Gustavo Brigatti
O nome do projeto é Mormaço, mas poderia se chamar Marcelo Camelo, banquinho e violão. Em seu segundo registro ao vivo (em CD e DVD), o ex-Los Hermanos revisita novamente sua curta carreira solo, desta vez em formato enxuto e clima intimista, em show no Theatro São Pedro, em Porto Alegre. Só Marcelo, um banquinho e um violão (e uma rabeca ocasional).
A escolha pela capital gaúcha foi casual. O DVD seria gravado pela Zeppelin Filmes, sediada em Porto Alegre, e o projeto pedia um espaço pequeno e com boa acústica. Tocar em um dos palcos mais nobres da cidade, que reúne essas duas exigências, acabou sendo uma decisão natural - e acertada, uma vez que o ambiente intimista do São Pedro deixa Marcelo suficientemente à vontade para conduzir seu público mais pela emoção do que pela razão. Talvez, por isso, a escolha de um repertório que quase não precisou ser mexido: foi sentar e tocar.
- Muitas das músicas foram escritas nesse formato, portanto foi mais o trabalho de estar pronto pra fazer deste formato um mergulho interior. O exercício foi aprender a me emocionar tocando violão ao vivo pra uma plateia. Acho que o que o público observa quando vai a um espetáculo é o que aquela obra está fazendo com a pessoa que a executa. Por isso, a procura é por músicas que me causem este mergulho interior - explica Camelo em entrevista por e-mail.
Para reforçar a intenção intimista de Mormaço, a câmera evita planos abertos e opta por closes demorados, às vezes em Marcelo, às vezes buscando detalhes no palco. Ou, ainda, alternando-se no "duelo" entre o violão de Camelo e a rabeca do músico suíço Thomas Rohrer, que aparece esporadicamente para acrescentar uma melancolia condizente com a proposta em faixas como Tudo que Você Quiser e Menina Bordada.
- Nas filmagens, tentamos fugir dos planos feios, reveladores. Como trabalhamos com câmeras digitais, a busca foi a de manter o caráter inebriante de uma experiência presencial. O risco que queria evitar era a tradução feia que a compressão de cores de um sensor digital pode fazer da realidade - pontua Camelo.
Além das faixas dos dois primeiros discos de Camelo, Sou (2008) e Toque Dela (2011), Mormaço traz as inéditas Luzes da Cidade e Porta de Cinema - esta última, de autoria do avô do músico, Luis Souza - e o curta-metragem Dama da Noite.
Parte integrante da experiência sensorial oferecida pelo músico, o filme traz uma colagem de imagens captadas em 8 e 16 milímetros durante a última turnê com sua banda de apoio, Hurtmold, cenas de arquivos, bastidores e lugares por onde Marcelo passou nos últimos dois anos. É, de alguma forma, uma espécie de depoimento visual sobre o lugar que Camelo ocupa no cenário musical brasileiro - um lugar que ele próprio faz questão de botar em xeque:
- Não estou certo das coisas caminharem nestes termos mais e da existência de um cenário estático e predominante, quase tátil, tal como era há uma década. Estamos vivendo o colapso deste modelo e adentrando no desconhecido, ao mesmo tempo em que inventamos uma nova dinâmica. Eu me sinto bem, me localizo entre os insistentes.