Existe hoje no (ex) país do futebol um debate diário entre o jornalismo esportivo, o público torcedor e os profissionais do esporte: será que o futebol não é mais o mesmo?
A cada coletiva de imprensa, a cada entrevista, a cada programa de TV, rádio ou internet, vemos e escutamos termos que até 10 anos atrás eram pouco familiares: marcação alta, transição ofensiva, temporização, gegenpressing e tantos outros mais.
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Alguns jornalistas esportivos volta e meia citam estes termos com um grau enorme de culpa, como se estivessem ofendendo o torcedor. Mas será que o torcedor se sente ofendido mesmo? Quando vou ao médico e ele me diagnostica com um "eritema fruto de afeções cutâneas de causas externas", eu não me sinto ofendido ao saber que era só um vermelhão de uma picada de mosquito.
Vale a mesma coisa para termos jurídicos, de engenharia, arquitetura e tantas outras profissões com seus idiomas próprios e técnicos. Não sou obrigado a conhecer, mas não me sinto ofendido por alguém que os usa. Mas se eu posso aprendê-los, por que não fazê-lo? Por que não conhecer mais sobre uma das maiores paixões do mundo?
Estes termos técnicos do futebol são usados desde sempre pelos profissionais da área. Só que nós jornalistas, talvez por medo ou preguiça, achávamos aquilo tudo complicado demais para nós e para o grande público compreender. Agora, com a tonelada de informações e conteúdos sobre futebol disponíveis a um clique, acabaram-se os mistérios. Qualquer apaixonado por futebol pode, se quiser, entender como um profissional da bola pensa, trata e fala da sua profissão.
No Brasil sempre houve um certo preconceito com o conhecimento. Até o uso da palavra "doutor" tem cunho negativo, vindo de outros tempos e mantido até hoje. Na verdade, a busca pelo conhecimento deveria ser o alvo principal da sociedade, e não motivo de vergonha ou ofensa. E o fato de se referir a coisas com suas nomenclaturas corretas não diminui a paixão e a loucura de torcer.
Não é que o futebol tenha mudado. Segue sendo 11 contra 11 em um jogo sistêmico e caótico em torno de uma bola. Mudar o nome das coisas não muda o jogo. Ao contrário! Só gera mais identidade ao mostrar o que ele realmente é: um esporte apaixonante e acessível a todos.
*Gustavo Fogaça é comentarista e blogueiro da Rádio Gaúcha