
A Polícia Federal indiciou por corrupção eleitoral 36 moradores de Caraá, município de 7,3 mil habitantes situado no Litoral Norte. Entre os responsabilizados está o vereador mais votado no último pleito, Fabiano Santos da Silva (Republicanos), que foi reeleito. O inquérito foi remetido à Justiça nesta semana.
Todos os 36 foram indiciados com base no artigo 299 do Código Eleitoral brasileiro, que prevê pena de reclusão de um a quatro anos para quem der, oferecer, prometer ou receber, para si ou para outra pessoa, qualquer vantagem, como dinheiro, bens ou favores, em troca de votos. É a corrupção eleitoral, que envolve compra ou venda de votos.
Fabiano Santos foi indiciado por corrupção ativa (compra de votos). Ele chegou a ser preso em março, com prisão preventiva decretada por coação a testemunhas que depuseram contra ele na Polícia Federal. O vereador teria tentado convencer um eleitor a mudar um depoimento que o incriminava, por pagar eleitores para que votassem nele. Esse cidadão se queixou à PF, que prendeu o parlamentar. O político foi solto dias depois, sob a condição de usar tornozeleira eletrônica.
O caso de Fabiano Santos e das compras de votos em Caraá foi revelado pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI) logo após o pleito de 2024. A reportagem ouviu algumas das pessoas que disseram ter vendido o voto a Santos. E obteve cópias de diálogos por WhatsApp entre moradores de Caraá e o vereador.
Em uma das conversas, uma eleitora se oferece para conseguir dois votos em Santos (dela e de uma amiga), desde que ele consiga ajuda. Santos pergunta "quanto?", e ela responde "R$ 300" para ela. O candidato baixa a oferta para R$ 300 pelos dois votos, e ela aceita. Depois exibe o Pix recebido em nome dele.
A reportagem conversou com a eleitora, que confirma ter recebido o dinheiro do vereador.
— Eu sou uma dos mais de 40 que foram prestar depoimento, confirmando que venderam voto. Em dinheiro e material para casa — admite.
Outra eleitora, dona de casa, diz que recebeu R$ 150 em Pix. Afirma que escutou comentários de que Santos estava pagando por voto. Uma amiga teria recebido e repassado a ela.
Pobre precisa de dinheiro, né. Aqui sempre deu compra de voto. Em todas as eleições é assim. Não tem risco de eu ser presa, né? Porque aí vai ter que precisar de um ônibus para levar essa cambada de gente, pelo amor de Deus.
ELEITORA
Dona de casa que admiter ter vendido seu voto a Santos
As palavras da eleitora foram proféticas. O número de indiciados pela PF nesse caso é suficiente para encher um ônibus.
O vereador Fabiano Santos trabalha com operação de máquinas. Posteriormente, alguns dos entrevistados pelo GDI confirmaram a corrupção eleitoral, em depoimentos na Delegacia de Direitos Humanos e Defesa Institucional da PF (Delinst). Conforme depoimentos de eleitores à PF, Santos teria prometido ajuda por meio de maquinário para consertar estradas (pertencente a um familiar) e saibro.
Corrupção ativa e associação criminosa
Condutor do inquérito, o delegado Fernando Bertuol ouviu mais de 40 testemunhas e também, mediante mandados judiciais, realizou busca e apreensão na residência e em empresas de terraplenagem de familiares de Santos. Dos 36 indiciados, dois (o vereador e um familiar) foram indiciados por corrupção ativa (compra de votos) e associação criminosa. O político também foi indiciado por apropriação indevida de valores destinados ao financiamento eleitoral, omissão de gastos na prestação de contas eleitoral e coação a testemunha.
O Ministério Público já pediu a cassação de Santos, após mais de 20 pessoas declararem ter vendido apoio a ele nas urnas. A ação de investigação judicial eleitoral, movida pelo promotor de Justiça Camilo Vargas Santana, é por abuso de poder e captação ilícita de sufrágio. Caso condenado, o vereador pode ser cassado e ficar inelegível por oito anos.
Corrupção passaiva
Já os outros 34 indiciados responderão por corrupção passiva e associação criminosa — são eleitores que admitem ter vendido o voto ao vereador Santos. A maioria deles colaborou com a investigação da PF, inclusive repassando prints de diálogos de WhatsApp com o vereador e comprovantes de Pix recebidos.
O delegado Bertuol diferencia o vereador dos que venderam o voto. "Em sua grande maioria, os autores do crime de corrupção eleitoral, na forma passiva, são eleitores de baixa escolaridade, pessoas simples, menos afortunados, que de forma espontânea colaboraram com as investigações, mantendo até dúvida razoável sobre a ciência da ilicitude de sua conduta", ressalta trecho do inquérito policial.
Com base nisso, o Ministério Público cogita propor a suspensão do processo judicial aos vendedores de voto que colaboraram com a investigação.
Contraponto
O que diz Fabiano Santos da Silva
A reportagem tentou contato com o vereador nesta quinta-feira (22), mas ele não respondeu.
Santos foi ouvido pela reportagem na época em que começou o processo eleitoral por compra de votos. E declarou: "Meus advogados aconselham a não me manifestar e nem comentar o processo. Vamos aguardar".