Nascido para apitar. É assim que Leandro Vuaden, árbitro há 20 anos e no quadro da Fifa desde 2009, se apresenta. No currículo, soma 10 Gre-Nais. Ninguém comandou mais clássicos do que ele entre os árbitros em atividade. Partidas internacionais? Cerca de 35. Ao todo, entrou em campo mais de 800 vezes para fazer o que mais gosta.
A paixão vem de berço. É um dom, garante com firmeza. Andava de apito na boca quando guri, enquanto seus amigos se divertiam com dribles e gols. Uma vocação que o tornou um dos árbitros mais respeitados do Brasil e do mundo.
Em conversa com Zero Hora e Rádio Gaúcha, Vuaden, 41 anos, marido de Jaqueline e pai de Felipe, 19, e de Pedro, 9, falou da sua briga contra o peso, da jornada intensa de trabalho e da relação com a família. Posicionou-se sobre assuntos polêmicos, como o uso do recurso da imagem, a profissionalização da atividade e a censura após os jogos, já que árbitro é proibido de falar.
E tem, claro, as revelações surpreendentes, no mesmo estilo que o consagrou no futebol: sem interrupções e permitindo o confronto, deixando a bola rolar. Um aperitivo? O dia em que foi intimidado por um fanático que portava um revólver. Confira!
ENTREVISTA
Eduardo Gabardo, Diogo Olivier, Diori Vasconcelos e Kelly Matos
IMAGENS
Anderson Fetter, Bruno Alencastro, Lauro Alves, Aquirvo pessoal e Banco de Dados/Agência RBS
TEXTOS
Diogo Olivier e Renan Turra
ARTE
Diogo Perin
EDIÇÃO DE VÍDEOS
Andressa Machado e Marcelo Carôllo
EDIÇÃO DIGITAL
Vanessa Girardi
Eduardo Gabardo
Durante a conversa foi possível perceber o Vuaden muito tranquilo e descontraído. Parecia que estava em casa. Contou inúmeras histórias divertidas sobre a carreira, inclusive de erros que cometeu. Mas também teve momentos de seriedade, ao falar dos problemas e situações delicadas que envolvem a arbitragem. O resultado final foi um bate-papo com revelações interessantes e a oportunidade de conhecer com mais detalhes como funciona a vida de quem sofre com a rotina da pressão do futebol sem a estrutura adequada para desempenhar o trabalho.
Diogo Olivier
Confesso que me surpreendi. Vuaden mostrou, no pinga-fogo que foi nossa entrevista em determinados momentos, a mesma desenvoltura dos gramados. Não é fácil: é outro ambiente. Tenho uma medida para detectar profissionais confiantes de verdade, sem aquela falsa modéstia mais comum do que se imagina no futebol. Quem fala naturalmente sobre suas mancadas e erros é deste quilate. Não precisa provar mais nada, então pode se abrir. Foi o caso do Vuaden, que até agora deve estar pedindo desculpas pelo atraso. Chegou depois do horário marcado. O Diori deu cartão amarelo, mas ele foi até o final sem mais advertências. Saiu com o motoradio de melhor em campo.
Diori Vasconcelos
Leandro Vuaden é o árbitro mais experiente do Rio Grande do Sul e um dos mais rodados do Brasil. Além disso, tem grande capacidade de articular e expressar ideias. Essa entrevista comprovou a habilidade do juiz para a "resenha". Ao mesmo tempo em que não fugiu de nenhuma pergunta, Vuaden parecia um tanto quanto preocupado em medir as palavras. Um árbitro, dessa vez cercado por jornalistas, tentando repetir o desempenho do campo e controlar a partida. Nós estávamos ali justamente para tentar atrapalhar isso e até apatifar o jogo. Em menor proporção do que nos gramados, em alguns momentos Vuaden deixou o jogo correr. O resultado foram boas histórias e, quem sabe, algumas polêmicas.
Kelly Matos
Ele tem 10 Gre-Nais no currículo. E num dos papeis cuja responsabilidade é justamente a de não se tornar o protagonista. De arrependimentos? Não ter respeitado o próprio ritmo. Se pudesse voltar atrás, teria repetido aquilo que treinou para fazer. Sobre cobranças, guarda uma em especial: quando a esposa o chamou para ver o replay de uma partida com sua arbitragem. Um close de câmera e o tira-teima estava desfeito: estava acima do peso. Nem da corneta dos filhos ele escapa. Mas não tem importância, diz. Para quem almejou ser árbitro desde pequeno, chegar onde chegou é a certeza de um sonho realizado.
Na súmula
O relato dos entrevistadores
Esqueça o árbitro autoritário. Em casa, Vuaden admite: "Não mando nada." Em certa ocasião, tentou tomar as rédeas do lar comprando um tapete temático, capaz de simular um campo de futebol. Durou pouco. Outra vez, levou corneta do filho mais novo, que alertou sobre pênalti não marcado pelo pai.
O prestígio de estar no quadro da Fifa faz com que Vuaden viva exclusivamente da arbitragem - embora não desfrute de tudo aquilo que considera ideal para a categoria. Em um passado não muito distante, antes de comandar espetáculos em palcos como o Maracanã, Vuaden vivenciou situações primitivas. Na Segundona gaúcha, chegou a ser intimidado por um fanático que portava um revólver.
O confronto entre Grêmio e Inter, para Vuaden, é a grande vitrina para um árbitro: "Se você passar pelo Gre-Nal, ele abrirá portas para o Brasil todo. É uma referência".
E o primeiro clássico apitado por ele, em 2006, já valeu o título gaúcho. Mas antes do marcante embate, ele precisou se entender com a polícia rodoviária.
Vuaden transita por assuntos variados e não foge nem dos mais espinhosos — como o que pensa sobre o uso da imagem e a censura aos árbitros que não podem conceder entrevista após as partidas.
Há 7 anos com o escudo Fifa, Vuaden pode continuar no quadro da entidade até 2020. A insatisfação da Comissão de Arbitragem da CBF com árbitros que estariam "acomodados", porém, pode tirá-lo do grupo seleto no ano que vem. Se acontecer, garante que está preparado. E também toca em um assunto delicado como a ausência no Mundial do Brasil. Perdeu a concentração, recorda, e a chance de concretizar o sonho. Diz não guardar mágoas, mas admite: errou.
"Eu quero apitar Gre-Nal sempre"
"Todo o árbitro sonha em ter a carteira assinada"
"Quando eu sair da Fifa, sairei muito satisfeito"
"Alemão para fazer festa, basta uma ligação"
(Quando soube que seria árbitro Fifa)
"Estamos mais perto de ter o recurso da TV do que a liberdade para o árbitro falar (depois da partida)"
"A responsabilidade para dirigir um Gre-Nal ou um Fla-Flu é a mesma, mas a repercussão é outra. Dependendo da atuação do árbitro, do que acontecer, ele fica na história."
"Se eu fosse dirigente, faria o mesmo"
(Sobre declarações polêmicas em véspera de Gre-Nal)
"Se eu parar três dias (de fazer exercícios físicos), eu ganho dois quilos. Com 41 anos, o organismo já não responde como se fosse 20. E mais, com 20 anos, o churrasco era de costela e carne magrinha, agora está melhor (risos)."
"Já apitei, em 10 dias, cinco jogos. Imagina o desgaste? Hoje, apito domingo e quarta, domingo e quarta, e no quinto jogo quero folga. Senão, dá vontade de jogar o apito lá na arquibancada. Nem o som consigo ouvir"
"Há um exagero em depositar tanta responsabilidade na arbitragem. Como árbitro eu reconheço, tem equívocos, mas têm outras questões além dela."
"O jogador brasileiro tem uma característica diferente, muitas vezes ele induz o árbitro. Mas é só não cair. E nem sempre o árbitro vai ter respaldo. Dificilmente alguém compra briga pelo árbitro. É muito mais fácil comprar pelo jogador."
"Nós (árbitros) não somos inimigos do futebol. Nós queremos acertar como qualquer outra pessoa que está no meio".
"Eu sou um autônomo. Um prestador de serviços. Todo o árbitro sonha em ter uma carteira assinada e se dedicar da mesma forma do que um jogador."
Paixão pela arbitragem
"Pô, pai, aquilo ali foi pênalti!"
"Já teve cara batendo na minha porta com revólver"
Jogo aberto
Destaques da resenha
ENTREVISTA
Eduardo Gabardo, Diogo Olivier, Diori Vasconcelos e Kelly Matos
IMAGENS
Anderson Fetter, Bruno Alencastro, Lauro Alves, Aquirvo pessoal e Banco de Dados/Agência RBS
TEXTOS
Diogo Olivier e Renan Turra
ARTE
Diogo Perin
EDIÇÃO DE VÍDEOS
Andressa Machado e Marcelo Carôllo
EDIÇÃO DIGITAL
Vanessa Girardi