
Sufoco no fim do mês, angústia ao olhar o extrato bancário, ansiedade crescente diante da pilha de boletos. Essa é a realidade de 75,7 milhões de brasileiros endividados, segundo dados do Serasa divulgados em março deste ano.
Mais grave do que o endividamento comum, está o superendividamento — situação em que a pessoa já não consegue quitar suas dívidas sem comprometer o essencial para viver, como alimentação, moradia e saúde.
A boa notícia é que, por mais desafiadora que seja a situação, é possível sair do superendividamento. Mas, para isso, é preciso mais do que cortes de gastos: é necessário planejamento, orientação especializada e, muitas vezes, apoio de alguém de confiança.
O que é superendividamento?
Diferentemente do endividamento comum — quando uma pessoa contrai dívidas, mas ainda tem como pagá-las dentro do orçamento —, o superendividamento acontece quando a renda já não cobre nem os compromissos básicos.
— É quando o consumidor, mesmo querendo pagar, simplesmente não consegue sem abrir mão de necessidades fundamentais. E isso se agrava com juros abusivos, crédito fácil e falta de educação financeira — explica o educador financeiro Diego Angelos, da Dynamis Educação.
A primeira virada: pedir ajuda
A maioria das pessoas superendividadas demora a admitir a situação. Por vergonha, medo ou orgulho, seguem tentando manter as aparências — o que, segundo especialistas, é um dos maiores erros.
— Buscar ajuda é o passo mais difícil e mais importante. O superendividamento é um problema estrutural, e não uma falha individual — reforça Angelos.
É possível buscar apoio em canais públicos gratuitos de orientação e renegociação de dívidas, como os Procons, Defensorias Públicas, Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e até projetos de educação financeira vinculados a universidades e bancos.
Passo a passo para começar a reverter a situação
Confira abaixo as principais recomendações dos especialistas para quem precisa sair do superendividamento:
Faça um diagnóstico financeiro completo
Coloque no papel ou em uma planilha todos os seus ganhos, despesas fixas e variáveis e a lista completa de dívidas, com valores, prazos, taxas de juros e credores.
— Não dá para tratar o que não se vê claramente — resume Angelos.
Confira o planejador financeiro
Separe o que é essencial do que é negociável
Identifique os gastos indispensáveis (moradia, alimentação, saúde) e veja onde é possível cortar ou reduzir. Despesas com lazer, assinaturas digitais e delivery, por exemplo, podem ser pausadas temporariamente.
Evite novas dívidas e cuidado com “crédito salvador”
Pegar novos empréstimos para pagar dívidas antigas é uma armadilha perigosa, especialmente se o novo crédito tiver juros ainda maiores.
Também é importante evitar cartões de crédito, crediários e financiamentos enquanto não houver estabilidade financeira.
Renegocie com todos os credores
Com o diagnóstico em mãos, entre em contato com os credores para negociar condições reais de pagamento. A Lei nº 14.181/2021, chamada de "Lei do Superendividamento" permite a repactuação global das dívidas, inclusive com mediação judicial. Vale buscar programas como “Desenrola Brasil” e feirões de negociação.
Avalie a possibilidade de portabilidade de crédito
Caso você já tenha empréstimos com juros altos, avalie se é possível fazer a portabilidade da dívida para outra instituição com taxas menores. É um direito do consumidor garantido por lei.
Busque apoio emocional
O peso emocional do superendividamento é enorme. A vergonha paralisa, a ansiedade desgasta, e o isolamento agrava tudo.
— Ter alguém de confiança para ajudar na organização, acompanhar renegociações e oferecer suporte emocional faz muita diferença — afirma a psicóloga Denise Milk.
"Conhecimento é proteção"
Desde 2023, os bancos são obrigados a oferecer programas de educação financeira, conforme resolução do Conselho Monetário Nacional (Lei 14.690/2023).
— Conhecimento é proteção. Saber como funciona o crédito, os juros, os riscos e os seus direitos pode evitar que a dívida vire uma bola de neve — diz Angelos.
Ferramentas simples como anotações em cadernos, aplicativos gratuitos ou planilhas digitais podem ser grandes aliadas. O importante é que a pessoa visualize os números e tome as rédeas do próprio orçamento.
Quando procurar ajuda legal?
Se a dívida já está em estágio avançado e as cobranças são abusivas, vale buscar orientação jurídica.
— O Código de Defesa do Consumidor e a Lei do Superendividamento garantem proteção. Há casos em que contratos podem ser anulados por vício de consentimento ou práticas enganosas — destaca o advogado Rodrigo da Veiga Lima.
Um problema coletivo, soluções compartilhadas
Os especialistas alertam que sair do superendividamento não é tarefa rápida nem fácil, mas é possível com uma abordagem realista, persistente e com apoio.
Se você conhece alguém que está enfrentando essa situação — ou se é o seu caso —, saiba: pedir ajuda é o primeiro ato de recomeço.
* Produção: Leonardo Martins
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