Aos 22 anos, Danrlei já podia ser considerado um veterano na Libertadores de 1995. Sua trajetória profissional havia se iniciado no começo de 1993, quando, ainda júnior, foi chamado pelo técnico Cassiá para ser o terceiro goleiro, atrás de Emerson e Ademir Maria. Viraria segundo quando Emerson sofreu fratura na perna direita, em fevereiro, mas a direção trouxe Eduardo Heuser, do Goiás.

– Pensei que teria a mesma sina do meu tio (o ex-goleiro Beto), que também tinha sido formado em casa e nunca recebia uma chance de se firmar – comenta Danrlei.

Impressão errada. Quando Ademir Maria sofreu lesão durante excursão à Itália, em agosto, já com o time comandado por Felipão, Danrlei viajou às pressas para a reserva de Heuser. Quando este sentiu o púbis, na véspera do último jogo da gira, contra o Cagliari, a chance chegou.

– Felipão me disse: meu filho, é a oportunidade da tua vida. Vais ter que jogar. Não te assusta.

Danrlei fechou o gol, o Grêmio empatou em 1 a 1 com o Cagliari — o único jogo sem derrota da excursão — e, empolgado, o presidente Fábio Koff pagou ao grupo bicho de vitória.

Na volta, no aeroporto de Roma, Felipão chamou o goleiro para uma conversa reservada.

— Me disse para jogar com seriedade que o resto seria com ele. Nunca mais saí do time — recorda Danrlei, que atuou pelo Grêmio em 594 jogos oficiais.

 

 

Os f ilhos do Grêmio

DANRLEI

LUCIANO

Não fossem as seguidas lesões musculares de Luciano, o Grêmio não teria pensado na contratação do paraguaio Rivarola para a segunda fase da Libertadores. Prata da casa, tendo chegado à escolinha com apenas 10 anos, Luciano já atuava como profissional em 1990, no time de Evaristo de Macedo. Emprestado ao Aimoré no ano seguinte, ajudou o clube de São Leopoldo a retornar à Série A e voltou ao Grêmio em 1992 para disputar o Gauchão.

— O Grêmio sempre teve a tradição de contratar zagueiros. Em 1993 e 1994, eu concorria com Geraldão, Agnaldo, Paulão. Era difícil para mim — recorda.

Quando Paulão e Agnaldo foram vendidos, no começo de 1995, Luciano restou como um dos poucos zagueiros disponíveis para a Libertadores. A direção, por isso, apressou-se em trazer Adilson e os dois formaram dupla durante toda a primeira fase e as oitavas de final, em dois jogos conta o Olimpia. Foi quando uma lesão muscular afastou Luciano e Rivarola assumiu o posto.

A volta aconteceu na final, dia 30 de agosto. Felipão precisava reforçar a marcação e o colocou no lugar de Arilson nos minutos finais. Ainda que as lembranças de Medellín sejam fortes, é dos jogos no Olímpico que Luciano, hoje coordenador da categoria de base Grêmio, mais sente falta.

— Da concentração, a gente via o torcedor chegando. Aquilo já ia nos envolvendo com a partida. A sintonia com a torcida era perfeita. Parecia  um combustível que nos alimentava. Era muito difícil para qualquer clube nos bater no Olímpico.

Ao todo, foram 279 jogos com a camisa do Grêmio, até ser vendido ao Stardard Liége, da Bélgica, em 1997.

 

 

ROGER

Tu deves ser muito bom para subir mesmo machucado — comentou o médico Márcio Bolzoni ao enxergar o júnior Roger, 18 anos, deitado em uma das macas do departamento médico, em tratamento para dores no púbis.

Era novembro de 1993, o lateral esquerdo Branco já comunicara à direção que não ficaria e a reposição, indicada por Zeca Rodrigues, auxiliar de Felipão, era Roger. Mas seria preciso apressar sua recuperação, tarefa confiada a Bolzoni.

Entre junho de 1992, quando chegou para testes nos juvenis, e final de 1993, época da promoção aos profissionais, Roger seguiu disputando torneios de várzea nos gramados do Tamandaré, Parcão e Mont Serrat.

— Rodei em todos os campos da várzea da cidade. Isso, certamente, agravou o problema no púbis. Quando subi, Cacalo me proibiu de disputar esses torneios — conta.

Como Carlos Miguel começou o ano como lateral improvisado, Roger só estrearia nos profissionais em 10 de abril de 1994, contra o Esportivo, na Montanha, pelo Gauchão. Jogou os 90 minutos e cumpriu bem a tarefa de marcar Luciano André, o veloz ponteiro do time de Bento Gonçalves, conforme avaliação de Zero Hora no dia seguinte. Até o final de 2003, as raras vezes em que saiu do time foi por lesão.

Na final da Libertadores de 1995, o ex-lateral aprendeu uma lição que, hoje, como treinador, cuida de passar aos mais jovens. Sentindo-se culpado pela jogada do gol do Nacional ter iniciado do seu lado, Roger, com o olhar, buscou o apoio de jogadores mais experientes. Que chegaria pela voz fina de Luís Carlos Goiano, quase inaudível dentro do estádio lotado.

 

 

CARLOS MIGUEL

Carlos Miguel também era só um garoto, mas já contava com uma boa milhagem de Grêmio na decisão da Libertadores. Começou a receber chances em 1992, ainda na transição da base para o profissional. Na época, o técnico era Ernesto Guedes, que o relacionou até para uma excursão por Nicarágua e Honduras.

— Ficava naquele sobe-desce e ia ganhando experiência — conta.

Com menos de 20 anos, Carlos Miguel participou de três partidas da campanha na Série B. Era um raro talento em uma equipe de qualidade modesta, montada com escassos recursos financeiros.

Em 1993, já promovido, participou da pré-temporada e foi lateral esquerdo durante todo o Gauchão. Primeiro, com o técnico Sérgio Cosme, que havia chegado do Rio no início do ano, junto com o preparador físico Paulo Paixão. Depois, com Cassiá, comandante da equipe na conquista do Gauchão, mas que cairia por problemas de relacionamento com alguns jogadores. Já com Felipão, que voltava ao clube depois da passagem inicial em 1987, ainda atuou algumas partidas como lateral, até virar meia em meio ao Brasileirão e consagrar-se como um dos melhores armadores do país.

— Não deixei mais o time até 1997 — recorda.

Naquela temporada, marcada pela conquista do tricampeonato da Copa do Brasil, teve início o desmanche do grupo que havia vencido quase tudo durante a década. Carlos Miguel, por exemplo, foi vendido ao Sporting, de Portugal.

 

ARÍLSON

Acampanha também contou com um guri criado fora da Capital. A goleada de 7 a 0 que o Grêmio aplicou no Esportivo, pelo Gauchão de 1993, no Olímpico, não ofuscou o brilho de um guri de 19 anos, meia-esquerda do time de Bento Gonçalves. No dia seguinte, a atuação de Arilson mereceu elogios do colunista Lauro Quadros, de Zero Hora, e influenciou em sua contratação por empréstimo para atuar nos juniores do Grêmio.

A partir daí, a história ganha velocidade. Quando o time embarcou para uma excursão a Bangkok, no início de 1994, Arilson foi um dos meninos da base recrutados por Felipão. À vontade, como se ainda jogasse na velha Montanha, do Esportivo, converteu uma das cobranças contra o Ajax, na decisão por pênaltis do terceiro lugar do torneio da Copa do Rei da Tailândia.

Na volta ao Brasil, Arilson desembarcou durante a conexão em São Paulo e completou o grupo que disputava a Taça São Paulo. Expulso aos cinco minutos da partida contra o Nacional, chorou e temeu ser mandado embora.

 No início de 1995, sem contrato, ficou de fora das primeiras partidas da Libertadores, contra Palmeiras, Emelec e El Nacional, ambos do Equador. Renovou e retornou na quarta rodada, de novo contra o Palmeiras, para não sair mais da equipe.

— Na decisão contra o Nacional, o pessoal ainda  vivia aquele clima da morte do Pablo Escobar. Era policial de metralhadora por tudo que é lado. Comentei com Carlos Miguel: "vão nos matar aqui".

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