
Dor intensa no estômago, idas e vindas a diferentes médicos, perda de 10 quilos, suspeita de crises de ansiedade, uma cirurgia da vesícula até um quadro grave de anemia. A saga da estudante caxiense Bruna Maria Gettert, 24 anos, até o diagnóstico correto de câncer durou três anos. Uma espera angustiante e, segundo ela, com queixas pouco validadas. Hoje, a jovem recebe o tratamento adequado para a doença e usa as redes sociais para compartilhar a experiência com outros pacientes oncológicos.
Os primeiros sintomas começaram no final de 2020, quando a jovem passou a sentir dores intensas no estômago diariamente. Após ir ao médico e receber o tratamento contra uma bactéria, ouviu de outro profissional que o quadro poderia estar relacionado à pandemia e à ansiedade.
— Eu faço acompanhamento psicológico desde muito cedo, então, eu sabia identificar quando eu tinha uma dor de estômago por dor de estômago ou se era uma questão de nervosismo. Eu cheguei em um nível de estar vivendo à base de remédio para dor todos os dias — relata Bruna.
Com a dor persistente e sem alteração em exames de sangue, Bruna continuou buscando ajuda médica até receber o diagnóstico de pedra na vesícula em 2021. Confiante que o sofrimento iria cessar, a jovem foi operada. Porém, a esperada melhora não aconteceu e veio acompanhada de sintomas ainda piores: Bruna começou a ter dificuldade de engolir alimentos e líquidos.
— Eu não conseguia dar duas garfadas no prato, sem ter que correr para o banheiro. Não descia, ficava trancado. Obviamente, com o tempo, eu fui desenvolvendo uma certa ansiedade. Tinha medo de comer e passar mal — relembra.
Medicada por um psiquiatra, Bruna conta que estava conseguindo recuperar parte dos 10 quilos perdidos até ter uma crise grave em janeiro de 2023. O domingo de sol e a tão esperada prova para um concurso se transformaram em um pesadelo. No dia seguinte, ela foi internada, passou por exames e recebeu a informação da condição de anemia grave.
O primeiro diagnóstico de câncer
Internada, Bruna passou por dois exames: uma endoscopia e uma tomografia. A biópsia da primeira ficou pronta antes e indicou para um tumor estromal gastrointestinal (Gist). Já a tomografia apontou para a existência de uma massa de cerca de 10 centímetros abdômen dela — o material está localizado entre o pâncreas, o retroperitônio e a curvatura gástrica.
Embora fragilizada e impactada pela notícia de ser uma paciente oncológica, a estudante conta que sentiu alívio por finalmente receber um diagnóstico que justificasse tantos sintomas nos últimos dois anos.
— Pode parecer estranho, mas eu digo que eu vivo muito melhor tendo o câncer, tendo o diagnóstico e fazendo tratamentos com quimioterapia do que antes. Por mais que os efeitos colaterais sejam difíceis, mas eu tenho controle do que está acontecendo agora — enfatiza Bruna.
A reviravolta e um novo tratamento
A medicação para o tratamento do câncer, contudo, resultou em efeitos colaterais, dentre eles, hemorragias, enjoos e inchaço no rosto. Diante das reações dos remédios, Bruna recebeu a recomendação de procurar a opinião de um segundo profissional.
Com o apoio de um médico de Porto Alegre e a revisão das biópsias, houve uma reviravolta: em março de 2024, a estudante foi diagnosticada com tumor neuroendócrino bem diferenciado de grau 2. A suspeita de tumor estromal gastrointestinal (Gist) foi, então, descartada.
Bruna explica que o tumor reduziu de 10 para cerca de sete centímetros e não pode ser operado. Atualmente, ela entrou em um novo ciclo de quimioterapia oral e é considerada uma paciente paliativa.
— O meu tumor está estabilizado, que é o melhor dos cenários no momento — acrescenta Bruna.
O relato nas redes socias
Hoje, Bruna compartilha a experiência na busca pelo diagnóstico e o tratamento contra o tumor neuroendócrino nas redes sociais. Ela soma mais de 27 mil seguidores no TikTok.
Segundo a estudante, uma das intenções é alertar que o câncer pode atingir pessoas mais jovens e também ajudar familiares a lidarem com a situação.
— Eu acredito muito numa questão de que tem um propósito pra tudo. E, atualmente, eu me vejo numa situação de que eu não quero que aconteça com outras pessoas o que aconteceu comigo — ressalta.
Outro objetivo é desmistificar o conceito de paciente paliativo, que muitas vezes é confundido com paciente em estado terminal:
— Eu ouvia das pessoas "paciente paliativo não levanta da cama, não sai para aproveitar" e eu ficava pensando que eu tenho câncer, mas eu também tenho uma vida. O paciente paliativo quer dizer que eu posso viver, ter qualidade de vida, mesmo com uma doença como o câncer — sinaliza.
Entenda o que é um tumor neuroendócrino
A médica oncologista do Hospital do Círculo Emily Tonin da Costa acompanha Bruna há cerca de um ano. Ela explica que atualmente o trabalho com a jovem é focado no controle da doença, no alívio dos sintomas e na manutenção da qualidade de vida.
A oncologista detalha que os tumores neuroendócrinos podem surgir em diversos órgãos, como intestino, pâncreas e pulmão. Ela aponta que o termo "bem diferenciado" se refere aos tumores em que as células neoplásicas mantêm uma organização semelhante a das células normais, com crescimento mais organizado e, geralmente, evolução mais lenta.
— Eles são classificados em graus de um a três, com base na atividade proliferativa das células — ou seja, na velocidade com que se multiplicam. O grau dois, como é o caso da Bruna, representa uma taxa de crescimento intermediária: nem tão lenta quanto nos tumores de grau um, nem tão acelerada quanto nos de grau três — detalha.
O tratamento pode incluir cirurgia, medicamentos, terapia com radiofármacos — como o Lutécio-177 — e quimioterapia, por exemplo.
— A escolha e a sequência das terapias dependem da resposta clínica, das comorbidades, da disponibilidade local dos tratamentos e das características individuais de cada paciente — afirma a médica.