Exilada

para proteger os filhos

Agredida pelo companheiro durante anos, foi no abrigo Viva Maria que Rosane sofreu a maior pancada. Em uma conversa ao pé do ouvido, o filho de 11 anos contou para a mãe que era espancado pelo padrasto na ausência dela.

— Mãe, quando tu saía, ele batia de facão, me dava de fio. Quando subia os vergão, ele botava gelo para tu não notar — confessou a criança.

Após a revelação, Rosane chorou por dias consecutivos. Ela já tinha conhecimento das humilhações que o garoto e os três irmãos sofriam e do medo que sentiam do padrasto, mas só se deu conta da gravidade da violência com a reaproximação com os pequenos que o exílio lhe proporcionou.

— Meu filho contou para um amiguinho que eu não gostava dele. Tô tentando mostrar para eles que eu gosto — lembra, com a cabeça baixa e um tique nervoso, a boca puxando sempre para o mesmo lado.

Certa vez, o mesmo filho de 11 anos entrou no quarto do casal para falar com a mãe. Foi recebido com um tapa na lateral do rosto. Ficou dias sem conseguir ouvir daquele lado. O mais comum, entretanto, eram os xingamentos.

— Tu é vagabundo. Tu vai ser ladrão, porque tu é analfabeto — berrava o agressor para os meninos, todos com idade entre sete e 13 anos. — Mortos de fome, parem de comer — dizia nas refeições e mandava a mulher retirar a comida da mesa.

Soropositiva, com depressão, bipolar e esquizofrênica. Assim Rosane se descreveu ao dar entrada no abrigo. Disse que suportava a situação de violência que sofria na casa do então companheiro porque não tinha para onde ir.

— Quantas vezes a gente pegou as coisas, botou na mochila e saiu para a rua, mas acabava voltando, por causa de fome — conta, chorando.

Foi uma professora dos filhos que percebeu a gravidade da situação, a partir dos hematomas e da dificuldade de aprendizado das crianças, e chamou Rosane para conversar. Orientou que ela procurasse o Centro de Referência de Assistência Social (Cras). Lá, lhe ofereceram a opção do abrigo.

— Eu estava num buraco. Agora sei que tenho pessoas com quem contar.

Passados três meses e uma semana desde que entrou na Casa, Rosane ainda tenta encontrar um novo rumo. Tem o aval do abrigo para permanecer mais tempo até reunir as condições necessárias para caminhar sozinha. Enquanto isso, o agressor segue livre, vivendo com outra mulher, grávida dele.

— Aqui não é a minha casa, mas pelo menos os meus filhos estão aprendendo a ser criança.

A previsão é de que deixe o exílio somente no final de fevereiro, quando terá a reserva financeira para alugar uma casa. É tudo o que sonha para o futuro: um teto para os quatro filhos.

 

Exiladas pela violência:

a casa invisível

Rosane:

exilada para proteger os filhos

Paula:

exilada pela

tortura psicológica

Giovana:

exilada pelo ciúme