
No dia da celebração dos 150 anos da Imigração Italiana no Rio Grande do Sul — 20 de maio — a comunidade de Antônio Prado, na Serra, também comemorava outro marco importante na cidade italiana de Monselice. Por lá, era assinado o gemellaggio — o tratado de irmandade entre os dois municípios. Com esse novo acordo, Antônio Prado passa a contar com três cidades-irmãs na Itália: Cavaion Veronese (Verona), Rotzo (Vicenza) e agora Monselice (Pádua), todas situadas na região do Vêneto — origem da maioria dos imigrantes que colonizaram a Serra, no século 19.
Segundo a prefeitura de Antônio Prado, a parceria com a cidade localizada na província de Pádua, região do Vêneto, visa fomentar intercâmbios culturais, turísticos e econômicos, reforçando a identidade italiana que molda a essência da cidade da Serra — reconhecida como a mais italiana do Brasil.
O termo “gemellaggio” significa, em português, “cidades-irmãs”, ou “geminação de cidades”. É um acordo formal entre cidades de diferentes nações, que facilita o acesso a informações, troca de experiências, elaboração de projetos e cooperação econômica e cultural. De acordo com o professor de História César Augusto Prezzi, o Rio Grande do Sul é o Estado que mais possui pactos de amizade no Brasil, com aproximadamente 50 tratados.

No contexto histórico, Prezzi destaca que o gemellaggio nasceu primeiramente na Europa, em 1913, como uma ferramenta para atuar na resolução de problemas urbanos.
— A Europa vinha de um século de guerras e o socialismo católico estava muito preocupado com os problemas urbanos, de fornecimento de água, de rede de esgotos, de circulação de pessoas, carroças e caminhões nas cidades. Formou-se então uma entidade que se preocupa com essas questões. Iniciou na França, com a fundação de uma federação e depois se espalhou por outros países — conta Prezzi.
O cenário que desencadeou os gemellaggios foi o pós-Segunda Guerra Mundial, em 1951, quando se iniciaram as tratativas para a formação da comunidade europeia.
— Inicialmente reunindo Inglaterra, França, Espanha, Itália, Alemanha e Portugal, a comunidade europeia necessitava de ferramentas para troca de experiências, aproximação dos povos e eliminação das barreiras, que vinham lá da Idade Média, limitando a circulação de mercadorias e dificultando a comunicação entre as pessoas. No caso da Itália, já em 1957, é elaborada uma legislação para favorecer essa aproximação.
Para o professor de História, os acordos entre cidades de diferentes países são importantes e positivos em todos os aspectos. Conforme Prezzi, além das relações de interesse de desenvolvimento de tecnologias e inovações, os municípios acabam também se relacionando pelo aspecto afetivo e geográfico. E estes acordos não ficam restritos somente aos municípios. A Universidade de Caxias do Sul (UCS), por exemplo, possui inúmeros acordos com a Universidade de Pádova.
Na Itália, Prezzi sintetiza que há uma legislação que regula as etapas do gemellaggio até ele ser registrado em Roma. Já no Brasil, o Ministério das Relações Exteriores reconhece os tratados de amizade apenas nas esferas municipais.
— Existe uma série de documentos que têm que ser encaminhados. Essa etapa é importante porque abre portas para inúmeras possibilidades para a realização de projetos e busca de recursos da comunidade europeia. Então, quando fica num pacto de amizade, ele tem uma abrangência mais local, na província onde ele está inserido e com limitações para acessar recursos que são sempre a nível regional ou estadual — afirma.
Na Serra
O primeiro gemellaggio que se tem registro na Serra foi em 1957, entre Nova Bassano (então pertencente à Nova Prata) e Bassano del Grappa, na região do Vêneto, província de Vicenza. Foi nessa cidade italiana que nasceu o padre Pietro Colbachini, um dos fundadores de Nova Bassano. Esse gemellaggio foi assinado em 10 de novembro de 1957 e é considerado o mais antigo do Brasil, segundo Prezzi, que escreveu alguns capítulos do livro 150 Anos de Imigração Italiana no Rio Grande do Sul, lançado em 2020.
Conforme o site da prefeitura de Nova Bassano, até hoje é grande a ligação entre as cidades irmãs, com a realização de atividades de intercâmbio cultural, educacional e outros empreendimentos.
Atualmente, Bento Gonçalves é a cidade com mais gemellaggios no Estado. O município do Vale dos Vinhedos tem como cidades irmãs na Itália: Rovereto, Nogaredo, Terragnolo, Trambileno, Villa Lagarina, assinados em 2007, e Mori, Isera e Brentonico, acrescidas ao acordo em 2020. As cidades pertencem à região de Vallagarina, na Província de Trento. Em 2024, Bento Gonçalves recebeu o título de "Comune Onorário Del Veneto".
Entre os principais objetivos dos acordos estão a realização de intercâmbios de informação sobre o estado atual e sobre o desenvolvimento socioeconômico das comunidades envolvidas, em particular no âmbito agrícola, ambiental, turístico, sanitário, escolar e administrativo; o estudo das possibilidades de formação de profissionais, trabalhadores, professores e jovens no âmbito linguístico, histórico e cultural e para a formação de administradores para gestão de território.
A região com a qual Bento Gonçalves possui o protocolo de intercâmbio apresenta características semelhantes às da Serra gaúcha. A região de Vallagarina, por exemplo, é muito parecida com o Vale dos Vinhedos e produz os melhores vinhos tintos do norte da Itália, além de ser cortada pelo Rio Adige que se assemelha ao Rio das Antas. Na Província Autônoma de Trento funciona ainda a Escola de Enologia de San Michele al Adige, que realiza as pesquisas e formação de jovens para o mercado de enologia.
Além da Itália, Bento Gonçalves também têm acordo de irmandade com a cidade argentina Luján de Cuyo e com a portuguesa Cartaxo. Esses acordos permitem a criação de convênios em diversas áreas, como gastronomia, enologia, enoturismo, e outras que envolvam a cultura dos municípios.
Já em Monte Belo do Sul, além do pacto de irmandade com Schiavon, província de Vicenza, na Itália, no ano passado, firmou pacto de amizade entre o Polentaço (de Monte Belo) e a Fiera Della Polenta, de Vigasio, na Itália.
Parcerias que geram resultados
Prezzi destaca no livro 150 Anos de Imigração Italiana no Rio Grande do Sul, alguns projetos desenvolvidos entre as cidades irmãs na Serra: Veranópolis, por exemplo, com a viabilização de cursos de formação de jovens; Monte Belo do Sul, que organizou o Giro Ciclístico e construiu a praça Schiavon em homenagem aos acordos; Bento Gonçalves, que viabilizou a formação de jovens em parceria com a Escola de Enogastronomia de Rovereto e participou com uma delegação de jovens jogadores de futebol do Clube Esportivo no Torneio Europeu da Paz de Rovereto.
Além dessas, também se destaca Garibaldi e a Escola de Enologia de Conegliano, as quais deram ênfase aos acordos envolvendo vinhos e espumantes; Fagundes Varela, que construiu a praça Caneva e viabilizou inúmeros intercâmbios para jovens e idosos, projetos realizados com apoio do EFASCE; Farroupilha, que realizou a Piazza Latina e focou na formação de produtores de Kiwi; Nova Prata, que possui um acordo envolvendo Cittadella na Província de Padova e Noblesville nos Estados Unidos, anualmente, se revezam e promovem um encontro envolvendo representantes dessas comunidades.
Como estão os gemellaggios atualmente (pesquisa de 2020)
- Rio Grande do Sul (2001) com Regione Del Veneto (Assinado Em Veneza).
- Santa Tereza (2007) com San Biagio Di Callalta (Treviso).
- Bento Gonçalves (2007) com Rovereto, Nogaredo, Terragnolo, Trambileno, Villa Lagarina (Trento); Mori, Isera e Brentonico (2020); Luján de Cuyo (Argentina) e Cartaxo (Portugal).
- Monte Belo Do Sul (2002) com Schiavon (Vicenza).
- Nova Bassano (1957) com Bassano Del Grappa (Vicenza).
- Antônio Prado (2013) com Rotzo (Vicenza) e Cavaion Veronese (Verona) e Monselice (Pádua).
- Canela (2013) com Musile Di Piave (Veneza).
- Carlos Barbosa (2007) com Nove (Vicenza) e Borso Del Grappa (Treviso).
- Caxias do Sul (2007) - Ana Rech com Pedavena (Belluno), Changzhou (China) e Little Rock (Estados Unidos) e inúmeros acordos entre a Universidade de Pádova e a Universidade de Caxias do Sul (UCS).
- Cotiporã (2010) com Rovolon (Padova).
- Fagundes Varela (2014) com Caneva (Pordenone).
- Farroupilha (2009) com Latina (Latina).
- Flores da Cunha (2012) com Sospirolo (Belluno).
- Garibaldi (2004) com Conegliano (Treviso).
- Gramado (2010) com Levico Terme (Trento), Puerto Varas (Chile), Maldonado (Uruguai), Angra do Heroísmo (Portugal) e Óbidos (Portugal).
- Nova Araçá (2010) com Grisignano Di Zocco (Vicenza).
- Nova Padua (2011) com Fontaniva (Pordenone).
- Nova Petrópolis (2019) com Emmelshausen (Alemanha).
- Nova Prata (2006) com Cittadella (Pordenone) e Noblesville (Estados Unidos).
- Nova Roma do Sul (2017) com Cavaion Veronese (Verona).
- São Valentim do Sul com Alleghe (Belluno).
- São Marcos (2007) com Mason Vicentino (Vicenza).
- Veranópolis (2002) com Porto Viro (Rovigo).
- Vila Flores (2008) com Arsie (Belluno).
- Vista Alegre do Prata com Cismon Del Grappa (Vêneto).