muito da capacidade do prefeito eleito e de sua habilidade de gestionar essa situação.
Crises políticas e conflitos
Na administração de Alceu Barbosa Velho (PDT) e Antonio Feldmann (à época MDB, hoje Podemos), também ocorreu uma situação que deixou marcas. Em 2014, houve a recusa do vice em assumir a prefeitura nas férias do titular para não ficar inelegível, pois pretendia concorrer a deputado federal.
Uma representação contra Feldmann ao Ministério Público, que resultou em uma ação civil pública, foi encaminhada pela bancada do PT na Câmara de Vereadores. Foram dias tensos, com várias trocas no comando da prefeitura, resultando em uma crise política. A Justiça determinou que o vice assumisse. Alceu encerrou as férias e reassumiu. Em 2017, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado absolveu Feldmann.
O ex-prefeito Mansueto Serafini Filho e seu primeiro vice (ele foi prefeito duas vezes), Clóvis Drago, também romperam definitivamente durante o governo, entre 1977 e 1982.
Os vices de Caxias do Sul desde a década de 1990 foram: Mário Vanin, no segundo Governo Mansueto Serafini Filho; Francisco de Assis Spiandorello no Governo Mário Vanin; Marisa Formolo Dalla Vecchia e Justina Onzi, respectivamente, no primeiro e segundo governos Pepe Vargas; Alceu Barbosa Velho, no primeiro e segundo governos José Ivo Sartori. Alceu renunciou após dois anos do segundo mandato por ter sido eleito deputado estadual. Depois, os vices foram Feldmann, no Governo Alceu, e Ricardo Fabris de Abreu, no Governo Daniel Guerra. E Elói Frizzo (PSB) no mandato tampão, após o impeachment de Guerra, tendo Flávio Cassina (PTB) como prefeito.
Fabris entregou carta de renúncia na Câmara de Vereadores em 6 de março de 2017, informando que renunciaria efetivamente às 23h59min do dia 31 de março daquele ano. Em 21 de março, ele reconsiderou a decisão e desistiu da renúncia. Porém, em 28 de dezembro de 2018, Fabris encaminhou novo documento à Câmara renunciando novamente ao cargo. Desta vez, pra valer.
OS CANDIDATOS E A ATUAÇÃO
Entre as 11 chapas à prefeitura, um candidato a prefeito já foi vice (Antonio Feldmann, Podemos) e o atual vice Elói Frizzo concorre novamente ao cargo. Em recente debate dos candidatos a vice-prefeito realizado pela Câmara de Vereadores, eles disseram como pretendem que seja sua atuação, se eleitos (confira abaixo). Resta aguardar para ver como será na prática.
:: Andréia Garbin (Patriota): lealdade ao plano de governo e estará à disposição para demandas e missões.
:: Cesar Bernardi (Novo): se disponibilizou a assumir uma das secretarias de governo para reduzir o custo do erário.
:: Chico Guerra (Republicanos): respeito e responsabilidade com o dinheiro público e que estará no cargo como servidor público.
:: Cláudio Libardi Jr. (PCdoB): construir uma Caxias mais plural.
:: Edson da Rosa (PP): gestão conciliadora e de diálogo.
:: Elói Frizzo (PSB): retomar o protagonismo de Caxias, o diálogo e atender as comunidades.
:: Kiko Girardi (PSD): será um elo da comunidade junto à prefeitura.
:: Nilvo Bertolla (PSL): estará à disposição para receber as demandas de todos os setores.
:: Odir Ferronatto (Podemos): diálogo com a comunidade toda.
:: Paula Ioris (PSDB): afinidade com o prefeito de sua chapa, se eleita, e confiança.
:: Priscila Vilasboa (PL): diálogo, parceria e bom relacionamento.
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