O presente de hoje é o passado de amanhã. Quem não celebra a sua história está fadado a se perder na cronologia do tempo. O Juventude soube comemorar a data dos 20 anos do memorial do clube. Inclusive, de forma inédita, o alviverde lançou a terceira camisa em alusão a data.
No dia 26 de agosto de 1998, o Pioneiro noticiava o ato que seria o embrião para criação do Memorial dentro Estádio Alfredo Jaconi. A amostra "Acervo de Uma Paixão", marcava o ato de criação do Centro de Memória do Juventude, inaugurada na noite anterior. Embalado pelo título de Campeonato Gaúcho, o clube teria em dois anos o espaço transformado em um memorial. A inauguração ocorreu em 29 junho de 2002, aniversário do clube, antes de um amistoso contra o Grêmio na casa alviverde. A museóloga Tânia Tonet foi a primeira responsável acervo.
— Não é só uma sala de troféus, mas um resgate dos documentos do Juventude. Estamos recuperando uma parte da história do clube e da cidade. Essa trajetória de 89 anos se confunde com a história de Caxias — declarou Tânia ao Pioneiro em 2002.
Duas décadas se passaram e o memorial aumentou. Saiu das 470 peças para mais de oito mil itens, com cerca de 700 troféus, cinco mil fotos e diversos objetos que formam o quebra-cabeça da história do Juventude. Atualmente, o espaço é coordenado por Bárbara Lauxen, 37 anos. Ela faz questão de relembrar quem abriu as portas para a história do clube.
— Tânia é uma referência, o início de tudo. Se não fosse ela, de onde partiria? Enquanto profissional da mesma área e mulher, ela foi um exemplo. Caía na mão dela, a Tânia fazia acontecer, era uma mulher muito forte — comentou Bárbara.
Cultivando a memória do passado, a historiadora também pensa no futuro. Nos últimos anos o memorial foi repaginado, ainda está longe do sonho maior, mas cumpre com o objetivo de manter viva a história mais que centenária do time da Serra. E daqui cinco anos? Bárbara fala como gostaria de ver o memorial.
—Eu gostaria que estivéssemos com uma cara nova, uma exposição nova, uma nova estruturação de espaço. Temos o projeto de história oral também. A ideia é contar a história das pessoas que fizeram parte do Juventude com a visão deles, funcionários, torcida, familiares, dirigentes e jogadores. Quem são os nossos fundadores? Quem são eles? O que faziam? Isso depois se torna fonte de pesquisa, publicações e vamos incentivando mais pesquisas sobre o clube — declarou a coordenadora.
A GUARDIÃ
Formada em licenciatura plena e mestre em História, Bárbara chegou ao clube em agosto de 2020. Apesar do pouco tempo no Estádio Alfredo Jaconi, ao falar do memorial é como se estivesse falando de sua casa. Viver entre o passado e o presente é a realização profissional para a coordenadora.
— Eu sempre gostei de museus. Eu comecei na área da saúde e acabei na história. Tive sorte em trabalhar sempre na área de museu e arquivo. Depois de formada, meu primeiro emprego foi em um museu — disse.
Ela nunca se imaginou trabalhando com o futebol. Na família, seu bisavô Almo Ferrary foi jogador e sua avó Edith Inêz Ferrary foi a primeira mulher da família a trabalhar com futebol, era cobradora no Estádio Cristo Rei, em São Leopoldo. Sobre o trabalho de resgatar e preservar a memória, a historiadora diz que o clube está no caminho certo.
— Temos aqui um grande acervo para pesquisa e para expor. Temos a possibilidade de ir muito longe. A Tânia já enxergava isso. Fui a São Paulo e conheci outros clubes e locais que trabalham com memória. Vi que estamos no caminho certo. Retomamos o trabalho há dois anos e esses clubes estão há muito tempo no mercado. Mas eles passam pelas mesmas situações de espaços, como organizar uma reserva técnica e de os clubes serem os mantenedores desses locais — declarou.
Para coordenadora, o tour pelo Jaconi não é apenas um passeio para o torcedor conhecer o clube e a sua história, é um momento que gera emoção nas pessoas. Às vezes, algumas visitas reservam surpresas, como de um pequeno torcedor botafoguense.
— Uma vez recebi um gurizinho de oito anos, carioca, veio aqui e disse que era botafoguense. Ele disse que vinha ver o título que tínhamos roubado deles (Copa do Brasil 99). No final, ele fez fotos com a taça, adorou, saiu feliz com a mãe dele. Para eles era uma dor, mas era uma ressignificação desse próprio momento. Têm muitas pessoas que chegam aqui e choram ao lembrar dos momentos do clube — lembra Bárbara.
ITENS HISTÓRICOS
Cada espaço do memorial tem itens históricos. Logo na entrada, uma taça gigante recebe os torcedores. É o troféu do Torneio Monumento ao Imigrante disputado em 1954. Ao lado um dos itens mais antigos, uma bola da década de 20. O detalhe é que a pelota tem nomes de jogadores gravados nela: Nicola, Bado, Bortagaray, Lorise, Menegol, Greggio, Janella, Martinez, Leonardo e Edmar. O item é um dos favoritos de Bárbara.
— Quando comecei a trabalhar, ela estava em um cantinho. Quando vi que tinha nome na bola, parece que tinha feito uma grande descoberta. Hoje tem até camisa feita pela 19Treze com a imagem dessa bola — revelou.
Um dos nomes é de um ex-atleta do Juventude. O uruguaio Celestino Bortagaray jogou no alviverde em 1920. Uma chuteira bem diferente das atuais também faz parte do acervo. A peça era de Bortagaray e foi doada por Antônio Dal Pizzol, auxiliar de preparação física do Verdão. Os itens foram todos herdados de seu avô.
Um móvel construído de madeira e envidraçado também chama a atenção de quem entra. Com a descrição lapidada "Arca da Glória", a cristaleira de 1920 foi o primeiro espaços para guardar os troféus do clube. Mal sabiam os fundadores, que hoje, o móvel estaria rodeado de outras 700 taças.
O item mais antigo do memorial é uma placa de 1917, oferecida pelo F.B. Montenegro em homenagem aos cinco anos do clube, mas não está em exposição momentaneamente. Um retrato de uma menina também desperta a curiosidade dos visitantes. É Júlia Lamb, uma das primeiras mulheres a lutar para assistir jogos de futebol no estádio Alfredo Jaconi. Em 1948 é fundada a ala feminina. Entre os itens mais novos está o troféu de campeão gaúcho do interior, conquistado em 2020.
No começo deste mês de setembro, o Juventude lançou a sua terceira camisa de jogo. Toda preta, a peça faz alusão aos 20 anos do memorial. Para Bárbara a iniciativa representa o valor dado pelo clube a sua história.
— Essa camisa representa a visão do clube sobre a própria história. Eu não lembro de algum clube que tenha feito uma homenagem ao setor de memória com a camisa que faz parte do uniforme. Nosso memorial existe pela força de muitas pessoas, assim como um título que é conquistado por muitas mãos —finalizou.
COMO VISITAR
O torcedor pode visitar o memorial entre de segunda a sexta, que contempla o Jaconi Tour. Os horários variam e o torcedor precisa agendar seu horário. O primeiro e terceiro sábado de cada mês também são realizada o Tour . O valor varia entre R$ 10 e R$ 20. O torcedor pode conhecer não apena o memorial. Outros espaços do estádio também são visitados, como gramado, zona mista, sala de imprensa, vestiários e salão nobre. Os agendamentos podem ser feitos pelo telefone (54) 3027 8736 ou memorial@juventude.com.br.
MEMORIAL EM NÚMEROS*
8 mil itens
700 troféus
5 mil fotografias
1,2 mil Fichas de jogadores
500 Fitas VHS
222 Quadros
135 Placas
63 Medalhas
51 Livros
45 Flâmulas
30 Camisas
6 Bolas
200 visitas por mês
*Números aproximados