Todos os dias, o tribunal do tráfico de drogas julga, condena e executa suas vítimas num país que, pela lei, não tem pena de morte. Todos os dias, em algum lugar deste Brasil gigante, traficantes adultos se matam em disputas por pontos de venda de drogas, sem que isso provoque alguma comoção. Mas quando é uma criança que tomba vítima da guerra do tráfico, somos asfixiados pela sensação de que todos os limites foram rompidos.
A sexta-feira foi um desses dias: Laura Machado, sete anos, morreu enquanto dormia num beliche, na zona sul de Porto Alegre, vítima de uma bala perdida. Seu irmão de 11 anos ficou ferido.
Há duas semanas, no Morro do Alemão, no Rio de janeiro, outra criança, o menino Eduardo, foi morto enquanto estudava, sentado numa escada. São dois inocentes, vítimas de uma violência que tem a mesma origem: o tráfico de drogas, que só existe porque existe consumo.
Os jovens que compravam drogas no Bar do Nelson, fechado na mesma madrugada pela polícia no bairro Boa Vista, podem achar que não têm nada a ver com a morte de Laura. Afinal, a menina morreu na periferia, numa casinha bem diferente dos prédios onde vivem os clientes do bar fechado a partir de denúncia de pais aflitos. O dono e os garçons presos podem pensar a mesma coisa, mas têm sim: o traficante só prospera porque a lei da oferta e da procura não falha.
A polícia enxuga gelo. Prende traficantes que logo estarão soltos ou serão substituídos por outros. Fecha pontos de venda, que renascerão em outro endereço. Mas a criminalidade continua, porque falta integração entre as esferas municipal, estadual e federal. Porque falta educação, as armas entram com facilidade, os traficantes acham que o ganho compensa o risco e o sistema penitenciário não reeduca.
Não há o que se possa fazer por Laura ou pela família devassada, mas ainda é possível evitar que outras crianças sejam as próximas vítimas.
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