Após o futebol, Jardel passou a se sustentar com o dinheiro acumulado na carreira e dedicou-se a outras atividades, como partidas festivas promovidas pelo departamento consular do Grêmio. Com os anos e à medida em que os recursos foram minguando, visualizou a ideia de disputar uma eleição.

Os exemplos de dois ex-atletas do clube que obtiveram êxito nessa migração, Danrlei, deputado federal, e Tarciso, vereador de Porto Alegre, ambos do PSD, despertaram a vontade de concorrer e a esperança de que a idolatria nutrida pelos gremistas poderia ser convertida em votos. Em setembro de 2012, durante entrevista a ZH, Jardel declarou a intenção pela primeira vez e disse que procuraria Danrlei para discutir o assunto.

— Vou conversar com ele (Danrlei) sobre isso. De repente, saio pelo partido dele. As pessoas gostam de mim no Rio Grande do Sul. Dá para fazer um trabalho social interessante com o esporte — afirmou na ocasião.

Um assessor do ex-goleiro e deputado federal se declara responsável pela filiação do ex-centroavante ao PSD. O marqueteiro Sérgio Bastos Filho, torcedor fanático do Grêmio, conta que foi ele quem orientou Jardel a transferir o domicílio eleitoral de Fortaleza para Porto Alegre e encaminhou o processo de adesão ao partido. Na época, Serginho, como é conhecido no futebol, era o elo entre o gabinete de Danrlei e o departamento consular do clube. Intermediava a participação do deputado em atividades nos consulados do Interior e em cidades de fora do Rio Grande do Sul, como churrascos, festas e jogos. Entre idas e vindas ao Estádio Olímpico, onde cruzava com ex-jogadores assíduos dos eventos, o assessor ouviu de funcionários do clube e de ex-atletas a informação de que Jardel estava interessado em concorrer.

— Não me recordo se foi em novembro ou dezembro (de 2012), mas procurei ele e questionei: "Tu queres mesmo ser candidato? Não é fácil, não é brinquedo, eu posso te ajudar". Ele respondeu que estava disposto, e eu disse que falaria com o partido. Foi muito mais simples do que as pessoas imaginam — relatou Serginho.

Como o marqueteiro tinha trânsito livre com a cúpula do PSD por ser assessor e ter trabalhado na campanha de Danrlei, levou a proposta aos dirigentes da sigla, entre eles o próprio ex-goleiro. O nome de Jardel foi aprovado.

Na época, os líderes do partido acreditavam que Jardel havia superado a antiga vida desregrada. Viam nele potencial eleitoral, desde que fosse assessorado. Entre o dia da filiação e o anúncio oficial da candidatura, em 2014, o ex-centroavante passou a acompanhar Danrlei em compromissos pelo Interior e a dividir as atenções dos torcedores (e eleitores) com o ex-companheiro de time.

Ainda não era período eleitoral, e a estratégia de vincular a imagem dos dois já era percebida nas agendas de ambos. Sérgio garante que a ideia partiu dele, apesar das supostas resistências de Danrlei e de membros do partido:

— Danrlei não procurou o Jardel para concorrer. Estrategicamente, por uma questão eleitoral, vinculei os dois. Eles só fizeram eventos de Grêmio juntos. O Danrlei não gosta de polemizar, mas ele não teve responsabilidade pela filiação. Ele não tinha como rejeitar o Jardel no partido.

Quem mais resistiu ao ingresso do ex-centroavante na legenda foi o hoje vice-governador do Estado, José Paulo Cairoli. Antes da campanha, o empresário questionou repetidas vezes os integrantes do partido sobre a conduta de Jardel.

— Vocês sabem mesmo o que estão fazendo? — perguntava.

O candidato Jardel aparece com o deputado Danrlei, até então seu amigo

BD, Guilherme Araujo, 29/8/2013

A partir do período eleitoral, o PSD escalou João Batista Portella Pereira, ex-integrante do PTB, para ser o coordenador da campanha de Jardel. Portella conta que, em abril de 2014, reuniu-se com o ex-atleta para explicar como seria a eleição e para orientar os seus passos, desde a forma de se vestir até como se portar em público e entrevistas. Quando o candidato teve participação desastrada no quadro Na Chincha, do La Urna, de ZH (confira vídeo abaixo), a sua equipe chegou a pensar que tinha colocado tudo a perder.

— Pensei que ele estava preparado para falar. Foi um erro nosso, nos empolgamos com o trabalho que vinha sendo feito e deu naquilo que todos viram, um desastre — lembrou Portella.

Na entrevista, Jardel se complicou ao explicar os motivos pelos quais queria ser deputado — disse que buscava uma "ocupação" —, não quis opinar sobre casamento gay e ainda declarou ser "de direita" porque se considera um sujeito "direito".

No quadro Na Chincha, do La Urna, de ZH: apresentação desastrosa

Reprodução, 3/12/2014

 

Com pouco dinheiro — o candidato gastou cerca de R$ 80 mil, enquanto a média dos eleitos foi de R$ 412,6 mil  —, a principal tática dos cabos eleitorais de Jardel era aliar a imagem à de Danrlei, dono de um capital político expressivo (173.787 votos em 2010). Foi assim durante os jogos do Grêmio na Arena e em algumas viagens a municípios do Interior, como Santiago e Tapejara.

Luiz Felipe Scolari, então técnico do clube, fez aparições na TV pedindo votos para o ex-comandado. Danrlei o ajudou a obter votos e circulou pelos confins do Estado em busca de apoio para si e para o colega de partido.

— A gente não tinha dinheiro para fazer placas, era uma tristeza. Mas o Jardel é um cara grande, era só colocar ele no pátio da Arena que juntava uma multidão — disse Portella.

Durante a campanha, a equipe de Jardel era coordenada por Portella e Serginho e tinha também Ricardo Tafas, Roger Foresta e Walmir Martins como auxiliares. Os três últimos são investigados pelo Ministério Público por envolvimento nas irregularidades da Operação Gol Contra, deflagrada em novembro passado. Apesar da desastrosa entrevista ao La Urna, a conduta do então candidato era elogiada pela equipe. Supostamente longe das drogas, Jardel cumpria à risca os compromissos definidos pelo partido.

O objetivo da legenda nas eleições de 2014, além de manter a cadeira de Danrlei, conquistada pelo deputado quando filiado ao PTB, era obter uma vaga na Assembleia. O PSD calculava que poderia eleger um deputado estadual com 30 mil votos, mas os candidatos Tarciso Flecha Negra, Edu Olivera e Nelcir Tessaro não tinham potencial eleitoral para isso. Sob o ponto de vista prático, o investimento em Jardel teve o melhor resultado possível e confirmou as estimativas da sigla. Tarciso, Edu e Tessaro tiveram, juntos, 25.128 votos. Sozinho, Jardel obteve 41.227.

No dia da votação, em 5 de outubro, Jardel teria sofrido uma recaída e voltado a consumir drogas. Mesmo assim, os assessores o levaram para votar, ainda na esperança de obter apoio dos eleitores que chegavam indecisos às zonas eleitorais. Após a apuração e a confirmação da eleição como o 34º mais votado entre os 55 deputados, o ex-centroavante teria sido confrontado por Portella e chorado por causa da reincidência no uso de cocaína.

PRÓXIMO

VOLTAR AO TOPO