Uma designer de destaque pôs uma subalterna em quarentena, forçando-a a trabalhar em um closet. Um executivo de RP da indústria fez os colegas limparem as mãos com álcool gel. Editores de revista germofóbicos limparam o escritório com lenços antissépticos e spray desinfetante.
Tamanho era o medo que rondava o mundo fashion enquanto se preparava para a Semana de Moda de Nova York com uma gripe de matar e um norovírus doentio à solta.
O evento de oito dias em fevereiro, quando fashionistas ao redor do mundo se espremem em espaços pequenos para comparecer aos desfiles de passarela e às festas - apenas para se amontoarem nos mesmos voos e repetirem o processo em Londres, Milão e Paris - é sempre uma ocasião para paranoia com doenças. Nos últimos anos, fungadas na primeira fileira podiam gerar olhares fulminantes e exclusão social.
Mas com o pânico da gripe desta temporada, o medo chegou à histeria. Colegas do ramo reconsideraram até mesmo os dois beijinhos nas bochechas, saudação padrão da tribo fashion mundial. Mandar beijinhos de longe parece mais seguro por enquanto.
"Esta será a temporada onde todo mundo da indústria da moda se tornará misteriosamente não-afetivo", disse Laura Brown, diretora executiva da Harper's Bazaar. Funcionários nos escritórios de Manhattan, ela completou, limparam as maçanetas com lenços higiênicos. "Ou nós podemos dar uma cotovelada e uma piscada."
Para ser justo, muito da paranoia tem fundamento. De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, as mortes causadas pela temporada atual de gripe alcançaram níveis "epidêmicos", em parte por causa de um tipo severo e incomum de gripe. Somam-se à epidemia com ares de gripe, um novo tipo de norovírus, que pode causar diarreia repentina e vômito, e o pior surto de coqueluche em 60 anos.
Enquanto há evidências de que a temporada de gripe tenha atingido quase todo mundo nos Estados Unidos, com exceção da Costa Oeste, a atividade da gripe continuou alta em Nova York em janeiro, e crescente em partes da Europa, incluindo a Itália. O norovírus também parece estar surgindo no exterior, alcançando níveis epidêmicos na França, de acordo com o relatório da rede médica do país, Reseau Sentinelles.
Ainda assim, mesmo que a gripe esteja terminando em Nova York, continua sendo uma preocupação na bolha do mundo da moda. Com colegas virando noites sem dormir amontoados em locais apertados dia e noite, as coisas podem ficar virais rapidamente, especialmente na placa de Petri que é a Semana de Moda.
"As pessoas do ramo estão sob risco de uma variedade de síndromes virais porque elas trabalham muitas horas e andam em bando", disse o Dr. Robert Glatter, conhecido nos círculos de moda por atender em casa (ou nos estúdios).
O Dr. Barry Cohen, cuja clínica de atendimento primário fica em frente ao estúdio de Marc Jacobs, disse ter sido bombardeado com divas da indústria fashion e seus olhos remelentos implorando soluções rápidas. "As pessoas dessa indústria encostam umas nas outras o dia todo, então ficam expostas frequentemente", explicou.
E quando o bando está se movendo rápida e furiosamente, não pode parar para esperar os fracos. "Temporada de Semana de Moda é um ataque constante ao sistema imunológico", disse Derek Blasberg, editor geral da Harper's Bazaar. "Desfiles logo cedo, jantares atrasados, pessoas amontoadas em cabines e aviões: você não quer sentar perto de ninguém que esteja tossindo, porque se você ficar doente, está ferrado."
O ataque viral não termina com Nova York. "Quando acabamos os desfiles de Nova York, nós já estamos em ruínas, simplesmente porque Nova York tem muitos desfiles", disse Mickey Boardman, diretor editorial da revista Paper. "Então você entra em um avião e já começa a trabalhar em Londres, onde sempre há ótimas festas. Você come fritas na hora da janta e bebe Coca-Cola do seu minibar, e seus horários de sono ficam bagunçados."
"Você está colocando sua vida em risco", completou.
Enquanto manter o mundo na moda tem seus perigos, fashionistas têm desenvolvido táticas para evitar a doença. Muitos tomaram suas vacinas contra gripe obedientemente (não é muito tarde, embora ela demore duas semanas para criar imunidade.)
Outros seguem variações do que poderia ser chamado de dieta da fome padrão do mundo fashion, seja beber grandes quantidades de água engarrafada enriquecida com eletrólitos, fortificada com pacotes de suplementos de vitamina, ou se alimentar à força com nada mais do que legumes crus. Glatter diz ter tratado pessoas do ramo até com diarreia de tanto comerem couve.
E há os que bebem suco. A designer Cynthia Rowley confia na Juice Press, uma rede de Manhattan que é popular entre pessoas da moda devido a suas garrafas de 10 dólares de meio litro de suco de frutas e legumes. "Eu sou viciada", contou Rowley, que diz tomar a bebida com os membros de sua equipe.
"Ninguém está doente no meu escritório", gabou-se perigosamente. "Nós trabalhamos em um só cômodo, então se uma pessoa cai, ela leva a equipe inteira junto."
Outro grupo de moda conteve seu desejo de tocar o que mais ama: pessoas lindas e superfícies macias. A stylist que virou designer, Rachel Zoe, acredita na limpeza dos aviões. "Eu nunca toco em maçanetas, lavo minhas mãos constantemente, e não passo por um frasco de álcool gel sem usá-lo", confessou.
Frascos de álcool gel, aparentemente, podem ser encontrados em cada uma das Bolsas Trapézio Celine - às vezes para o prejuízo do usuário exigente. Glatter disse que ele recentemente tratou um jornalista de moda cujas mãos estavam rachadas e vermelhas por lambuzá-las com o gel a cada 10 minutos.
Quando tudo o mais falha, há a quarentena da polícia fashion, especialmente quando o prazo ameaçador dos desfiles significa que os subalternos não podem ser mandados de volta para casa. Jeffrey Costello e Robert Tagliapietra, da equipe de design Costello Tagliapietra, dizem saber de uma estilista de destaque que fez uma produtora de desfile que fungava o nariz trabalhar a semana inteira sozinha dentro de um closet. "Ela foi humilhada", disse Costello sobre a produtora, "mas não iria deixar que isso a impedisse de receber o pagamento".
Para alguns, a gripe até sugeriu opções de moda. Nina Garcia, diretora criativa da Marie Claire, disse que ela tem usado um cachecol de caxemira preto da Hermès ao redor da boca em qualquer lugar neste inverno. "Eu tento não respirar o ar de mais ninguém", explicou.
Mas apesar de seus melhores esforços para manter a boa saúde cheia de glamour, fashionistas são mamíferos também e, às vezes, têm um colapso. Esse cenário nunca é bonito, especialmente em um desfile de passarela. "Eu já vi gente desmaiar", disse Simon Doonan, o embaixador criativo da Barneys New York. "Nunca fica bonito de se ver. Suas pernas não ficam retas."
Boardman, da Paper, lembra-se de ter se sentando em um desfile da Chanel em Paris, quatro anos atrás, infectado por um vírus. "De repente eu precisei violentamente ir ao banheiro", disse ele. "Eu podia ver a capa do jornal do dia seguinte: 'Editor de Moda se Emporcalha no Grand Palais'." Ele mal aguentou o desfile de 12 minutos. "Esse foi o único desfile de Paris que fiz", finalizou.
Doenças públicas também podem gerar esquecimento. Algumas temporadas atrás, Haidee Findlay-Levin, estilista, estava embarcando em um voo Nova York - Paris com uma gripe pesada, quando ela encontrou uma designer de destaque e seu sócio. Ao se inclinarem para trocar dois beijinhos, ela os alertou sobre a doença.
"Eles se afastaram como se eu tivesse uma praga", disse ela. O constrangimento foi agravado ao ter que se sentar entre eles. "Eles tomaram um comprimido para dormir e colocaram cobertores sobre suas cabeças, e me ignoraram enquanto eu fiquei sentada lá, com medo de tossir."
As modelos, em particular, parecem ser mais suscetíveis. "Nós já tivemos muitos incidentes de modelos desmaiando, vomitando, passando mal ou com calafrios", contou Rowley.
Ava Smith, uma modelo de 24 anos que planeja desfilar nesta temporada para Chanel e Valentino, lembra-se de ter ficado doente em Londres no ano passado. "Meus olhos estavam saltando do rosto, meu nariz estava vermelho como o do Rudolph (a rena do nariz vermelho), e eu tinha lenços de papel enfiados nas minhas roupas enquanto andava pela passarela", disse ela. "Nós éramos um grande aglomerado de muco."
Tais histórias sombrias levantam uma dúvida: por que as pessoas da moda não ficam na cama quando estão doentes? "Fique em casa e veja os desfiles online", implorou Doonan. "Achar que você precisa estar lá mesmo que esteja transmitindo a gripe é loucura."
E novamente, há darwinianos que acreditam que temporadas de coleções separam os guerreiros dos peso-pena. "Na última semana de moda, eu acordei com a cabeça prestes a explodir", disse Leandra Medine, que escreve para o popular blog de moda Man Repeller. "Eu parei na frente do espelho e disse: 'Você não está doente e vai conseguir aguentar até o evento do Altuzarra hoje às 20 horas e vai arrasar'."
The New York Times
Um desfile de doenças
Semana de Moda de Nova York é sempre uma ocasião que gera paranoia com doenças
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