Por Raquel Recuero, Professora, pesquisadora e membro do Conselho Editorial da RBS
Nesta semana acontece o Dia Mundial da Notícia (28/9), uma data para lembrar a importância do jornalismo para as sociedades democráticas. Entre suas funções, há uma que é pouco lembrada: o jornalismo exerce um papel fundamental na coesão social, ao construir identidades e desenhar o espaço social das comunidades. Isso significa que as notícias nos ajudam a entender o lugar onde vivemos, a criar relações de identificação com quem vive perto, a sedimentar valores culturais coletivos e a gerar pertencimento. Mas aqui surge um paradoxo: com as plataformas digitais, temos cada vez mais acesso a conteúdos do mundo todo e, ao mesmo tempo, cada vez menos a conteúdos locais. É mais fácil saber o que acontece a milhares de quilômetros do que notícias da própria cidade.
Não compete com a cobertura nacional ou internacional, mas garante que a vida comunitária seja narrada, documentada e interpretada
Esse é um ponto central da percepção de relevância da atividade jornalística: as pessoas precisam se reconhecer nas narrativas e nos contextos trazidos pela imprensa. Ao mesmo tempo, necessitam dela para legitimar e dar visibilidade a esses contextos e identidades. É nessa troca que o jornalismo cresce e reafirma sua importância social. No entanto, é justamente na concorrência com o entretenimento das plataformas digitais que o jornalismo perde espaço. Algoritmos privilegiam conteúdos emocionais e de amplo alcance, relegando o jornalismo ao esquecimento. Veículos regionais tornam-se reféns da lógica das plataformas, que concentram distribuição e publicidade digital, dificultando a sustentabilidade. Nesse vácuo, proliferam boatos em grupos na internet, substituindo informação verificada por desinformação.
O jornalismo local sempre foi um pilar comunitário. Ele organiza narrativas, dá visibilidade a atores invisibilizados pela grande imprensa, contribui para a memória coletiva e fortalece a identificação dos grupos com seus territórios. O jornalismo local cumpre a função de criar o sentimento de comunidade entre pessoas da mesma cidade, região ou Estado. Seu diferencial é a proximidade: acompanhar reuniões da Câmara Municipal, cobrir problemas de um posto de saúde ou dar visibilidade a mobilizações locais.
O hiperlocal não compete com a cobertura nacional ou internacional, mas garante que a vida comunitária seja narrada, documentada e interpretada. Se o jornalismo global nos informa sobre o mundo, é o jornalismo local que nos ajuda a compreender e agir no espaço imediato onde vivemos. Sem ele, comunidades ficam reféns de narrativas fragmentadas e, muitas vezes, distorcidas. Preservar e reinventar o local diante da hegemonia das plataformas digitais não é apenas uma questão de sobrevivência jornalística: é condição para a vitalidade da própria democracia.




