
Cinco pessoas foram indiciadas por crimes praticados durante audiência pública sobre o transporte coletivo de Porto Alegre, ocorrida em 10 de março, no Ginásio Tesourinha. Conforme o titular da 1ª Delegacia da Polícia Civil, Paulo César Jardim, outras duas pessoas foram identificadas e serão incluídas no inquérito - o documento será encaminhado à Justiça na tarde desta quarta-feira.
Quatro são apontadas pela prática de dano qualificado (por ser contra o patrimônio público) e uma por explosão, crime considerado mais grave. A audiência foi iniciada às 19h de uma segunda-feira e encerrada 30 minutos depois. O tumulto generalizado começou quando parte das pessoas que estavam no ginásio retirou as telas que dividem a quadra da arquibancada e invadiu o espaço destinado às autoridades.
- O risco de morte era muito acentuado, e isso não foi medido por esses rapazes - afirma Jardim, mostrando fotos e vídeos de bombas e tonéis plásticos sendo lançados.
O delegado ressalta que o foco da investigação foi apontar os autores dos atos praticados. Há, também, registro de três termos circunstanciados por lesão. Não há comprovação de que os cinco indiciados tenham relação uns com os outros nem que eles tenham ido à audiência com o intuito de depredar o prédio.
Brizolla, conhecido como Briza, já havia sido denunciado pelo Ministério Público por participar da depredação do Palácio da Justiça, em junho do ano passado. Anarquista, ele tem atuação no Movimento Autônomo Utopia e Luta e é um dos rostos mais populares nos atos do Bloco de Luta pelo Transporte Público. Silva é um dos indiciados pela depredação do Museu Júlio de Castilhos, em outubro do ano passado. Ele é professor da rede estadual.
O delegado diz que havia cerca de 600 pessoas no Tesourinha no momento do tumulto - ele se baseia na lista de presença feita antes do início da audiência. Estima-se que o prejuízo tenha sido de aproximadamente R$ 50 mil.
Zero Hora não conseguiu localizar os indiciados para que eles se manifestassem.
Vídeo mostra os momentos de tensão no Ginásio Tesourinha
Veja imagens da confusão durante audiência pública no Tesourinha
O Bloco de Luta pelo Transporte Público enviou à reportagem nota sobre o posicionamento do movimento em relação ao "processo de criminalização" de militantes. Leia o texto na íntegra:
"Há poucos dias da Copa da Fifa, militantes que participam do Bloco continuam sendo alvo de perseguição política e intimidação! Além da criminalização e do enquadramento jurídico que o Estado e o aparato repressivo do período de exceção da FIFA impõem, militantes sofrem a pressão da polícia, discreta frente aos olhares públicos e intensa na individualização intimidatória de cada um, investindo em táticas de silenciamento e desmobilização que fazem jus a regimes autoritários que muitxs de nós julgam encerrados.
Com frequência, militantes vem tendo as suas casas arbitrariamente invadidas pela polícia. Não são raras as denúncias de militantes perseguidos, fotografados e coagidos após atos, assembleias e reuniões do Bloco. Além disso, dezenas de lutadores sociais vêm respondendo judicialmente por crimes que não cometeram, embora nem a polícia e nem o Ministério Público tenham conseguido estabelecer um mínimo nexo de causalidade entre fatos criminosos e as condutas dos denunciados.
Este cenário de perseguição e criminalização mostra que a estratégia recente da polícia é não deixar tão à mostra para a sociedade a sua verdadeira face violenta. Deixaram de nos atacar tão frequentemente com bombas, sabres e tiros, mas seguem aterrorizando e prendendo as pessoas de forma isolada e sem motivo. Seguem abordando militantes e lutadorxs sob falsos pretextos, com vistas à intimidação. Da violência aberta e desmedida, visível aos olhos de todxs - violência que marcou as manifestações e os atos de 2013 -, a polícia agora afina suas táticas, e passa à perseguição individualizada, investindo na perseguição política minuciosa, insuflando o medo durante e após os atos, intimidando constantemente militantes e restringindo sua liberdade de expressão e associação.
Isso mostra que a Polícia Militar, fortemente armada e violenta, ainda é uma polícia política como foi nos tempos da ditadura, pronta para usar seu aparato repressor para intimidar e criminalizar a luta de ativistas sociais, indicando que um passado obscuro de nossa história ainda está longe de ser superado.
Tais atitudes têm um propósito mais amplo do que o ataque pontual a alguns indivíduos: visam minar a mobilização coletiva e o trabalho de base do Bloco de Luta; barrar a sua construção coletiva junto à população; afastar o povo da rua, criando uma antipatia pública em relação ao Bloco e suas pautas - associando-as ao crime - com a tentativa de desarticular a organização e a resistência de coletivos e ativistas contra os aumentos segregatórios no transporte público e contra a Copa das remoções, das tropas, da desigualdade, e contra o Estado de exceção FIFA.
A criminalização e a presença ostensiva da polícia na rua não podem nos desmobilizar. Diante do estado de medo e silêncio que governos e polícia impõem, é preciso ainda mais uma vez persistir na luta e gritar com coragem: Solidariedade aos/às companheirxs vítimas da violência jurídica do Estado!
A luta não se reprime: protesto não é crime!
Não à criminalização dos movimentos sociais!"