
Profissão Gauchão traz uma série de reportagens com profissionais que trabalham nos clubes que disputam o Gauchão 2025. Ao longo da primeira fase, GZH contará a história de personagens que fazem a diferença no cotidiano das equipes. Nesta sexta-feira (14), confira a história de José Leandro, capitão da equipe de manutenção do gramado do Beira-Rio.
Folhação, colchão drenante, teste de tração, planejamentos agronômico e de adubação, salinidade, altura de corte, controle de moléstias, aclimatação, capacidade de drenagem, saturação de água… Não é fácil cuidar de um gramado de futebol. Só para entender os termos técnicos necessita-se de um glossário. As palavras são ditas por José Leandro Melo Flores, 46, com a mesma naturalidade com que Alan Patrick, o camisa 10 do Inter, acerta um passe de cinco metros.
José Leandro é o capitão do time responsável pelo campo de jogo da casa colorada. Embora capitaneie a equipe, está mais para uma versão Roger Machado da manutenção daquele quadrado verde. Para o gramado “desempenhar” quando os jogadores pisam nele, a grama é “treinada” todos os dias. É como se fossem jogadores.
— Depois que comecei a trabalhar (no Inter), vi que é um trabalho que exige muito compromisso e responsabilidade, porque a área esportiva não para. O gramado é como um atleta. A gente prepara ele para o jogo, e a gente tem que pensar na saúde dele como um todo. Recuperar o gramado a cada três, quatro dias é um desafio — explica.
Há um planejamento diário de hidratação. Entre 24 e 48 horas a gama é cortada para a manutenção da altura adequada. Uma demanda bem diferente daquela que José Leandro encarava antes de chegar ao Inter, em 2002, aos 23 anos.
Trabalhava no campo, com agricultura. Cultivo do arroz. Uma produção agrícola intensiva, mas de rotina diferente da vivida na Avenida Padre Cacique. Ele vive com um olho no gramado e outro no céu. A previsão do tempo é sua aliada (ou inimiga?). Prever quando choverá e quantidade de precipitação é vital para manter a altura ideal da grama e a pintura. Os maiores desafios são durante o outono e o inverno. Época de menos sol e mais chuva.
— A gente não pode remover mais que um terço da folhação (gramas novas) do gramado para não gerar estresse e não perder a coloração — ensina.
A recuperação após a enchente
Nenhuma adversidade nestes 23 anos foi tão grande quanto a vivida em maio passado. Toda a dedicação de anos para manter o tapete verde se perdeu com a enchente de 2024. Não sobrou grama para contar história de jogos passados.
O campo ficou submerso por nove dias. O primeiro passo foi entender o tamanho do estrago de toda a estrutura ao redor do gramado, como sistemas de irrigação e drenagem.
— A gente também estava com a corda no pescoço porque era inverno. No inverno, você não tem lavoura com grama para fornecer para o clube no mesmo padrão e dar condições de jogo. O clube optou por restabelecer a grama de inverno porque a gente tinha uma boa resistência de tração no sol. Foi o que nos favoreceu junto com as demais estruturas do clube se restabelecendo, a recuperar o gramado em curto período até dar sequência ao plantio — conta.

A engenhosidade que envolve o gramado do Beira-Rio impressiona. José Leandro fala de cada detalhe de um sistema completamente diferente daquele utilizado pelo Inter quando ele foi contratado. Aquele Beira-Rio tinha pista atlética de saibro e uma outra sob a grama. O Beira-Rio virou estádio de Copa, gramado de Copa;
— Eu cheguei aqui no tempo em que a gente tinha a pista atlética, era saibro. É um trabalho que precisa de muita disposição física e boa vontade. Hoje em dia, tem um gramado sintético em torno, mas tem o desafio da sombra (por causa da cobertura). Falo que sou de um tempo que ainda fazia muita capina na pista atlética — relata.
José Leandro não esconde a satisfação de ver o resultado do seu trabalho ser exaltado pela imprensa e por adversários.
— Bom, para mim, sempre foi um motivo de orgulho. A gente acaba sendo uma referência para vários trabalhos. A gente sabe que o clube virou referência na questão de gramado e outras áreas também. Então, o nosso desafio é fazer com que o investimento do clube se traduza num bom trabalho para o nosso atleta, principalmente, e pras outras equipes que vêm jogar aqui.
Sempre que o gramado do Beira-Rio é elogiado, o elogio também é para José Leandro.