Caso Rubens Paiva: os arquivos do DOI-Codi

Há 13 anos, Zero Hora publicava

série de reportagens que comprovou

o envolvimento das Forças Armadas

no sequestro e desaparecimento do

ex-deputado federal Rubens Paiva,

tema do filme Ainda Estou Aqui,

que concorre ao Oscar 2025.

Ainda Estou Aqui, um drama político brasileiro baseado em fatos reais, disputa três estatuetas do Oscar neste domingo (2), nas categorias de Melhor Filme, Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz, com Fernanda Torres. O longa-metragem retrata a luta da advogada Eunice Paiva (papel de Fernanda) para desvendar o sequestro de seu marido, Rubens Paiva (interpretado por Selton Mello), pela ditadura militar brasileira (1964-1985) e a gangorra emocional que a família enfrentou.

Paiva foi deputado federal pelo PTB, celebrizado pela oposição forte ao regime militar que derrubou o presidente João Goulart (PTB) em 1964. Com direitos políticos cassados pela ditadura em 1968, se aproximou de organizações de esquerda. Em 1971, no auge do período repressivo, desapareceu na cidade onde morava, o Rio de Janeiro. Jamais foi encontrado.

A versão oficial das Forças Armadas é de que o ex-deputado foi buscado em casa em 20 de janeiro de 1971 por militares do serviço secreto da Aeronáutica. Quando era conduzido para interrogatório, o veículo que estava (um Fusca) teria sido interceptado a tiros por guerrilheiros de esquerda, que o levaram. A narrativa sempre foi contestada pela família, com base em testemunhos, inclusive de um médico legista ligado ao regime militar, que disse que Paiva foi mantido em cárcere nas dependências do Departamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) no Rio. Ele teria morrido numa sessão de tortura e sido esquartejado.

Montagem sobre fotos da cena do filme Ainda estou aqui e foto real de Rubens Paiva
Ainda Estou Aqui concorre em três categorias do Oscar 2025: Melhor Filme, Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz para Fernanda Torres, que atua ao lado de Selton Mello no papel de Rubens Paiva. (Montagem sobre fotos de Alile Dara Onawale/ Divulgação e Eduardo Simões/ Especial)

Como o corpo nunca foi encontrado, ficaram na história as duas versões. Até que, em 2012, Zero Hora levantou uma ponta nesse grau de mistério. Por meio da série de reportagens 'Os arquivos secretos do coronel do DOI-Codi', o jornal revelou que um oficial graduado do serviço de repressão política da ditadura militar guardava em casa, em Porto Alegre, provas do sequestro de Rubens Paiva pelas Forças Armadas - tinha as chaves do carro do deputado e também um documento de ingresso dele numa repartição militar. Esse oficial era o coronel da reserva do Exército Julio Miguel Molinas Dias, que morreu em tentativa de assalto na capital gaúcha em 2012. Ele integrava o DOI-Codi no Rio nos anos 1970 e 1980.

Ao vasculhar arquivos apreendidos por policiais na casa do militar, os repórteres de Zero Hora Humberto Trezzi, José Luís Costa, Marcelo Perrone e Nilson Mariano depararam com diversos documentos e objetos que elucidavam pontos obscuros da ditadura militar. Incluindo, além do desaparecimento de Rubens Paiva, a explosão de bombas no Riocentro, em 1981.

'Os arquivos secretos do coronel do DOI-Codi' rendeu a Zero Hora um dos mais significativos reconheciments da história do jornal: o Prêmio Esso de Jornalismo de 2013.

Veja, a seguir, as principais reportagens da série, publicadas em 2012.

Arquivos comprovam a prisão do político Rubens Paiva
Publicado em 22/11/2012

Um dos papéis mais procurados de um período sombrio da história do Brasil, uma folha de ofício amarelada e preenchida em máquina de escrever datada de janeiro de 1971, está guardado em um cofre do Palácio da Polícia Civil, em Porto Alegre. O documento confirma o envolvimento direto do Exército em um dos maiores enigmas do país protagonizado pelas Forças Armadas, cuja verdade é desconhecida até hoje.

É, até então, a mais importante prova material de que o ex-deputado federal, engenheiro civil e empresário paulista Rubens Paiva, desaparecido há 41 anos, vítima-símbolo dos anos de chumbo, esteve preso no Departamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) no Rio de Janeiro, um dos mais temidos aparelhos de tortura do país.

O corpo de Paiva nunca foi localizado, e o Exército jamais admitiu responsabilidade sobre o sumiço do político cassado pela ditadura militar (1964 a 1985). Durante quatro décadas, o documento fez parte do arquivo particular do coronel da reserva do Exército Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos. Gaúcho de São Borja, o coronel foi chefe do DOI-Codi do Rio, cerca de 10 anos depois do desaparecimento. Em 1º de novembro de 2012, Molinas Dias foi assassinado quando chegava de carro em sua casa, no bairro Chácara das Pedras, na capital gaúcha. Seria uma tentativa de roubar o arsenal que o coronel colecionava (cerca de 20 armas) ou um assassinato por razões ainda desconhecidas - a polícia investiga o caso. Em meio a um conjunto de papéis com o timbre do Ministério do Exército, parte deles com o carimbo "Reservado ou Confidencial", o documento referente à entrada de Rubens Paiva no DOI-Codi foi arrecadado pelo delegado da Polícia Civil Luís Fernando Martins de Oliveira, responsável pela investigação da morte do militar.

Documento referente à entrada de Rubens Paiva no DOI-Codi
Documento referente à entrada de Rubens Paiva no DOI-Codi, no Rio de Janeiro, sob o título "Turma de Recebimento". Aviso escrito à mão pede "cautela". (Montagem sobre fotos de Ronaldo Bernardi/ Agencia RBS e Reprodução)

Zero Hora acompanhou a coleta e folheou parte dos papéis. O delegado evitou divulgar o conteúdo, mas afirmou que a documentação em nada compromete a trajetória profissional de Molinas Dias.

— Pelo que consta ali, já descartamos a hipótese de o coronel ter sido morto por vingança em razão da atividade no Exército - garantiu o delegado. Sob o título "Turma de Recebimento", o ofício contém o nome completo do político (Rubens Beyrodt Paiva), de onde ele foi trazido (o QG-3), a equipe que o trouxe (o CISAer, Centro de Inteligência da Aeronáutica), a data (20 de janeiro de 1971), seguido de uma relação de documentos, pertences pessoais e valores do ex-deputado. Na margem esquerda do documento, à caneta, consta uma assinatura, possivelmente de Paiva.

O termo de recebimento dos objetos é chancelado em 21 de janeiro de 1971 pelo então oficial de administração do DOI-Codi, cujo nome é ilegível no documento. É possível que seja o mesmo capitão que, em um pedaço de folha de caderno (também guardado por Molinas Dias), escreveu de próprio punho, em 4 de fevereiro de 1971, que foram retirados pela Seção de Recebimento "todos os documentos pertencentes ao carro" de Paiva que tinha sido levado para o DOI-Codi.

radialista Elmo Sanchotene Marques
O radialista Elmo Sanchotene Marques entrevista o comandante Julio Miguel Molinas Dias. (Pavoni/Divulgação)

Em visita à 14ª Delegacia da Polícia Civil de Porto Alegre, na semana passada, integrantes da Comissão Nacional da Verdade - criada pelo governo federal para investigar crimes na ditadura - solicitaram uma cópia dos documentos, que deverá ser remetida a Brasília nos próximos dias.

O documento também interessa, e muito, ao promotor Otávio Bravo, que atua junto à Justiça Militar no Rio. No ano passado, ele reabriu a investigação do caso Rubens Paiva, após o Brasil ratificar em convenção internacional o compromisso de apurar casos de desaparecimento forçado, como ocorreu com Paiva.

— Vou requisitar o documento. Não tenho conhecimento dele. Pode ser mais um indício para apurar a verdade e de que ele (Paiva) morreu no DOI-Codi - afirmou.

Segundo Bravo, até então, a informação mais contundente sobre a passagem de Paiva pelo DOI-Codi carioca se limita a relatos verbais, entre eles o de Maria Eliane Paiva, uma das filhas do ex-deputado. Aos 15 anos, ela foi levada ao DOI-Codi para ser interrogada no dia seguinte à prisão do pai. Passadas quatro décadas, ao depor pela primeira vez sobre o caso perante o promotor, Eliane disse que ouviu de um soldado que Paiva foi morto após ser espancado no DOI-Codi.

— É a única prova que tenho de que ele foi para lá. O documento pode dar credibilidade aos depoimentos - diz Bravo.

O COMPROVANTE


Leia as informações presentes no ofício que confirma a prisão de Rubens Paiva no DOI-Codi no Rio

MINISTÉRIO DO EXÉRCITO

PRIMEIRO EXÉRCITO

DOI

TURMA DE RECEBIMENTO

Nome: Rubens Beyrodt Paiva

Local: Encaminhado pelo QG-3

Data: 20.01.71

Equipe: CISAer

I - DOCUMENTOS PESSOAIS

Um cartão de identificação do contribuinte

Dois cartões de piloto privado

Um cartão do DINERS CLUB

Uma carteira nacional de habilitação

Uma carteira profissional do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura

II - PERTENCES PESSOAIS

Um porta notas de couro preto

Quatro cadernos de anotações

Um chaveiro com cinco chaves

Uma fita de gravador

Um lenço branco

Uma gravata

Um cinto de couro preto

Um paletó

14 livros de diversos autores

Uma observação manuscrita: dois cadernos de anotações encontram-se com o major Belham
(devolvidos os cadernos)

III - MATERIAIS DIVERSOS

Não há

IV - Publicações

Não há

V -ARMAMENTO E MUNIÇÃO

Não há

VI - VALORES

Uma caneta esferográfica de metal branco

Uma caneta esferográfica branca e cinza

Um relógio de metal branco marca Movado

Uma peça de metal amarelo

VII - DINHEIRO

CR$ 260,00 (duzentos e sessenta cruzeiros)

Na margem esquerda, à caneta, consta uma assinatura, possivelmente de Rubens Rubens Beyrodt Paiva

Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 1971 Oficial de Administração do DOI


Fotos de Rubens Paiva
Rubens Paiva foi deputado federal pelo PTB, celebrizado pela oposição forte ao regime militar que derrubou o presidente João Goulart (PTB) em 1964. (Eduardo Simões/ Especial)

Arquivos revelados: saiba o que está por trás da história de Rubens Paiva
Publicado em 22/11/2012

Documentos revelados por Zero Hora comprovam que o ex-deputado federal (PTB-SP) Rubens Paiva foi preso por militares e levado ao Departamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) no dia 20 de janeiro de 1971. A história do político pode ajudar a desvendar alguns dos mistérios ainda escondidos nos porões da ditadura militar.


Documento oficial de Rubens Paiva
Documento oficial de Rubens Paiva. (Félix Zucco/ Agencia RBS)
  • Veja os fatos que marcaram a vida de Paiva e seus desdobramentos nos últimos anos

  • Em 1962, é eleito deputado federal pelo PTB paulista.
  • Em fevereiro de 1963 participa de CPI para examinar as atividades do IPES-IBAD (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais e Instituto Brasileiro de Ação Democrática). A instituição financiava palestrantes e escritores que escreviam artigos avisando sobre a chamada "ameaça vermelha" no Brasil. A CPI apurou que militares, que depois se envolveriam na destituição de João Goulart, receberam dólares dos EUA.
  • Em 10 de abril de 1964, após a destituição de João Goulart, em 31 de março daquele ano, se torna um dos primeiros parlamentares cassados pelo Ato Institucional número 1. Fica nove meses exilado na Europa e retorna ao Brasil.
  • Entre a metade dos anos 1960 e o início da década de 1970, notabiliza-se pela luta em defesa das liberdades individuais e pela restituição da democracia no país. É monitorado por supostamente trocar cartas com exilados brasileiros no Chile.
  • No dia 20 de janeiro de 1971, é visto pela última vez ao ser preso em sua casa no Leblon, Rio de Janeiro. Seu desaparecimento torna-se um dos símbolos da ditadura.
  • Em 1979, ao comentar a decisão do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) de declarar encerrados o caso de Rubens Paiva e de mais 47 desaparecidos, a mulher do ex-deputado, Eunice Paiva, destaca que "o governo confessou o crime mais uma vez, como o confessou ao promulgar a lei da anistia, com o artigo que admite a hipótese de pessoas desaparecerem pelo fato de estarem em atividades políticas".
  • Em 1987, o médico Amilcar Lobo, que trabalhava no DOI-Codi, afirma em entrevista à Revista IstoÉ ter visto e atendido Rubens Paiva. Ele declara que Rubens "era uma equimose só".
  • Em 1992, à Revista Veja, o ex-sargento Marival Dias Chaves do Canto informa que Paiva teria sido levado por um destacamento do I Exército para a casa de Petrópolis, onde acabou morto. Segundo Marival, os militares teriam usado o método de cortar o corpo aos pedaços e enterrar em locais diferentes.
  • Em 1996, a União pede a certidão de óbito de Paiva.
  • Em 1998, a Justiça determina que a União pague R$ 620 mil em sentença favorável à ação da família. Eunice, a viúva, não aceita e recebe apenas o atestado de óbito.
  • Em 1999, reportagem do Fantástico, da Rede Globo, conta que um soldado e um civil, informante dos militares, participaram de uma operação de ocultação de cadáver em 22 de janeiro de 1971 num terreno no Alto da Boa Vista, Rio de Janeiro. O corpo poderia ser o de Paiva. Após escavações no terreno, nada foi encontrado.
  • Em 2001, a Justiça assegura indenização por dano moral e material à família. A União é condenada a pagar R$ 3 mil, multiplicados pela expectativa de vida, acrescidos das despesas que a família teve tentando encontrá-lo e 350 salários mínimos para a mulher e os cinco filhos. Eunice ganha seguro de vida e pensão vitalícia do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).
  • Em março de 2004, em entrevista à TVCOM, o ex-presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Aloísio Lorscheider, diz que a Igreja suspeitava de que o ex-deputado tivesse sido executado e seu corpo jogado ao mar.

Coronel tinha cartilha com orientações para serviços de espionagem
Publicado em 25/11/2012

Entre o acervo do DOI-Codi que o coronel Julio Miguel Molinas Dias mantinha em sua residência, em Porto Alegre, está uma cartilha orientando como militares do serviços de inteligência e espionagem deveriam se comportar no dia a dia para evitar eventuais atentados de "subversivos".

coronel Molinas Dias
Gaúcho de São Borja, o coronel Molinas Dias foi chefe do DOI-Codi do Rio, cerca de 10 anos depois do desaparecimento de Rubens Paiva. (Emílio Pedroso/ Agencia RBS)

O documento indica que as medidas de segurança foram compiladas e distribuídas aos militares após Carlos Marighella lançar um minimanual da guerrilha urbana, em 1969.

São 57 recomendações denominadas "medidas de segurança" distribuídas em 10 páginas. Veja algumas delas:

  • A pé

  • Evitar andar desarmado e NUNCA use a arma de modo ostensivo.
  • Jamais tente, por conta própria, dar uma cana (prender alguém). Caso a situação exija, chame a polícia ostensiva.
  • Porte apenas documentos necessários a sua identificação, JAMAIS use o quente e o frio (documentos) ao mesmo tempo.
  • No automóvel

  • Não use e nem deixe armas no porta-luvas.
  • Antes de entrar no veículo, faça inspeção geral quanto à possível violência nas portas, vidros, etc...
  • Nas paradas obrigatórias em sinais de trânsito ou nos engarrafamentos procure ficar atento a quem se aproxima.
  • Evite nestas ocasiões ouvir música e namorar.
  • Na residência

  • Sendo possível, use cães de guarda.
  • Instrua familiares e empregados para não entregar objetos ou volumes a estranhos que se apresentarem verbalmente em seu nome.
  • Nas residências térreas é conveniente instalar alarmes.
  • Nas residências em prédios de apartamentos, nunca confie inteiramente em porteiros ou vigias. Eles podem ser subornados ou mesmo dominados.
  • Medidas de segurança em bares e restaurantes

  • Nunca permaneça de costas para rua.
  • Procure ocupar mesa junto à parede dos fundos, de modo a não ficar de costas para estranhos.
  • Não exceder no consumo de bebida alcóolica.
  • Procure não se tornar NOTADO pelos demais.
  • Evite se tornar frequentador assíduo e muito conhecido, principalmente em locais de aperitivos.
  • Em bancos, casas comerciais, etc...

  • Não portar cheques em branco previamente assinados.
  • Em supermercado, não coloque sua capanga ou bolsa contendo arma, dinheiro e documentos dentro do carrinho de compras.
  • Em transportes coletivos

  • Procure sentar-se nos últimos bancos quando viajar de ônibus, e próximo às portas quando for de trem.
  • Em ônibus interurbanos nunca coloque na mala a capanga, bolsa ou casaco contendo armas, documentos ou dinheiro fora do seu alcance. Lembre-se que poderá dormir e acordar sem seus pertences.

A manobra militar no atentado do Riocentro
Publicado em 25/11/2012

Documentos encontrados na casa de coronel assassinado em Porto Alegre revelam como o Exército se articulou para ocultar a autoria das explosões que tinham como alvo o show com cerca de 20 mil pessoas no Rio de Janeiro, em 1981

Missão Nº 115. Esse era o nome oficial da vigilância desencadeada pelos serviços de espionagem do Exército no centro de convenções Riocentro, no Rio, em 30 de abril de 1981, quando 20 mil pessoas ali se reuniam para um show musical em protesto contra o regime militar. Duas bombas explodiram lá, e os agentes "supervisores" da ação foram as únicas vítimas do episódio, que lançou suspeitas sobre atividades terroristas praticadas por militares e mergulhou em agonia uma ditadura que vinha desde 1964 e acabaria sepultada em 1985.

Tudo isso a população brasileira já intuía, por meio de depoimentos. O que até agora permanecia oculto - e está sendo revelado por Zero Hora, em primeira mão - são registros de militares envolvidos no episódio e manobras de abafamento do incidente, arquitetadas por servidores da repressão.

O segredo está em arquivos que eram guardados em casa pelo coronel reformado do Exército Julio Miguel Molinas Dias _ assassinado aos 78 anos, em 1 º de novembro, em Porto Alegre, vítima de um crime ainda nebuloso. Molinas Dias era, na época do atentado, comandante do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI- Codi) do Rio de Janeiro, conhecido como Aparelhão.

O arquivo do coronel continha 200 páginas, várias delas encabeçadas pelo carimbo "confidencial" ou " reservado". O calhamaço evidencia que o aparelho repressivo militar tentou maquiar o cenário do Riocentro para fazer com que as explosões parecessem obra de guerrilheiros esquerdistas. Os registros estavam guardados pelo minucioso oficial. A unidade comandada por Molinas era reponsável por espionar e reprimir opositores ao regime militar. O DOI- Codi era localizado dentro do 1 º Batalhão de Polícia do Exército, na Rua Barão de Mesquita, no bairro da Tijuca.

Ao se aposentar, o coronel levou para casa documentos preciosos, contando pormenores da sigilosa rotina da caserna. O dossiê deixa transparecer que a bomba no Riocentro também fez estragos dentro da sede do DOI- Codi, distante 30 quilômetros do centro de eventos. Em meio aos papéis, surgem evidências de que oficiais forjaram fatos. Há inclusive uma orientação para simular o furto do veículopertencente ao sargento que morreu na explosão, no sentido de desaperecer com pistas que seriam comprometedoras.

Atentado no Riocentro
Atentado no Riocentro foi um dos episódios mais emblemáticos da ditadura militar. (Ricardo Chaves/ Arquivo Pessoal)

O acervo de Molinas foi arrecadado pela Polícia Civil gaúcha após o assassinato dele e revela detalhes inéditos do lado de dentro dos portões de uma das mais temidas unidades das Forças Armadas durante os anos de chumbo.

ZH teve acesso a memorandos datilografados e também manuscritos, nos quais o coronel registra a mobilização que se instalou naquele quartel-sede da espionagem política do Brasil, imediatamente após a explosão. São ordens, contraordens e telefonemas com a finalidade de evitar que fatos e versões indigestas ao Exército viessem à tona. Os papéis contêm medidas de prevenção para segurança de militares, recomendações para não serem fotografados e relação de bombas e artefatos explosivos no paiol do quartel para destruição coletiva e individual.

Mas o mais espesso lote de documentos do coronel é do tempo em que ele dava as ordens no comando do DOI- Codi. De próprio punho, o coronel Molinas teria redigido parte desses memorandos, divididos em dias, horas e minutos. Trabalho facilitado porque era detalhista. Um verdadeiro soldado espartano. Em meio à papelada sobressaem-se relatórios sobre o desastroso atentado no centro de convenções Riocentro. Uma das duas bombas que explodiram durante um show musical acabou matando o sargento Guilherme Pereira do Rosário e ferindo com gravidade o capitão Wilson Luiz Chaves Machado, chefe da seção de Operações do DOI- Codi.

Os papéis do coronel Molinas mostram que Rosário tinha o codinome de Agente Wagner e Wilson era chamado Dr. Marcos (militares de baixa patente eram chamados de agentes e oficiais eram doutores, na gíria da espionagem).

Veja o cronograma e as anotações do coronel sobre o caso Riocentro
Publicado em 25/11/2012

De próprio punho, Molinas Dias redigiu memorandos divididos em dias, horas e minutos

Zero Hora teve acesso a memorandos datilografados e também manuscritos do ex-comandante do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), Julio Miguel Molinas Dias, no qual o coronel registra a mobilização que se instalou naquele quartel-sede da espionagem política do Brasil, imediatamente após a explosão do Riocentro.

São ordens, contraordens e telefonemas com a finalidade de evitar que fatos e versões indigestas ao Exército viessem à tona. O coronel Molinas redigiu parte desses memorandos, divididos em dias, horas e minutos. Leia o diário:

A BOMBA

Quinta-feira, 30 de abril de 1981

O relatório de atividades externas do DOI-Codi do Rio descreve a movimentação da unidade naquele 30 de abril de 1981. Batizada de Missão 115 - Operação Centro, a ação previa que os militares fizessem a espionagem do show no Riocentro, celebração do Dia do Trabalhador, que virou manifesto contra a ditadura. Foram escalados dois agentes, com previsão de saída às 18h40min e retorno às 4h20min, usando um Fusca. Outros dois, de forma clandestina, usaram um Puma particular. Por volta das 21h15min, tudo seguia na rotina até uma bomba explodir no Puma em que estavam os dois integrantes do DOI-Codi. À noite, de próprio punho, o coronel Julio Miguel Molinas Dias, comandante do DOI-Codi, fez o relato de como foi informado do atentado. Ele assistia, em casa, à primeira partida da final do Campeonato Brasileiro de 1981, no Estádio Olímpico, vencida pelo Grêmio por 2 a 1.

"Intervalo do jogo do Grêmio x São Paulo, telefonema do agente Reis (codinome de um militar). Disse que um cabo PM telefonara avisando que haveria um acidente com explosivo com uma vítima. Deu o nome quente Dr. Marcos..."

Doutor Marcos era o codinome do capitão Wilson Luiz Chaves Machado, chefe da Seção de Operações do DOI-Codi, ferido na explosão. O relato do coronel Molinas continua, falando de como foi informado da morte do sargento Guilherme Pereira do Rosário, ao manipular a bomba:

"(...) Por volta das 22h30min, cheguei ao órgão... dirigi-me à vaga n.1 do comando. (...) O Dr. Wilson (codinome de outro agente), que estava na operação, chegou logo a seguir. O agente Reis, que já chegara, avisou que recebera outro telefonema do mesmo elemento, dizendo que um sargento estava no local, irreconhecível."

A partir daí, o coronel anota, minuciosamente, como foi a longa noite pós-atentado:

"23h30min - O Globo (talvez referindo-se à notícia que ouviu na Rádio Globo ou na TV) - estouraram duas bombas no estacionamento, destruindo dois carros e uma moto. No segundo carro não houve vítimas. 23h30min - Dr. Araújo (codinome de oficial) telefona para saber o que houve. Molinas relata o estado de saúde do capitão Wilson, motorista do Puma e ferido na explosão: 23h30min - Hospital Miguel Couto...Tá sendo operado, vísceras do lado de fora. Estado grave. De próprio punho, o coronel registra que foram dois os explosivos levados para o Riocentro: 23h35min - Uma bomba na casa de força (central de energia do Riocentro) e uma no carro.

Às 23h45min, Molinas afirma ter telefonado ao coronel Leo Frederico Cinelli, chefe do serviço de inteligência do 1º Exército, relatando os fatos. Minutos depois, recebe notícias de alguém sobre o sargento morto e registra:

"23h50min - O Robot (menção a quem carrega bomba) está morto. Tem uma granada que estava no carro e botaram no chão."

Sexta-feira, 1º de maio de 1981

As anotações de Molinas prosseguem madrugada adentro. Ele trata da remoção do corpo do sargento para o hospital:

"0h40min - Coronel Cinelli - Falamos sobre a ida da perícia da PE (Polícia do Exército) à paisana e a retirada do corpo. 1h01min - Tenente-coronel Portella liga ao HCE (Hospital Central do Exército) para receber o corpo do Robot (sargento Rosário)."

À 1h05min, Molinas recebe ligação de uma pessoa, à qual identifica com Dr. Rodolfo, atualizando notícias sobre o capitão Wilson Machado, ferido na explosão:

"1h05min - Está sendo operado, dilaceração nas vísceras. A partir daí, as anotações se tornam esporádicas: 4h24min - Um Chevette aberto cinza metálico com bagageiro placas RT-1719 estava ao lado do carro Puma, com um emblema do 1º BPE. 6h05min - Justifico telefonema dizendo que está na cirurgia, Dr. Marcos (codinome do capitão ferido), ortopédica nos braços. 17h - Fui para casa."

Sábado, 2 de maio de 1981

Molinas retorna ao DOI-Codi e manda recado ao capitão ferido para que não se pronuncie a respeito do acidente:

"8h30min - Chegada ao destino (...)Transmitida mensagem ao Dr. Marcos (codinome do capitão ferido) para não fazer esforço para falar, tranquilizando-o. (...) Comandante do DOI e comandante do 1º Exército foram para o enterro e hospital. Foi dada ordem para oficial de permanência ficar em tempo integral no DOI."

A FARSA

Ainda no dia 2, um manuscrito com letra diferente à do coronel Molinas Dias revela uma tentativa de encobrir a autoria do atentado. Foi anotada (talvez por um ordenança do coronel) a necessidade de encontrar o carro particular do sargento morto e providenciar o seu recolhimento ao DOI-Codi. O objetivo pode ter sido evitar que material comprometedor, dentro do veículo, fosse apreendido pela Polícia ou fotografado pela imprensa:

Foi feito contato com a secretaria de segurança para localizar o carro do Wagner (codinome do sargento morto) e comunicar ao DOI (carro roubado). Existe uma equipe de sobreaviso para "puxar" (levar) o carro.

A anotação segue:

"Foi mandado ao 1º Exército (coronel Cinelli) as fotografias das placas com VPR para aproveitamento na imprensa."

A frase de Molinas Dias só ganhou sentido tempos depois, quando ex-integrantes da ditadura revelaram que agentes do DOI-Codi picharam placas de sinalização de trânsito nas imediações do Riocentro com a sigla da organização de luta armada de extrema esquerda Vanguarda Popular Revolucionário. O objetivo dos militares com a pichação era atribuir a autoria do atentado à VPR. Seria uma explosão planejada para botar a culpa em esquerdistas, como descreve o ex-delegado da Polícia Civil Cláudio Guerra no livro Memórias de uma Guerra Suja.

O coronel Molinas Dias avança seu memorando pelo dia 2 de maio, relatando supostas ameaças de bomba na casa do capitão ferido e no hospital Miguel Couto:

"13h01min - Família do Dr. Marcos (codinome do capitão) liga para o Dr. Carmelo (codinome de um oficial) no hospital e participa a existência de um embrulho suspeito na porta do apartamento. O Dr. Carmelo telefona ao Dr. Maurício (codinome), oficial permanente, que esta providenciando o deslocamento de uma equipe para o local. (...) sob o tapete da porta de entrada tem uma bolsa do Carrefour de material translúcido e dentro tinha dois pães, um inteiro e outro faltando um pedaço."

As supostas ameaças contra integrantes do DOI prosseguem ao longo do dia 2:

"16h10min - O delegado Tufic, da 14ª DP, telefona para dizer que recebeu dois telefonemas anônimos dando conta de que o capitão Paulo Renault iria jogar uma bomba no quarto do capitão hospitalizado. 16h18min - Telefonema para a residência do capitão Paulo Renault, que não atende. 16h20min - Ligação para a portaria do prédio que diz, possivelmente o capitão estaria viajando."

Conforme o blog do jornalista Ricardo Noblat, o capitão seria um Paulo Renault, engenheiro eletrônico, perito judicial e também ex-agente do Serviço Nacional de Informação (SNI). Em 2005, esteve envolvido no escândalo da CPI dos Correios. Estaria disposto a fazer revelações em depoimento à Justiça, mas desistiu ao ter a casa metralhada.

O dia 2 de maio de 1981 continua interminável, nas anotações de Molinas. Agora surge outra notícia de plano para matar o oficial ferido, talvez uma manobra para enfatizar que o capitão do DOI-Codi tinha sido vítima de um atentado

"16h45min - Dr. Wilson (codinome de oficial) liga dizendo que o pessoal do hospital acha bom chamar o plantão policial e a imprensa, dizendo que tinham conhecimento de um plano para eliminar o Dr. Marcos (o capitão ferido)."

E continuam as supostas ameaças no dia 2, tentando transformar o capitão de terrorista em vítima. Molinas pede segurança:

"22h25min - Telefonema do Dr. Marino (codinome de um oficial) avisando de um telefonema anônimo para o Hospital Miguel Couto, avisando que colocariam um petardo na casa do Dr. Marcos (capitão ferido). 22h30min - Telefonema para o o tenente-coronel Roberval e pede providências junto à PM."

Domingo, 3 de maio de 1981

Molinas anota telefonema recebido de um colega coronel:

"8h25min - Telefonema do coronel Prado, dizendo que o JB (Jornal do Brasil) tem reportagem em que um médico diz que o capitão estaria em condições de falar. O assunto é tratado com o coronel Cinelli."

Mais tarde, outro telefonema - ainda mais preocupante - fala que os agentes se tornam suspeitos de explodir a própria bomba que os feriu:

"15h50min - Agente Hugo (codinome de policial) liga dizendo que o segurança do Riocentro está comentando que o atentado seria nosso."

Para mudar o foco e jogar a culpa do atentado fracassado no Riocentro na esquerda, Molinas rascunha uma lista de incidentes anteriores, como a suposta tentativa de ataques a unidades militares. O texto é datilografado e enviado ao coronel Cinelli.

"Antecedentes - Viemos apresentar alguns fatos que comprovam a intenção das esquerdas em atingir os órgãos de segurança, em especial os DOIs, tanto no campo da agressão física como em ações psicológicas com objetivo único de desmantelar o aparato repressor ou destruí-lo. No final de 1980 ficaram encarregados de eliminar o Exmo senhor general Antônio Bandeira, no Sul do país... O atentado seria com risco da própria vida."

Molinas conclui:

"Face aos atos e fatos apresentados, somados a uma orquestração pela imprensa, acusando os DOIs como responsáveis por tudo que ocorre de mal contra as esquerdas (...) cada elemento do órgão passou a ser um alvo de justiçamento. (...) Quanto ao atentado em si, qualquer conclusão cairá no campo da especulação, correndo o risco de atentar contra a honra e a integridade de um oficial e de um sargento."

Segunda-feira, 4 de maio de 1981

O diário é recheado de documentos. Um deles, um ofício que chega ao DOI-Codi do coronel Luiz Antônio do Prado Ribeiro, encarregado do inquérito policial-militar (IPM) que investiga o atentado. Ele convoca o coronel Molinas Dias para depor às 14h do dia seguinte no 9º andar do Palácio Duque de Caxias, sede do comando 1º Exército.

Quinta-feira, 7 de maio de 1981

Uma relato datilografado informa que às 17h40min, o capitão ferido foi do CTI para a sala de radiografia. E aparece no CTI uma mulher, vestindo calça e jaleco branco, se dizendo médica, perguntando ao PM da segurança onde é o CTI. A mulher usa sapato verde e o PM desconfia dela. O crachá está virado e, ao desvirar, lê "visitante do IBGE". A mulher é levada para fora do hospital e embarca em uma Brasília do Jornal do Brasil.

Sexta-feira, 8 de maio de 1981

Documento confidencial relata um telefonema ao DOI-Codi, às 15h, repassando dados sobre uma mulher de nome Mariangela ou Ângela Capobianco e o local do trabalho do marido dela. O interlocutor descreve a mulher:

"Mais ou menos 45 anos, estatura média, meio gorda, cabelo pintado de caju. É importantíssima, está autorizada (muito cuidado). Trabalha na diretoria de vendas ou arrecadação".

Para entender: Ângela era uma diretora do Riocentro e, segundo livros sobre o tema, é suspeita de ter colaborado com os militares. Após afastar das funções o chefe de segurança do Riocentro, na noite do atentado, ela teria sido responsável pelo fechamento com cadeados da maioria dos portões de saída da área do show. A medida, em caso de explosão de uma bomba, poderia amplificar o número de vítimas.

Quarta-feira, 13 de maio de 1981

Documento afirma que, às 22h de 10 de maio, no bar do Hospital Miguel Couto um homem, em voz alta, acusa o DOI-Codi pelas bombas colocados no Riocentro e no jornal Tribuna da Imprensa. O homem e um amigo dele são levados para a 14ª DP. Lá são interrogados e liberados. São eles: José Augusto Alves Neto, da Rádio JB, e Carlos Vieira Peixoto Filho, do JB (jornal). Datado deste dia, um manuscrito contém duas perguntas e respostas atribuídas ao agente Guarany (amigo do sargento morto) sobre as habilidades com bombas do agente Wagner (codinome do sargento morto):

"Wagner é técnico em explosivos? Não Qual o curso ou estágio que fez: Nenhum. É um autodidata"

Quarta-feira, 20 de maio de 1981

Em um documento reservado, enviado ao chefe do serviço de inteligência do 1º Exército, Molinas comunica os nomes dos agentes do DOI-Codi escalados oficialmente para "cobrir" o show: sargento da Aeronáutica Carlos Alberto Henrique de Mello e o soldado da Polícia Militar Hirohito Peres Ferreira. O ofício afirma que o chefe da Seção de Operações, capitão Machado, e o sargento Rosário (os vitimados na explosão no Puma) foram ao Riocentro para supervisionar a equipe. Seria a primeira vez que o nome de Machado e Rosário aparece em um documento oficial como tendo participado da desastrada Missão 115.

Segunda-feira, 25 de maio de 1981

Documento confidencial encaminhado às unidades militares pelo comando do 1º Exército sob o título "Atentado Terrorista no Riocentro - informação 312/81" determina ponderação, serenidade e isenção diante de "notícias apresentadas por certos setores da comunicação sensacionalistas e alguns políticos, que muitas vezes não correspondem à verdade".

O documento afirma que o coronel Luiz Antônio do Prado Ribeiro, encarregado da investigação militar do atentado, foi substituído, pois está "baixado no HCE (Hospital Central do Exército) desde 18 de maio para observação, foi submetido à junta de saúde, cuja ata do exame recomenda que lhe sejam concedidos 30 dias de licença para tratamento de saúde".

Anos depois, viria a público a versão de que Ribeiro foi afastado do inquérito porque se recusara a acatar ordens superiores. Teria sido, inclusive, chantageado para reunir provas que apontassem grupos de esquerda como autores do atentado.

Foto do atentado no estacionamento do Riocentro
Na noite de 30 de abril de 1981, uma bomba explodiu em um Puma no estacionamento do Riocentro, em Jacarepaguá, durante show para uma plateia de 20 mil pessoas. (Ricardo Chaves/ Arquivo Pessoal)

Baú do coronel: entregues os documentos dos casos Rubens Paiva e Riocentro
Publicado em 28/11/2012

Durante mais de quatro décadas, a psicóloga Maria Beatriz Paiva Keller, 52 anos, não teve qualquer notícia sobre a circunstância do desaparecimento do pai, o ex- deputado federal, engenheiro e empresário paulista Rubens Paiva.

Ontem, ela teve acesso aos primeiros documentos que ajudam a elucidar o mistério e lançam luzes sobre um dos episódios mais sombrios da repressão.

Os papéis que Maria Beatriz recebeu, em solenidade no Palácio Piratini, na Capital, registram a entrada de seu pai no Destacamento de Operações e Informações – Centro de Operações de Defesa Interna ( DOI- Codi), no Rio, em 1971, e descrevem documentos apreendidos no veículo de Paiva.

Zero Hora torna públicos, em primeira mão, arquivos que lançam luz sobre o mistério que envolve a suposta presença do político no DOI-Codi e também sobre as explosões no Riocentro, dois dos episódios mais emblemáticos da ditadura militar (1964-1985).

Cópia do registro oficial da prisão de Rubens Paiva, em 1971
Cópia do registro oficial da prisão de Rubens Paiva, em 1971, foi entregue a Maria Beatriz Paiva Keller, filha do ex-deputado. (Mauro Vieira/ Agencia RBS)

Rubens Paiva entra no DOI-Codi

O mais impactante é o registro oficial da prisão do ex-deputado Rubens Paiva, no Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), no Rio de Janeiro, em 1971. O ofício amarelado, datilografado, descreve a entrada de Rubens Beyrodt Paiva no DOI-Codi. Ele foi transferido de um quartel da Aeronáutica, onde estava preso desde 20 de janeiro de 1971. O documento mostra o que foi apreendido no DOI-Codi pertencente ao ex-deputado. É a comprovação oficial de que Paiva entrou no quartel.

Ofício amarelado  a comprovação oficial de que Paiva entrou no quartel.
Ofício amarelado a comprovação oficial de que Paiva entrou no quartel. (Ronaldo Bernardi/ Agencia RBS)

Documento apreendido no carro de ex-deputado

Um manuscrito em folha de caderno revela que um capitão do Exército pegou todos os documentos do carro de Rubens Paiva, um Opel, em 4 de fevereiro de 1971. No mesmo dia, o veículo seria devolvido à família. Para a Comissão Nacional da Verdade, é um indício de que Paiva já estava morto. As investigações sobre as circunstâncias da provável morte será concentrada neste período.

Manuscrito mostra que um capitão do Exército pegou todos os documentos do carro de Paiva.
Manuscrito mostra que um capitão do Exército pegou todos os documentos do carro de Paiva. (Ronaldo Bernardi/ Agencia RBS)

Missão Nº 115, a farsa no Riocentro

A ordem de missão Nº 115 tinha caráter urgente. Uma equipe estava designada para a Operação Centro, às 21h de 30 de abril de 1981. Os agentes do DOI-Codi fariam a "cobertura do evento", no Riocentro, a partir das 21h.

Comandante informado do atentado

O coronel Molinas Dias registra em um formulário com timbre confidencial a placa do Puma OT-0297 e narra, de próprio punho, como recebeu a notícia da explosão, durante o intervalo do jogo Grêmio e São Paulo (primeira partida da final do Brasileirão de 1981, vencida pelo time gaúcho por 2 a 1). Relata: "Um acidente com explosivo com uma vítima. Deu nome quente do Dr. MARCOS - codinome do capitão Wilson Luiz Machado Chaves Machado, ferido na explosão dentro do carro".

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