A mulher que se apaixonou por uma harpa e outras histórias

Mesmo no universo da música clássica, há instrumentos tocados por relativamente pouca gente. Descubra por quê


Fábio Prikladnicki
fabio.pri@zerohora.com.br









Uma curiosidade chamou a atenção dos organizadores do concurso para o quadro de músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) em dezembro último: ninguém foi aprovado para a única e solitária vaga de harpista. E a oferta não foi grande. Dos sete inscritos nesta especialidade, apenas dois compareceram. Mas a comissão julgadora concluiu que nenhum deles alcançou o nível técnico exigido para o cargo.

O episódio ilustra um fenômeno que intriga as orquestras há tempos: a escassez de músicos que tocam instrumentos menos comuns, seja pelo preço do equipamento ou pela dificuldade de tocá-lo. Às vezes, a falta de oferta se deve simplesmente pelo desconhecimento da maior parte da população. Nesta reportagem, Zero Hora conta a história de cinco músicos que tocam instrumentos relativamente pouco populares, mas fundamentais no universo da música clássica: harpa, fagote, tuba, trompa e oboé. Eles relatam a descoberta de suas vocações, a busca por discípulos e as maneiras criativas pelas quais explicam a conhecidos o instrumento que tocam.

O diretor artístico da Ospa, Evandro Matté, observa:

– Na maioria dos casos, o motivo da pouca procura é o custo destes instrumentos. Mesmo o preço dos modelos simples são muito caros. Começaram a fazer fagotes de plástico (para estudantes), mas também não são muito baratos. No Brasil, há vários projetos sociais que viabilizam o acesso à música, mas raramente têm em seu escopo estes instrumentos.

Não é uma questão exclusiva dos brasileiros, como lembra Fabio Mechetti, diretor artístico e regente titular da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais:

– No mundo inteiro, há dificuldade de encontrar certos instrumentos em nível profissional. Grande parte das orquestras dos Estados Unidos e da Europa procura os mesmos músicos: primeira trompa, primeiro fagote, oboé. É uma questão de oferta e demanda. Tem pouca gente tocando, então a competição é grande. Logicamente, os melhores vão para as orquestras que pagam melhor, e as orquestras que não têm tantos recursos ficam sem esses cargos.
"A harpa é um dos instrumentos mais antigos que existem"
Norma Rodrigues é uma joia rara no Rio Grande do Sul: harpista aposentada da Ospa desde 2010, ela segue requisitada pela orquestra sempre que uma obra exige a presença do instrumento – o que ocorre frequentemente. Formada em piano, começou a tocar harpa justamente por necessidade da Ospa. Foi convidada pelo grande maestro Pablo Komlós, no final dos anos 1950, para "quebrar um galho" e decidiu levar a sério. Estudou o instrumento em São Paulo, Montevidéu e Munique, onde tocou com a tradicional Orquestra da Rádio da Baviera.

– Quando eu não toco, a Ospa é obrigada a trazer alguém de Curitiba, São Paulo, Argentina – comenta, em sua casa no bairro Petrópolis, em Porto Alegre.

Norma desconstrói as ideias pré-concebidas que envolvem o instrumeno no imaginário popular:

– Tem o estereótipo dos anjos e das mulheres cheias de fru-fru tocando harpa. Mas é uma ideia equivocada. Existem grandes harpistas mulheres e homens. Não existe mais isso para instrumento algum (associar o instrumento a um único gênero). A harpa é um dos instrumentos mais antigos que existem, mas se desenvolveu, de fato, depois do impressionismo.

A musicista já acompanhou grandes figuras da música pop, como Tony Bennett, Julio Iglesias, Barry White, Roberto Carlos e Ray Conniff. E tocou duas vezes com a Orquestra Filarmônica de Israel, sob regência do prestigiado maestro Zubin Mehta. Na segunda vez, em São Paulo, a oportunidade surgiu porque a primeira harpista da orquestra israelense havia ficado para trás no meio da turnê devido a um problema de saúde. A história ilustra a escassez de profissionais do instrumento:

– Não tinha telefone celular, então deixaram umas 30 mensagens na minha secretária eletrônica, uma mais desesperada do que a outra. Quando liguei de volta, eles me disseram: "O concerto é amanhã" (risos). Graças a Deus, deu tudo certo. Foi uma sensação maravilhosa tocar em uma orquestra onde tudo funciona. Você só precisa se encaixar.
"Quando descobri que a fabricação do instrumento era no Exterior, comecei a perceber as dificuldades"
A única frustração profissional de Norma é ainda não ter deixado um pupilo para assumir seu lugar na Ospa. É verdade que o instrumento é difícil de carregar e exige disciplina para aprender, mas o grande empecilho é o preço: as harpas profissionais são importadas, e um modelo de estudo chega ao Brasil custando a partir de R$ 60 mil, enquanto um modelo profissional não sai por menos de R$ 200 mil.

Mas Norma bem que tenta. Mariana Guimarães Coelho estudou harpa de 2001 a 2007 e era uma das grandes apostas. Tocava em um instrumento que ficava nos camarins do antigo Teatro da Ospa, na Avenida Independência. Mas trocou a música pela faculdade de Medicina.

– A Norma tinha toda a minha carreira planejada. Comecei por hobby, fiquei balançada, mas não aconteceu. Sempre quis fazer Medicina – conta Mariana, que hoje é patologista.

Há três anos, Norma ministra aulas para Délia Louzada, pianista de Pelotas que viaja mensalmente à Capital para se aprimorar na harpa. Délia lamenta que, por causa da distância, não pode ter aulas semanais. Aprende com um instrumento antigo, que não serve para apresentações. – Minha ambição é participar de uma orquestra profissional, seja a Ospa ou outra. Mas acredito que ainda tenho muito o que estudar e evoluir – afirma Délia.

Enquanto isso, a aprendiz garante que está se preparando para comprar a tão sonhada harpa própria:

– Quando descobri que a fabricação do instrumento era no Exterior, comecei a perceber as dificuldades. Sem ter um instrumento, é praticamente impossível estudar. Mas, dentro dessa realidade, não desanimo.

Harpa

Instrumento da família das cordas, que também inclui violino, viola, violoncelo, contrabaixo e piano.

Para começar a ouvir músicas para harpa, algumas obras de referências são o Concerto para Órgão ou Harpa em Si Bemol Maior, de Händel (1685 – 1759); o Concerto para Flauta e Harpa, de Mozart (1756 – 1791); Danças Sacra e Profana, de Debussy (1862 – 1918); e Introdução e Allegro, de Ravel (1875 – 1937).

Na música popular, a americana Joanna Newsom ganhou notoriedade, a partir dos anos 2000, pelo uso do instrumento. Entre seus discos, estão Ys (2006) e Have One on Me (2010).

Em média, uma harpa de estudo custa a partir de R$ 60 mil reais, e uma profissional, a partir de R$ 200 mil, incluídos os impostos e o frete. Para efeito de comparação, um violão para iniciantes pode custar a partir de R$ 200 (os preços médios citados nesta reportagem podem sofrer variações conforme o modelo do instrumento e a cotação do dólar).

A principal dificuldade para se tornar um harpista é que, para aprender o instrumento, é preciso ter um. A Escola da Ospa não oferece aulas de harpa. A harpista Norma Rodrigues tem ensinado o instrumento para interessados (normarpa@gmail.com).



Ouça o intrumento:

Danças Sacra e Profana, de Claude Debussy
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ransom Wilson, regência)
Harpa: Bridget Kibbey

"Um aluno de clarinete acabou indo para o oboé e conseguiu emprego mais rapidamente"

Estimular o primeiro contato com instrumentos menos conhecidos é uma das tarefas do Conservatório Pablo Komlós, mais conhecido como Escola de Música da Ospa, onde estudam gratuitamente 195 pessoas. Entre os instrumentos mais procurados, estão violino (37 alunos) e viola (18 alunos). Por outro lado, há apenas quatro aprendizes de fagote, outros quatro de oboé, sete de trompa e nove de tuba.

— Um dos objetivos pelos quais a Escola foi criada era oferecer o ensino de todos os instrumentos da orquestra. Havia uma preocupação em não ficar sem músicos para determinadas funções – explica o clarinetista Diego Grendene, diretor da Escola. – Tive um bom aluno de clarinete que acabou indo para o oboé e conseguiu emprego mais rapidamente.

Matté, o diretor artístico da Ospa, adianta:

– Tenho o sonho de conseguir parceiros para ampliar a oferta desses instrumentos (fagote, oboé, trompa e tuba). A Escola já tem alguns (para emprestar aos alunos), mas em número reduzido. O papel da Escola é fundamental. Dos quatro fagotistas da Ospa, dois foram formados lá.

Um deles é Adolfo Almeida Jr., que também é professor da Escola da Ospa e do Departamento de Música da Ufrgs. Ele relata um episódio curioso sobre o primeiro contato com o instrumento, na década de 1970. Já tocava violão e tinha interesse também em saxofone quando chegou na Escola da Ospa para aprender contrabaixo. Certa vez, o maestro Salvador Campanella pediu para ver sua mão e exclamou: "Ah, isso é mão de fagotista!". Hoje, o músico relembra:

– Acho que foi apenas uma cantada dele, pois o professor de fagote estava ocioso. Mas gosto de coisas exóticas, diferentes. Achei que essa predição caiu como uma luva.

Uma dificuldade do fagote, assim como do oboé, é a confecção da palheta, o pequeno dispositivo por onde se sopra, constituído de duas lâminas. Cada músico aprende a montar a sua artesanalmente, que depois é encaixada no instrumento. Uma palheta tem vida útil de apenas um mês. Já há, no entanto, opções feitas de material sintético e maior durabilidade.

– Hoje, há fagotistas que não fazem suas palhetas. Mas é melhor saber fazer, porque às vezes é preciso algum ajuste – recomenda Adolfo.
"Digo que o fagote é uma chaminé no meio da orquestra"
Como outros músicos ouvidos para esta reportagem, Adolfo recorre a imagens criativas para explicar aos conhecidos o que é o instrumento que toca. Muitas pessoas não fazem ideia da aparência de um fagote.

– Sempre tenho que ficar explicando, e muitas vezes desisto – relata, bem-humorado. – Digo que o fagote parece uma chaminé no meio da orquestra.

Adolfo acredita que o público da música clássica costuma prestigiar mais os concertos que destacam pianistas e violinistas, dando menos atenção a programas que têm solistas de outros instrumentos.

– Pelo fato de haver mais mercado para violino e piano, o músico que toca esses instrumentos pode não ser tão bom e ainda assim ser capaz de virar concertista. Porque existe demanda. Já um fagotista ou oboísta que quiser ser apenas solista tem que ser muito, muito bom. Mas empregos em orquestras existem. São instrumentos com quadro deficiente em quase todo lugar.

Além de tocar na Ospa, Adolfo participa de um quarteto de sopros de professores da Ufrgs, que serve também para divulgar os cursos de graduação em flauta, clarinete, fagote e oboé. Neste ano, Adolfo está com seu primeiro aluno de graduação em fagote. Os anteriores eram participantes de cursos de extensão. Provando que o instrumento também se encaixa com perfeição na música popular, seara na qual é bem menos comum, o músico integra o Arthur de Faria & Seu Conjunto. Lamenta apenas a falta de uma cultura musical mais apurada no Brasil:

– Vai ver se na Europa alguém vai fazer uma reportagem sobre instrumentos esquisitos!

Fagote

Instrumento da familia das madeiras, que também inclui oboé, flauta e clarinete

O Concerto para Fagote, de Mozart (1756 – 1791), é uma das obras mais conhecidas para o instrumento. Weber (1786 – 1826) também tem seu Concerto para Fagote, e Vivaldi (1678 – 1741), curiosamente, compôs nada menos do que 39 destes.

Na música popular, destaca-se o trabalho de Adolfo Almeida Jr. como fagotista do Arthur de Faria & Seu Conjunto. Entre os discos da banda, estão Música pra Ouvir Sentado (2011) e Música pra Bater Pezinho (2005)

Em média, um fagote de estudo custa a partir de R$ 7 mil, e um profissional, a partir de R$ 30 mil, incluídos os impostos e o frete.

Aulas de fagote são oferecidas na Escola da Ospa (51 3228-6737), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (51 3308-4310 – graduação / 51 3308-4325 – extensão) e na Universidade Federal de Santa Maria em nível de graduação (55 3220-8443).


Ouça o intrumento:

Concertino para Fagote e Orquestra de Cordas, de Francisco Mignone
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Roberto Duarte, regência)
Fagote: Alexandre Silvério

"Se você leva uma tuba em uma viagem de avião, já preenche o limite de bagagem"

Wilthon Matos não se esquece da primeira vez em que viu uma tuba. Tinha 12 anos e morava em Belém do Pará. Certa vez, um quinteto de professores de metais entrou na sala de aula onde ele estudava para convidar as crianças para se inscreverem no tradicional Conservatório Carlos Gomes, criado ainda em 1895. Os visitantes de pele rosada, que praticamente não falavam português, chamaram a atenção pela maneira bem-humorada como se apresentaram. Mas o pequeno Wilthon só tinha olhos para a tuba, o maior de todos aqueles instrumentos.

Quando se inscreveu no Conservatório, ficou sabendo que a maior necessidade da instituição era alunos de trompa. Não se deu por vencido. Procurou um professor russo, que falava por meio de um aluno intérprete e prometeu aulas de tuba caso Wilthon conseguisse uma. Com recursos financeiros modestos, ele logo descobriu que se trata do mais caro dos instrumentos de metal. Em uma sala da igreja evangélica, o pai de Wilthon, um engenheiro mecânico, descobriu uma tuba velha e amassada que começou a reformar. Foi com ela que Wilthon começou a ter aulas. Tornou-se músico e professor.

O músico chegou na Ospa em 2006, depois de uma passagem pela Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro, em Brasília. Hoje, além de integrar o quadro da orquestra gaúcha, é presidente da associação de funcionários e leciona na Escola da Ospa.

– Além do preço, outra dificuldade é o transporte da tuba. Se você leva em uma viagem de avião, já preenche o limite de bagagem. Quando eu fazia cursos, levava as roupas no próprio corpo. Cheguei a vestir quatro camisas, uma em cima da outra.
"O primeiro passo é convencer os tubistas de que eles podem ser solistas"
O compositor inglês Vaughan Williams foi um dos responsáveis por elevar a tuba ao status de instrumento solo, em 1954, com seu Concerto para Tuba, criado a pedido de Philip Catelinet, então primeiro tubista da Orquestra Sinfônica de Londres. De modo geral, a tuba costumava servir para marcar o ritmo da orquestra. Essa tradição de instrumento de acompanhamento ainda hoje envolve a tuba como um rótulo indesejado que os músicos estão procurando desfazer, como lembra Wilthon:

– Os principais compositores de música erudita de Porto Alegre já escreveram para violino, trompete, trombone. Para tuba, ainda não. Mas o primeiro passo é convencer os tubistas de que eles podem ser solistas. Existe um estereótipo de que a tuba é o instrumento que você deve escolher caso não consiga tocar trompete, trombone ou trompa.

Wilthon sublinha a responsabilidade de tocar o instrumento:

– Na orquestra, comentamos que, se o violinista erra uma nota, consegue esconder o erro em meio aos 12 violinistas. Mas se o tubista errar uma nota, é só ele. Não tem o que fazer.

Com outros músicos do naipe de metais da Ospa, Wilthon criou o Quinteto Porto Alegre, que tem a mesma formação daquele grupo de professores bem-humorados que entrou na sala de aula onde ele estudava quando criança: dois trompetes, um trombone, uma trompa e uma tuba. Tocam um repertório variado que inclui compositores especializados em música para metais. A ideia é divulgar os instrumentos para o público ainda não iniciado na seara clássica. Será que todo o esforço de uma vida dedicada à tuba compensa?

– Vem compensando, graças a Deus – responde. – Hoje, eu me coloco em uma situação de referência em Porto Alegre. Se vou ficar aqui por muito tempo, não sei. Mas, nesse período, minha meta é marcar a vida de todos os tubistas com o meu trabalho.


Tuba

Instrumento da família dos metais, que também inclui trompete, trompa e trombone.

Uma das obras mais importantes para o instrumento é o Concerto para Tuba e Orquestra, do inglês Vaughan Williams (1872 – 1958). Também vale a pena conhecer a Sonata para Tuba e Piano, de Paul Hindemith (1895 _ 1963). O compositor John Williams, conhecido pelas trilhas de filmes como a trilogia original de Star Wars (1977 – 1983), E.T. – O Extraterrestre (1982) e A Lista de Schindler (1993), também compôs um Concerto para Tuba.

Em média, uma tuba de estudo custa a partir de R$ 7 mil, e uma profissional, a partir de R$ 48 mil, incluídos os impostos e o frete. Aulas de tuba são oferecidas na Escola da Ospa (51 3228-6737).

Aulas de tuba são oferecidas na Escola da Ospa (51 3228-6737).




Ouça o intrumento:

Scherzo, de John Cheetam
Quinteto Porto Alegre
Tuba: Wilthon Matos

"A trompa é um instrumento tão enrolado quanto eu"
Instrumentos de metal têm uma longa tradição também na música popular. O jazz está repleto de grandes saxofonistas e trompetistas. No Brasil, Pixinguinha tocava seus choros geniais no sax. Isso sem falar em Kenny G. Não é tanto o caso da trompa, um discreto integrante desta família cuja sonoridade a maioria das pessoas não saberia identificar. Alexandre Ostrovski Jr., trompista da Ospa, relata que tem dificuldade em explicar para os leigos qual o instrumento que toca.

– Geralmente, digo que a trompa é um instrumento tão enrolado quanto eu – conta o músico, referindo-se ao formato do equipamento – As pessoas perguntam: "É aquele que sai (cuja campana está voltada) para cima ou para a frente?" E eu respondo: "É aquele que sai para trás".

Mas Ostrovski nega que um trompista tenha motivos para se sentir diminuído frente à popularidade dos outros instrumentos do naipe. Comenta, brincando, que se trata do "mais nobre da turma". Ele lembra que famosas trilhas de cinema são baseadas na trompa, como a dos filmes Senhor dos Anéis, Piratas do Caribe e Jurassic Park.

– É justamente por causa dessa sonoridade heroica, robusta. Não sinto que a trompa é menosprezada por não estar tão popularizada. É um instrumento que liga o som dos outros. Às vezes, não temos um grande solo, mas é porque estamos justamente amalgamando os outros sons.

O músico explica que é simples tirar um som qualquer da trompa ("Se tu vibrares os lábios, alguma coisa vai sair"), mas não é tão fácil acertar as notas precisamente, pois estão "muito perto" uma da outra, no jargão técnico. As agudas são especialmente difíceis. Vem daí a piada segundo a qual a trompa é um instrumento divino porque, quando o músico sopra, só Deus sabe o que vai soar.

Um trompista experiente, no entanto, é capaz de identificar sutilezas relacionadas inclusive ao país em que cada trompa foi fabricada. As alemãs, que são hoje muito cobiçadas, têm um som nítido e brilhante. As americanas são intermediárias, e as inglesas soam escuras, fechadas. Ostrovski escolhe o tipo de acordo com o repertório. Os alemães Beethoven e Brahms, por exemplo, merecem trompas conterrâneas. Trata-se de um preciosismo de especialista? Nem tanto, explica o músico:

– Quando alguém diz que uma música soa melhor em determinado contexto, isso pode ter a ver com as possibilidades de um instrumento. Ouvindo de longe, o som de uma trompa alemã fica muito mais claro, nítido. Então, o público vai conseguir identificar a música com mais clareza.


Trompa

Instrumento da família dos metais, que também inclui trompete, trombone e tuba.

Entre os compositores que se dedicaram ao instrumento, estão Mozart (1756 – 1791), autor de quatro Concertos para Trompa e Orquestra, e Richard Strauss (1864 – 1949), autor de outros dois. Mahler compôs sinfonias em que se destacam as trompas, como a terceira e a quinta.

Em média, uma trompa de estudo custa a partir de R$ 2,9 mil, e uma profissional, a partir de R$ 30 mil, incluídos os impostos e o frete.

Aulas de trompa são oferecidas na Escola da Ospa (51 3228-6737) e na Universidade Federal de Santa Maria em nível de graduação (55 3220-8443).



Ouça o intrumento:

Concerto para Trompa nº 2, de Richard Strauss
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Kiyotaka Teraoka, regência)
Trompa: Radovan Vlatkovic

"Para mim, o oboé é como um braço, não me separo dele"
Nem todos têm ou tiveram o privilégio de Viktoria Tatour, 47 anos, que toca oboé desde os 10 e, durante muito tempo, nunca precisou explicar a alguém o que é um oboé. Na escola especializada de Minsk, na Belarus (então, parte da União Soviética), onde nasceu e se criou, todos eram aspirantes a músicos. Ao lado de matérias como matemática, física e química, aprendia-se teoria musical, solfejo e harmonia. Começou com o piano por influência da mãe, que tocava por hobby, mas um professor sugeriu o oboé para que ela se diferenciasse, já que o piano é extremamente popular em seu país de origem – e, portanto, a competição é feroz. Só que instrumentos de sopro, naquela escola, eram coisas de meninos. A inspiração para romper o tabu de gênero veio de uma oboísta mais experiente, como relata:

– Na classe do meu professor, tinha uma mulher que havia ganhado todos os concursos de oboé na União Soviética. Já era famosa, de nível internacional. Então, pensei: "Por que eu não posso?"

Sonhando desde criança em tocar em uma orquestra, Viktoria ganhou um oboé da escola, apaixonou-se pelo som "suave como veludo" e, depois de alguns anos, virou professora. Estava casada e tinha uma filha de três anos, no final da década de 1990, quando ficou sabendo da chegada, em Minsk, de uma banca de brasileiros para selecionar músicos para a Orquestra Amazonas Filarmônica, de Manaus. Viktoria não sabia nada do Brasil, mas empolgou-se com o exotismo da América do Sul. Passou no concurso e carimbou o passaporte. O marido e a filha vieram depois. A chegada em Porto Alegre foi depois de uma temporada em busca de emprego em Toronto, no Canadá. A oboísta ingressou na Ospa em 2005. Hoje, também leciona na Escola da Ospa.

– Para mim, o oboé é como um braço, não me separo dele. Sei que qualquer instrumento musical exige muito trabalho, muita paciência, coragem e confiança. Mas, depois que tu aprendes um instrumento, ganhas um amigo sincero.

Viktoria lembra que é o oboísta quem dá o tom para os demais integrantes da orquestra afinarem seus instrumentos no início dos concertos. Depois de uma vida inteira dedicada à música, a bielorrussa reafirma a devoção à profissão:

– Alguns pensam que é fácil, mas nosso trabalho é bem complicado. São muitas horas de trabalho, estudo e repetições. Temos que estudar a vida inteira, não podemos parar. Ser talentoso não é suficiente.


Oboé

Instrumento da familia das madeiras, que também inclui fagote, flauta e clarinete.

Para começar a apreciar a música do instrumento, vale a pena conhecer os diversos Concertos para Oboé de Vivaldi (1678 - 1741). Destacam-se também, no repertório, o Concerto para Oboé em Dó Maior, de Mozart (1756 – 1791), e o Concerto para Oboé em Ré Maior, de Richard Strauss (1864 – 1949).

Na música popular, destaca-se o tema Gabriel's Oboe, de Ennio Morricone, trilha do filme A Missão (1986).

Em média, um oboé de estudo custa a partir de R$ 4 mil, e um profissional, a partir de R$ 37 mil, incluídos os impostos e o frete.

Aulas de oboé são oferecidas na Escola da Ospa (51 3228-6737), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (51 3308-4310 – graduação / 51 3308-4325 – extensão) e na Universidade Federal de Santa Maria em nível de graduação (55 3220-8443).



Ouça o intrumento:

Concertino para Oboé e Cordas, de Brenno Blauth
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Cláudio Ribeiro, regência)
Oboé: Javier Balbinder

Orquestra completa
Clique e ouça os sons dos instrumentos que integram um conjunto de música clássica. Os áudios foram extraídos do CD que acompanha o livro A Orquestra Tintim por Tintim (editora Moderna), com autorização das autoras, Liane Hentschke, Susana Ester Kruger, Luciana Del Ben e Elisa da Silva e Cunha, e da editora.

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Agradecimentos
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre
Editora Moderna
Liane Hentschke, Susana Ester Kruger, Luciana Del Ben e Elisa da Silva e Cunha


Créditos
Texto: Fábio Prikladnicki
Imagens: Bruno Alencastro, Carlos Macedo, Júlio Cordeiro e Tadeu Vilani
Edição de vídeos: Marcelo Carôllo
Programação: Michel Fontes e Guilherme Maron
Design: Michel Fontes e Guilherme Gonçalves