Por Alexandre Elmi, jornalista
Uma ideia muito comum sobre adoção merece ser ponderada se quisermos olhar o processo a partir de lentes mais realistas. Uma noção aparentemente inocente e até usada como se fosse um elogio, mas que é refutada por famílias adotivas que lutam para que haja uma melhor compreensão da sociedade. É a ideia de generosidade associada à adoção.
É desejo de família, vontade pura de ser pai ou de ser mãe
Acreditem: adoção não é generosidade, é simplesmente paternidade, maternidade e parentalidade. É desejo de família, vontade pura de ser pai ou de ser mãe, a mesma força e mistério que movem mães ou pais biológicos. São generosos os pais ou as mães porque têm filhos biológicos? Tornam-se pais ou mães biológicos porque querem fazer o bem, por uma questão humanitária? Por que, então, os adotivos seriam generosos apenas porque querem ser mãe ou pai?
Pensando bem, se há generosidade no processo, ela vem das crianças, que nos aceitam com tanto amor para que possamos viver este sentimento simples, intenso e repleto de dificuldades inerentes às inúmeras perdas envolvidas nestas histórias que se encontram. No fundo, há até um certo egoísmo por parte dos pais adotivos, no sentido de que muitas vezes embarcamos nessa situação para resolver nossas próprias carências e necessidades de vivência e afirmação de sentimentos.
Pode parecer um detalhe, mas é uma abordagem que faz diferença e com certeza pode ajudar a desmistificar a adoção, que por si só é desafiadora aos diretamente envolvidos. A gratidão que pode nascer com a adoção não é maior ou menor do que a gerada por qualquer relação humana genuína e plena de amor. Não somos heróis.
Neste 25 de maio, Dia Nacional da Adoção, é importante afastar a ideia de generosidade como mais um passo para superar a diferenciação entre filhos biológicos e adotivos. Lembro da canção Sobre o Tempo, do Nenhum de Nós, lá nos anos 1980: "Os homens criam os seus filhos, verdadeiros ou adotivos". Este "ou" machuca, sabia? Filhos são filhos. As letras das músicas envelhecem mal, mas a sociedade não tem esse direito. Verdadeiro é o amor que une pais e filhos, independentemente das circunstâncias que nos conectam.