— Vivo um novo momento no Grêmio.
Mesmo sem dominar o português, o atacante Francis Amuzu, de 26 anos, garante já estar 100% adaptado a Porto Alegre e ao clube. E empolgado com a perspectiva de receber mais chances na equipe.
Sorridente do início ao fim, o ganês naturalizado belga conversou com a reportagem de Zero Hora em inglês por 26 minutos, nesta segunda-feira (13), no CT Luiz Carvalho. Falou sobre a sua trajetória da África rumo à Europa, onde se estabeleceu com apenas dois anos, e o desafio de se adaptar à vida em Porto Alegre, onde mora desde fevereiro com a esposa Nora, 26 anos, e a filha Amara, que completará dois anos em novembro.
E a família vai aumentar.
— Sim, o segundo está a caminho. Espero que seja um menino, mas ficarei feliz também se for uma menina. Mas vai nascer aqui com certeza. Será gaúcho — contou, sorrindo, como sempre.
O plano de ter um filho ou uma filha no Brasil não é coincidência. Ao longo da entrevista, Amuzu demonstrou estar motivado a construir uma história no Tricolor.
— Quero conquistar muitas coisas com o Grêmio. Talvez no próximo ano, tentar ficar entre os cinco primeiros (do Brasileirão). Quero dar um passo de cada vez, mas estou focado em desempenhar bem e conquistar grandes coisas com este grande clube — afirmou.
Apesar de ter sido criado na Bélgica, o atacante se sente mais identificado com Gana, país onde nasceu e pelo qual sonha disputar uma Copa do Mundo – a seleção africana garantiu a vaga no Mundial 2026 poucas horas antes da entrevista.
— Gana foi o país onde nasci. Para mim, eu sou ganês, No momento, o meu coração está com Gana. Então, se me convocarem, com certeza eu vou. Mas agora o meu foco está aqui no Grêmio — disse.
Adaptado ao idioma
Amuzu fala fluentemente inglês, francês, holandês e um idioma local de Gana. No Grêmio, já consegue compreender um pouco do português, tanto dos companheiros quanto da comissão técnica. Na hora de falar, porém, ainda arrisca poucas palavras.
— O idioma foi o mais difícil para eu me adaptar. O português é uma língua muito difícil, mas agora eu entendo o que os jogadores falam. Falar é que é difícil. Só falo algumas coisas dentro de campo, como “saiu”, “direita” e “esquerda — revela.
Segundo Amuzu, um quadro tático o ajuda a entender as instruções do técnico Mano Menezes.
— A linguagem do futebol é uma só — resume.

Além disso, Marlon, Braithwaite, Camilo, Willian e Carlos Vinícius, que dominam o inglês, são os que mais o ajudam a traduzir tanto os aspectos do jogo como as resenhas do grupo.
O ganês inclusive já consegue entender as brincadeiras do grupo.
— Os brasileiros são todos muito gentis. Todos querem te ajudar, e eu adoro isso. Os caras mais engraçados do vestiário são o Dodi e o Edenílson, sempre estou rindo com eles — conta.
Amuzu revela que se surpreendeu com a intensidade do futebol brasileiro e com o estilo das arbitragens. Segundo ele, o jogo no Brasil é mais rápido do que na Bélgica.
— A intensidade do jogo é muito alta e os árbitros aqui deixam o jogo correr mais. Na Bélgica, se alguém te empurra, é falta. Aqui o árbitro só te olha e diz “levanta” — revela.
Ajuda especializada
Para ajudar na adaptação ao Brasil, Amuzu conta com ajuda profissional. Ele mantém consultas online com um coach mental, que mora na Holanda.
— Acho isso muito importante e necessário no futebol. Às vezes você não joga e não entende o motivo. Aí a cabeça pesa, então você tem que conversar com alguém de fora do clube — afirma.
E isso aconteceu ao longo de 2025. Por dois meses, entre o fim de julho e o fim de setembro, Amuzu atuou por apenas seis minutos na derrota por 1 a 0 em casa para o Sport, no dia 10 de agosto. No mais, foram dez jogos amargando o banco ou sequer sendo relacionado.
Nas últimas semanas, porém, a maré mudou. Nos últimos três jogos, Amuzu ingressou em todos. Na vitória por 3 a 1 sobre o Vitória, fez um gol e deu uma assistência. Além disso, foi o grande destaque da vitória por 5 a 0 no jogo-treino contra o Brasil, onde também balançou as redes. O atleta inclusive está cotado para ser titular contra o São Paulo na quinta (16).
— Não sei dizer porque não jogava. Mas continuei trabalhando duro e agora ganhei minha chance de novo. Sei que o futebol é feito de altos e baixos. Mas para mim agora com certeza é um novo momento — finaliza.
Confira a entrevista exclusiva de Francis Amuzu a Zero Hora

Você veio de uma cultura e língua diferentes. Como foi se adaptar ao Brasil e ao futebol brasileiro?
Amuzu: No começo foi um pouco difícil, porque o campeonato é forte, os jogadores são agressivos e não tem muito espaço (para jogar). Para mim, o Brasil é uma liga realmente difícil. Muita gente na Europa acha que o futebol brasileiro é mais fácil, mas acredite, é uma liga muito difícil de se jogar. Não é fácil jogar aqui. Mas esses jogos no Brasil me deixaram mais forte.
Quais foram os pontos mais difíceis de se adaptar? Não só dentro de campo, mas também no país.
Amuzu: No país, talvez o idioma. Às vezes queria comer em algum lugar e era preciso usar o celular para traduzir. Mas foi ok. Dá para me virar, isso não é um grande problema.
Você já aprendeu algumas palavras em português?
Amuzu: Um pouco, sim. Às vezes, dentro de campo, eu entendo agora o que os jogadores falam. Mas é uma língua difícil, muito difícil. Falar é o mais difícil. Mas agora eu já entendo bastante.
É mais fácil ouvir o português do que falar?
Amuzu: Exatamente.
Que palavras você já consegue falar no campo?
Amuzu: Só dentro de campo, palavras como “saiu”, quando a bola está fora. “Esquerda”, e “direita” também.
São as palavras mais importantes para um ponta, né?
Amuzu: Sim. “Esquerda” e “direita”. São as que eu mais aprendi por aqui.
No começo foi um pouco difícil, porque o campeonato é forte, os jogadores são agressivos e não tem muito espaço. Para mim, o Brasil é uma liga realmente difícil.
Com quem você mais conversa no Grêmio?
Amuzu: Principalmente com o Marlon, que me ajuda muito. E também Braithwaite, Willian e Carlos Vinícius. Os que falam inglês. Mas me dou bem com todo mundo. Eles riem comigo. O que percebi é que os brasileiros são todos muito gentis. Todos querem te ajudar, e eu adoro isso. E quero dizer algo também. Os caras mais engraçados do vestiário são o Dodi e o Edenílson, sempre estou rindo com eles. Tive uma boa relação com todo o time.
Mas você entende o que eles falam? Como é a comunicação com os jogadores que só falam português. Os companheiros te ajudam a traduzir?
Amuzu: O Marlon me ajuda. O Camilo também sempre me ajuda com as traduções a todo momento. Mas hoje, nos treinos, já entendo bastante coisa. Quando estamos fazendo exercícios de posicionamento e o técnico fala, eu entendo bem agora. Todo mundo no clube me ajuda muito e eu sou grato por isso.
Quando o técnico Mano Menezes te dá instruções táticas, por exemplo, como você faz para entender?
Amuzu: Antes dos jogos, ele usa o quadro tático para explicar e eu entendo. O futebol tem uma linguagem universal. A linguagem do futebol é uma só. Então, não é difícil para mim, dá pra entender. O idioma não é o problema principal.
Que diferenças você percebe entre o futebol do Brasil e o da Bélgica?
Amuzu: A intensidade. A intensidade aqui no Brasil é muito alta. E os árbitros aqui deixam o jogo correr mais. Na Bélgica, se alguém te empurra, é falta. Aqui o árbitro só te olha e diz “levanta”.
Sabe que no Brasil a gente costuma dizer o contrário, que os árbitros param demais o jogo e que na Europa é diferente. Então, você está dizendo que é o oposto, certo?
Amuzu: Sim, eu acho que aqui eles simplesmente deixam o jogo correr mais. Se é falta, eles não dão o cartão vermelho, ou algo assim. Para mim essa é a grande diferença entre a Bélgica e aqui: a intensidade.
No Grêmio, depois de um tempo sem jogar, você entrou nas últimas partidas. Marcou e deu assistência contra o Vitória, foi elogiado pelo Mano Menezes e também foi destaque, com gol no jogo-treino contra o Brasil. Por que você acha que não estava jogando antes? E o que mudou? Você acredita que está vivendo um novo momento agora?
Amuzu: Sim, para mim com certeza agora é um novo momento. Não sei dizer por que eu não jogava. Eu treinava normal e bem, mas não recebia minutos. Mas quando tive a oportunidade, provei que posso contribuir. Agora eu só tenho que trabalhar duro e me manter mentalmente forte. Se você é mentalmente forte, tudo flui. E também sempre acreditar em Deus. Tudo está nos planos de Deus. Para mim, isso é o mais importante.
A intensidade aqui é muito alta. E os árbitros aqui deixam o jogo correr mais. Na Bélgica, se alguém te empurra, é falta. Aqui o árbitro só te olha e diz “levanta”
Você se sente totalmente adaptado agora?
Amuzu: Sim, me sinto adaptado. Estou totalmente adaptado. Continuo trabalhando duro e tentando evitar lesões. Eu não gosto de lesões. Sei que lesões vão acontecer na vida do jogador. Mas depois do treino faço massagem, cuido do corpo para estar em forma e jogar bem.
Quando você chegou ao Grêmio, você disse que o técnico Gustavo Quinteros foi importante para a sua decisão de vir. Como foi a adaptação ao estilo de trabalho do Mano Menezes?
Amuzu: Sim, o primeiro técnico, o Gustavo (Quinteros), me queria. Ele me ligou, disse: "eu te quero neste clube". Disse que eu era um bom ponta. Isso me passou um bom sentimento. Ele me adorava e explicou por que. Também me disse que eu jogaria bastante. Então, foi uma decisão fácil para mim vir para cá, pois senti confiança no treinador. Depois, com o Mano, comecei jogando, depois fiquei um pouco fora, talvez por conta do meu desempenho. Cada técnico tem uma visão diferente. Mas continuei trabalhando duro e agora ganhei minha chance de novo. Agora espero ter cada vez mais bons momentos e ter bom desempenho. Sei que o futebol é feito de altos e baixos. Mas o importante é você tentar dar o melhor sempre nos treinos e tudo vai dar certo.
O estilo do Mano é muito diferente dos técnicos europeus com quem você trabalhou?
Amuzu: Para ser honesto, não. É um pouco igual. Só muda um pouco a parte tática. Sempre fui um ponta, mas agora com o Mano Menezes, tenho jogado mais por dentro, quase como um camisa 10.
Não tão aberto na ponta?
Amuzu: Isso, não tão aberto. Normalmente, eu sou aquele jogador mais aberto de ir para o 1 contra 1 pela ponta, mas agora estou entendendo melhor esse papel de jogar por dentro. E estou me acostumando e adorando jogar por dentro. Mas às vezes posso também trocar de posição com o lateral-esquerdo.
Seguindo essa instrução do Mano Menezes e se posicionando mais como um número 10, você fica mais perto do gol, talvez seja mais fácil de marcar gols, não?
Amuzu: Exato. Eu assisto aos meus treinos depois com o meu coach mental e percebo que agora fico mais perto do gol, o que é bom pra fazer gols e dar assistências. Porque, quando jogo aberto, fico mais longe do gol. Agora, eu estou entendendo, tentando melhorar a todo momento nos treinos para desempenhar bem nos jogos.
Você tem um coach mental?
Amuzu: Sim, tenho um coach mental. Acho muito importante no futebol.
Um coach mental pessoal?
Amuzu: Sim, um coach mental pessoa. Acho necessário no futebol. Às vezes você não joga e não entende o motivo. A cabeça pesa, então você tem que conversar com alguém de fora do clube.
Ele é da Europa?
Amuzu: Sim, da Europa.
Da Bélgica?
Amuzu: Não, da Holanda.
Você fala holandês?
Amuzu: Claro. É a minha primeira língua.
Você fala então holandês, francês e inglês?
Amuzu: Inglês e ganês também.
E talvez no futuro português?
Amuzu: Talvez. Vai vir, com o tempo. Ouvindo sempre, vai vir com certeza.
Você nasceu em Gana e foi muito novo para a Bélgica né? Quando e por que você se mudou para a Europa? E como se tornou um jogador de futebol?
Amuzu: Sim. Eu fui para a Bélgica quando tinha dois anos de idade. Fui por causa do meu pai. Ele também é ex-jogador de futebol. Jogou em um time em Gana e depois um clube belga quis contratá-lo, então ele foi para a Bélgica. Aí eu, meu pai, minha mãe e minha irmã nos mudamos para lá. Foi assim que fui parar na Bélgica. E acho que jogo futebol porque o futebol também está no sangue do meu pai. E ele me passou isso.
Então você viveu a maior parte da vida na Bélgica, certo? Ainda mantém alguma relação com Gana hoje em dia?
Amuzu: Sim, claro. Gana ainda é o meu primeiro país. Eu nasci lá. Tenho contatos lá com a minha família e com meu estafe. Amo Gana.
Você sabe que Gana se classificou hoje para a Copa do Mundo. Eu inclusive estava na dúvida se já devia te parabenizar ou se devia esperar a classificação da Bélgica.
Amuzu: Não, eu sou ganês, nasci em Gana. Então, estou feliz que Gana se classificou para a Copa do Mundo. É um torneio maravilhoso, um dos maiores do mundo.
Jogar uma Copa do Mundo é um objetivo para você? E você está elegível para jogar tanto pela Bélgica quanto para Gana. Você já se decidiu? Qual país você gostaria de representar?
Amuzu: Para ser sincero, no momento o meu coração está com Gana. Então, se Gana me convocar, com certeza eu vou. Espero que me chamem. Mas agora meu foco está aqui no Grêmio, em tentar desempenhar bem todos os jogos, e no futuro veremos o que acontece.
Francis, conte sobre sua rotina em Porto Alegre. O que você e sua família gostam de fazer no tempo livre?
Amuzu: Gosto de passar muito tempo com a minha família. Isso é o mais importante, porque nós, jogadores, não temos tanto tempo com a família. Então tento aproveitar com eles. Sair para comer algo, brincar com minha filha. Para mim isso ,é muito importante. Sou muito ligado à família, gosto de estar com eles.
E a família vai aumentar, né?
Amuzu: Sim, sim, o segundo está a caminho.
Parabéns pelo segundo filho!
Amuzu: Muito obrigado. Espero que seja um menino.
Sério? Prefere um menino?
Amuzu: Sim, prefiro, mas é como Deus quiser. Ficarei feliz também se for uma menina.
Esse menino vai ser gaúcho?
Amuzu: Sim, Vai nascer aqui, com certeza!
Para ser sincero, no momento o meu coração está com Gana. Então, se Gana me convocar, com certeza eu vou. Espero que me chamem. Mas agora meu foco está aqui no Grêmio
Quais são os seus planos para o futuro? Pretende ficar no Grêmio por mais tempo?
Amuzu: Meu objetivo é somente conquistar muitas coisas com o Grêmio. Talvez no próximo ano, tentar ficar entre os cinco primeiros. Quero dar um passo de cada vez. Não quero pensar muito adiante. Quero pensar um passo de cada vez, trabalhar duro, e veremos no futuro. Mas, por enquanto, neste momento estou aqui focado em desempenhar bem e conquistar grandes coisas com este grande clube. Esperamos que a gente consiga.
Qual é a sua opinião sobre a torcida do Grêmio e o ambiente nas arquibancadas?
Amuzu: Em todos os jogos a torcida é maravilhosa. Canta os 90 minutos, tanto em casa quanto fora. Eu adoro isso. E espero ver todos na quinta-feira (contra o São Paulo) e que a gente possa vencer juntos.





