
A queda de um Boeing 787 da Air India nesta quinta-feira (12), logo após a decolagem em Ahmedabad, na Índia, deixou mais de 200 vítimas e levantou uma dúvida comum fora do meio aeronáutico: o que significam os alertas "Mayday" e "Pan-pan", emitidos por pilotos em situações de risco?
Segundo o jornal The Indian Express, o piloto da aeronave acionou o aviso de "Mayday" pouco depois da decolagem. O acidente aconteceu às 13h39min no horário local (5h09min de Brasília), quando o avião que seguia para Londres perdeu altitude e colidiu com uma residência universitária usada como alojamento de estudantes de Medicina.
Esse alerta, transmitido via rádio, é o mais urgente que pode ser feito em voo comercial. A partir desse sinal, toda a operação aérea ao redor entra em estado de atenção máxima.
O que é uma emergência na aviação?
Segundo Lucas Fogaça, coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), falhas técnicas fazem parte do cotidiano da aviação e são treinadas exaustivamente.
— A aviação é toda baseada em redundância. Dois motores, dois pilotos, múltiplos sistemas hidráulicos, elétricos e tudo mais. Então, não é qualquer falha que é considerada uma emergência, visto que a degradação de sistemas é considerada relativamente normal — afirma.
No entanto, só se fala em emergência quando várias dessas camadas de segurança falham ao mesmo tempo, provocando risco direto à integridade do voo.
— Os pilotos são treinados para gerenciar falhas e recursos dentro e fora da cabine. Uma emergência ocorre quando a gente tem uma situação que foge do controle, uma redundância que não funciona, algo grave, com muitas barreiras violadas e um risco de vida que é real, de perda de aeronave e graves danos — explica.
É nessas situações que surgem os termos Mayday e Pan-pan. Ambos devem ser proferidos três vezes no início da transmissão para garantir clareza ao controle aéreo. A diferença entre os dois, no entanto, é significativa.
“Mayday!” é prioridade total
A expressão Mayday tem origem no francês m’aidez ("me ajude") e foi adotada como padrão internacional após a Segunda Guerra Mundial. Fogaça explica que o termo é usado em situações de risco iminente, como falha de todos os motores ou perda total de controle.
— Quando tu tem uma situação em que o avião não pode mais ficar no ar, ou tu precisa de auxílio imediato, esses termos são proferidos. Quando tu fala Mayday, Mayday, Mayday no rádio, todo mundo para, ninguém mais transmite. A prioridade do sistema passa a ser a aeronave que pediu ajuda — detalha Fogaça.
Segundo ele, o tipo de assistência recebida depende da natureza da emergência:
— Pode ser que a aeronave esteja com alguma falha nos motores ou nos sistemas, com falta ou vazamento combustível, sem possibilidade de seguir voo. O aeroporto, então, é reservado exclusivamente para ela, ninguém mais pousa ou decola. O controle de tráfego aéreo vai priorizar essa aeronave acima do resto.
“Pan-pan” é um aviso de urgência, não de desastre
O termo Pan-pan também vem do francês — da palavra panne, que significa "falha" — e indica um nível de urgência "inferior" ao Mayday. Pode ser usado, por exemplo, quando há um problema a bordo que ainda não compromete o voo, mas exige atenção.
— Um passageiro que está tendo uma emergência médica a bordo, está sangrando de forma grave, e você precisa colocar a aeronave no chão de forma prioritária, mas ainda tem um tempinho. Ainda consegue voar, não está caindo — resume o professor.
Fogaça ressalta que não há um manual que determine rigidamente o uso de um ou outro termo. A definição é feita pela tripulação, com base no tipo de aeronave, nos sistemas afetados e na gravidade percebida.
— A mesma falha pode ser Mayday para um avião pequeno e Pan-pan para um maior. Em outros casos, nem sequer será considerada emergência. É tudo uma questão de julgamento técnico — aponta.
Alerta pode ser emitido em qualquer fase do voo
O piloto da Air India declarou o Mayday poucos minutos após a decolagem, momento especialmente delicado para qualquer emergência aérea. Segundo a plataforma FlightRadar24, o Boeing perdeu a comunicação quando ainda estava a apenas 190 metros de altitude.
— Não é comum ter emergências do tipo Mayday na decolagem, mas é possível, em qualquer fase do voo, que exista uma emergência. Se a aeronave não consegue subir ou perde sustentação, o tempo de reação é muito curto. Provavelmente perceberam algo errado, declararam emergência e pediram socorro — analisa Fogaça.
Fogaça lembra ainda de um exemplo recente de uso do protocolo de emergência no Brasil, em dezembro de 2018, envolvendo um Boeing 777 da Latam que partia para o exterior.
— Eles começaram a ter uma degradação de sistemas a bordo e declararam emergência. Alternaram para Confins, fizeram um pouso acima do peso máximo, com a pista reservada e os bombeiros posicionados. Não teve vítimas, foi um caso bem-sucedido do protocolo funcionando — afirma.
Boeing 787
O avião envolvido no acidente é um Boeing 787-800 Dreamliner, modelo de última geração, lançado em 2011, projetado para substituir o Boeing 767. Segundo a empresa, existem mais de 1.175 Dreamliners em serviço, que representam 2,1 mil voos por dia.
Com capacidade para até 248 passageiros, é considerado um dos mais modernos do mundo, feito com materiais compostos e equipado com sistemas de controle eletrônicos de alta precisão.
Seu alcance é de até 13.530 quilômetros, o que permite voos intercontinentais sem escalas — como o trecho entre Índia e Reino Unido. Até esta quinta-feira, não haviam registros de acidentes fatais com esse modelo em voos comerciais.
— É um avião que incorpora conceitos de aerodinâmica avançados, um dos mais modernos. Teve alguns incidentes no começo do desenvolvimento, em relação às baterias, mas tudo foi resolvido e hoje, é uma aeronave muito confiável para voos de longo curso — observa Fogaça.
Saiba mais sobre o avião:
- Capacidade para até 248 passageiros
- Alcance de 13.530 km
- 57 metros de comprimento
- 60 metros de envergadura (distância entre a ponta de uma asa até a outra)
- 17 metros de altura
- O peso máximo de decolagem é de 227,9 toneladas
Comunicação é padronizada mundialmente
A função dos termos Mayday e Pan-pan é facilitar a coordenação entre pilotos, torres de controle, aeroportos e equipes de emergência.
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), eles estão previstos nos manuais de comunicação usados no Brasil e seguem as normas da Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO), adotadas por mais de 190 países.
Mesmo com os avanços tecnológicos — como sistemas de envio de dados via satélite e monitoramento remoto de telemetria —, a comunicação por voz no rádio segue sendo o principal canal para emergências.
— Muitas vezes, uma emergência que está em andamento já foi percebida pelo fabricante, que recebe os dados do voo em tempo real. Mas isso não substitui a declaração feita pelo piloto. O rádio ainda é amplamente usado — completa Fogaça.
Tragédia na Índia deixou mais de 200 mortos
A tragédia na Índia é considerada o primeiro acidente fatal com um Boeing 787 Dreamliner desde sua estreia, em 2011. A aeronave da Air India estava viajando de Ahmedabad para Londres, no Reino Unido. Mais de 240 pessoas estavam a bordo do Boeing 787-800 Dreamliner. Dessas, mais de 200 faleceram.
O Boeing 787 da Air India emitiu um sinal de socorro e "caiu logo após a decolagem em Ahmedabad" às 13h39min no horário local (5h09min de Brasília), informou a a autoridade de aviação civil indiana em comunicado.
As autoridades indianas informaram que o avião caiu em cima de uma casa onde funcionava um alojamento de médicos. Segundo o The New York Times, pelo menos cinco estudantes de Medicina que estavam no local morreram. A direção-geral de aviação civil da Índia divulgou uma declaração à mídia local:
"O capitão Sumeet Sabharwal é um tenente-coronel com 8,2 mil horas de experiência. O copiloto tinha 1,1 mil horas de experiência de voo".
*Produção: Murilo Rodrigues