Com um salto na arrecadação e gastos sob controle, o governo do Rio Grande do Sul fechou os primeiros seis meses de 2021 registrando um resultado que não se via desde 2016 no período: saldo positivo nas contas. Segundo dados da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), o superávit orçamentário (receitas acima das despesas) chegou a R$ 2,76 bilhões, próximo de duas folhas salariais dos servidores do Executivo.
Em 2016, depois de forte arrocho, contenção e atrasos, o governo de José Ivo Sartori também conseguiu fechar o primeiro semestre com superávit, de R$ 792,6 milhões — foi a primeira vez após três anos e quatro meses no vermelho.
Naquela época, a condição durou apenas 24 horas e se deveu à venda da folha dos servidores ao Banrisul. O dinheiro entrou em caixa e praticamente “evaporou”. Foi usado de imediato para cobrir o 13º salário dos servidores de 2015, que havia sido parcelado devido à crise financeira. No final de 2016, o balanço ficou negativo em R$ 143,1 milhões.
Desta vez, o alívio vem se repetindo desde o início de 2021. Relatórios produzidos pela Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage) apontaram superávits de R$ 784,8 milhões no primeiro bimestre e de R$ 1,96 bilhão no final de abril. O novo resultado, na avaliação do economista Darcy Carvalho dos Santos, indica consistência.
— Uma série de fatores contribuem para isso, tanto pelo lado da receita quanto pelo lado das despesas. Se a economia mantiver a trajetória de retomada, a tendência é de que o superávit siga até o final do ano — projeta Santos, auditor fiscal aposentado do Estado.
Uma das razões para a melhoria nos números é a queda no déficit da Previdência (de R$ 674 milhões) e a redução nos desembolsos com o funcionalismo, decorrentes das reformas. No caso das despesas com pessoal, a diminuição foi de R$ 144 milhões (veja os detalhes nos gráficos abaixo).
A outra explicação para o saldo positivo é o avanço da arrecadação em comparação com 2020, quando a pandemia causou forte retração. Isso ocorreu principalmente no primeiro quadrimestre (a ajuda federal, responsável por recompor as perdas, chegou entre junho e setembro). Em 2021, o salto se deve à recuperação da atividade econômica e a melhorias na Receita Estadual, de forma a simplificar a burocracia tributária. Só o ICMS teve crescimento real (descontada a inflação) de 20%.
Esse cenário e as perspectivas que se abrem com o ingresso de recursos das privatizações no segundo semestre, levaram o governador Eduardo Leite a anunciar a ampliação dos investimentos, com obras viárias e melhorias nos municípios. Leite também garantiu que os pagamentos dos servidores seguirão em dia até dezembro, e não está descartada a possibilidade de quitação do 13º salário na data certa.
À frente da Secretaria Estadual da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso comemora a evolução nas contas, mas é cauteloso ao projetar os próximos passos.
— É, sem dúvida, um resultado importante, mas ainda há muitos passivos a resolver. Eu costumo dizer que o Rio Grande do Sul tinha um desequilíbrio corrente, deficitário mês a mês, e uma série de passivos resultantes desse desequilíbrio. A gente está construindo uma situação de equilíbrio corrente e, aos poucos, tentando eliminar os passivos. Não podemos fingir que não existem os precatórios, e a dívida com a União ainda é um problema. Falta muita coisa — diz Cardoso.
O que vem pela frente
Até o fim de 2021, há a perspectiva de entrada de novos recursos em caixa e de mais reduções nas despesas com pessoal, mas Leite também terá desafios pela frente.
Um deles será propor novas alterações tributárias para contrapor a volta das alíquotas de ICMS aos patamares de 2015. Isso ocorrerá a partir de 1º de janeiro de 2022 e significará perda bruta de R$ 2,6 bilhões ao ano — R$ 2 bilhões para o Estado (acima de uma folha salarial do Executivo) e R$ 650 milhões para os municípios.
Quanto à expectativa de mais receitas, a principal soma virá da venda do braço de transmissão da CEEE, cujo leilão foi realizado em julho, no valor de R$ 2,67 bilhões. O dinheiro tem até 90 dias para entrar nos cofres estaduais. Há, também, a privatização da Sulgás, que renderá, no mínimo, R$ 928 milhões para o Estado. O edital com a definição da data do leilão deve sair em agosto.
Outra fonte de melhoria financeira virá da Previdência dos servidores militares. A reforma foi aprovada em março deste ano e os efeitos começaram a ser sentidos em julho. A equiparação com as regras dos servidores civis levará a redução de R$ 200 milhões anuais nas despesas previdenciárias.
Com base nisso e no superávit registrado no primeiro semestre, devem crescer sobre o governador as pressões de categorias por reajustes salariais. Sem aumento desde novembro de 2014, no último ano da gestão de Tarso Genro, os professores da rede estadual intensificaram as reivindicações, sob o argumento de que os ganhos se desvalorizaram ainda mais com a escalada da inflação.