
JP Amaral respira o E que compõe a sigla ESG e representa environmental (ambiente). Como gerente de Natureza do Instituto Alana, organização que atua pelo direito de crianças e adolescentes, lidera os esforços de atuação e defesa de causas ambientais, que têm recebido grande atenção da entidade.
É, ainda, conselheiro do Greenpeace Brasil e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e cofundador da rede Bike Anjo. Bacharel em Gestão Ambiental pela Universidade de São Paulo (USP), faz parte da rede de futuros líderes do Programa da Chanceler Alemã da Fundação Alexander von Humboldt. Também é membro alumni da rede Red Bull Amaphiko de Empreendedores Sociais e do Young Global Changers.
Em entrevista a Zero Hora, discorreu sobre a importância da educação ambiental inserida desde a infância e seu papel em moldar os adultos e profissionais que atuarão nas empresas no futuro.
Confira a entrevista:
Por que a consciência dos impactos ambientais que causamos e a promoção da educação ambiental são importantes?
Apesar de parecer uma coisa longínqua, que veremos os resultados a médio e longo prazo, pensando principalmente nas crianças, quando fazemos o trabalho de educação ambiental, estamos em uma corrida contra o tempo, de gerações que já estão nascendo com um cenário muito ruim, muito catastrófico. De mudanças climáticas, por exemplo, em que já houve períodos em que passamos da média global de temperatura, e a gente não esperava isso acontecer até algumas décadas para frente. Outro tema mais concreto ainda, por exemplo, é o do plástico. É uma invenção que tem cerca de 50 anos. Já está em uma escala em que vamos alcançar ter mais plástico no mar do que peixes. Vamos ter uma condição de resíduos sólidos de modo geral, mas plástico especialmente. Vai ser muito dramático. Então, a educação ambiental vem com o papel justamente de alertar, atentar e conseguir mobilizar uma geração de pessoas conscientes e engajadas para resolver esse problema. E não é só na escala micro, individual, mas pessoas que vão se formar estarão ocupando lugares nas empresas, falando em ESG, nos diferentes tipos de trabalho em que vamos precisar realmente encontrar cada vez mais soluções. Precisamos criar essa consciência coletiva de que essa é a nossa casa comum.
A conscientização ambiental pode ajudar a prevenir tragédias climáticas como a que aconteceu no Rio Grande do Sul?
Com certeza. A gente vem adotando um conceito que se chama educação baseada na natureza, uma educação ambiental que não só está trazendo a consciência, ou seja, o conhecimento sobre as questões ambientais para o currículo ou para o aprendizado, mas coloca em prática o que se chama soluções baseadas na natureza. Ações que, a partir de medidas de valorização da natureza, de arborização da cidade, de permeabilização do solo com outras soluções, por si só já ajudam a minimizar ou se adaptar às mudanças climáticas. Então, essa educação baseada na natureza favorece já colocar em prática o que a gente precisa ver na infraestrutura das escolas, das cidades, das comunidades, para que isso aconteça. No caso do RS, é até mais interessante observar que, na escala que foi, é realmente um grande desafio você separar todos os territórios estruturalmente. Porém, tem uma medida de educação ambiental que é muito importante, que é treinar ou criar protocolos para a redução desses riscos, do impacto. Existem já exemplos de comunidades que fizeram, junto com a escola, um treinamento para que todos os professores, os pais e as crianças saibam o que fazer quando acontece uma tragédia como aconteceu no RS. E isso previne uma série de questões de saúde, obviamente, de óbitos também, mas principalmente de proteção de toda a comunidade. Essa também é uma medida que vai gerar essa educação na comunidade, de entender os impactos disso e como podemos nos proteger, mas, consequentemente, também traz uma mensagem de que a gente precisa cuidar do planeta.
Como promover a educação ambiental de maneira efetiva?
O ponto principal que trabalhamos no Instituto Alana é que a educação ambiental deve realmente ser feita desde o começo, desde os primeiros anos de vida. Porém, a forma que a gente acredita que isso possa ser feito é, de fato, garantir o máximo de acesso à natureza, principalmente às crianças pequenas. É por isso que a gente fala também dessa educação baseada na natureza, ou seja, em contato com a natureza. Para o desenvolvimento da criança, para gerar anticorpos com a natureza e tudo mais. Para além disso, a criança, conectando-se com a natureza, se conecta com a sua essência, com os ecossistemas, com os animais, com as plantas. E aprende a cuidar delas. Aprende a amar e depois a cuidar. Essa é a melhor forma de você introduzir uma efetiva educação ambiental. Para depois, sim, mais velha, ela poder ter consciência dos impactos que estão acontecendo no planeta e o que ela pode fazer por isso. É para toda a vida. Nós como adultos também, nesse período de férias, precisamos recarregar nossas energias na natureza, na praia, na floresta, nos parques, nas praças. Então, esse contato diário mesmo das crianças com a natureza é essencial para uma educação ambiental assertiva e para a saúde dela, para a socialização, entre outros benefícios.
O tema ambiental não é novidade para as crianças. Está, inclusive, nas diretrizes curriculares do ensino. Como promover, entre os adultos, que já estão nas empresas, a conscientização sobre impactos ambientais e sobre como agir?
Para além da influência que as crianças podem ter dentro de casa, dessa consciência, os adultos são, de fato, as gerações responsáveis por realmente fazer a mudança que tem de acontecer. É necessário a gente pensar no papel que as empresas têm, quando falamos de medidas ESG, medidas que realmente protejam, garantam essa natureza e esse meio ambiente equilibrado para as atuais gerações, mas também para as futuras gerações, que é o que a gente chama de justiça intergeracional. Além disso, vemos um movimento acontecendo no mundo, a partir de todo o movimento que aconteceu dos jovens pelo clima, dos Fridays for Future, das crianças liderando esses movimentos globais, de os adultos também começarem a fazer parte disso. Então, no Brasil já existe o Famílias pelo Clima, por exemplo, que são esses grupos de pais, tios, avós, todas as pessoas que têm algum contato com crianças, para fazer a sua parte. Agir é fundamental, porque vai além de colocar em prática as ações individuais, locais. É realmente você lutar. É quase um desafio de todo mundo ser, de certa forma, um ambientalista. Isso é essencial também como movimento de educação ambiental. A partir desse contato com outros pais que estão fazendo isso, elas cuidarem do planeta para as futuras gerações. Então, tem várias ferramentas hoje para a gente fazer isso. Porém, tem um papel essencial também, um ator muito importante nessa educação ambiental dos pais, que é o poder público. A gestão pública é quem tem as ferramentas necessárias para dar incentivo ou mesmo cobrar da população medidas ambientais mais saudáveis para o meio ambiente. Então, o resíduo sólido já é um bom exemplo. Hoje, a gente não tem uma política de pagar pelo lixo gerado. Isso é também uma ferramenta de educação ambiental. A partir do momento que a gente exige que a população faça parte da redução do consumo de embalagens ou mesmo de retorno, na política de logística reversa que a gente tem no Brasil, mas ainda não é implementada de forma eficaz, é uma medida de educação ambiental também. Você começa a colocar formas da população ter incentivos se ela recicla ou ter também gastos se ela consome mais resíduos também. Isso também é uma ferramenta de educação ambiental que se transformaria em uma escala sistêmica, que é o que estamos precisando para o tamanho do problema que estamos lidando.
Você sustenta que as crianças devem estar no centro do debate climático. Por quê?
As gerações de hoje já estão nascendo com impactos futuros muito maiores do que os seus avós. Se a gente olhar para a realidade presente, são as crianças também que são mais vulneráveis a todos os tipos de impactos ambientais. Para dar um exemplo, poluição do ar. As crianças hoje são mais impactadas pela poluição do ar, tanto pela quantidade, proporcionalmente, que ela inala, como também pelo seu corpo que ainda está se desenvolvendo. E, por exemplo, as vias respiratórias são muito menores do que as de um adulto. Então, o material particulado, que são os principais poluentes, acaba entupindo essas vias respiratórias com muito mais facilidade. Agora, o exemplo também das mudanças climáticas. Hoje, globalmente, metade da população de crianças e adolescentes já sofre algum tipo de risco climático, por enchentes, por secas, por outros tipos de eventos extremos. No Brasil, isso chega a 40 milhões de crianças e adolescentes, e são essas as populações mais vulneráveis também, porque elas não conseguem ter o mesmo tipo de resposta. Por exemplo, com o que aconteceu no RS, a gente teve um grande choque para toda a população, e as crianças principalmente foram muito afetadas nesse sentido. Foram quase milhares de alunos que perderam as escolas, e essas escolas até hoje ainda estão em reconstrução. Então, apesar dos eventos extremos acabarem, as pessoas acharem que voltou ao normal, a verdade é que as crianças não têm o seu direito à educação ainda por vários e vários meses. Então, em todas as dimensões dos direitos das crianças, elas são mais impactadas, mais afetadas. E quando a gente olha a nossa Constituição Federal, temos um artigo, 227, que fala que as crianças e adolescentes precisam ter os seus direitos garantidos com absoluta prioridade. Ou seja, é o único público em que isso é considerado dentro da Constituição. Tem de ter absoluta prioridade no orçamento, medidas de garantia do direito à educação, direito à saúde. Então, as mudanças climáticas estão afetando, querendo ou não, um direito absoluto que deve ser considerado ali pela Constituição.