Em contraste com o aperto geral em serviços públicos, custeio e investimentos, o projeto de orçamento federal de 2020 destina R$ 4,7 bilhões à criação de vantagens para a carreira militar. O montante decorre de benefícios instituídos pela reforma previdenciária das Forças Armadas.
Como contrapartida às exigências de maiores contribuição e tempo de serviço para as pensões, o governo Jair Bolsonaro incluiu no texto, que tramita na Câmara dos Deputados, a alta imediata da remuneração da caserna. Para tanto, propõem-se, por exemplo, o aumento do adicional de habilitação — recebido por militares que passam por cursos de qualificação — e a criação do chamado adicional de disponibilidade.
A justificativa, para defensores do projeto, é a dedicação exclusiva e a prontidão permanente dos profissionais. Duplica-se, além disso, a ajuda de custo para os que vão para a reserva, de quatro para oito vezes o valor do soldo.
Segundo o cálculo oficial, as novas regras para a inatividade proporcionarão economia de R$ 97 bilhões ao longo de uma década. Já a melhora das carreiras custará quase R$ 87 bilhões no mesmo período.
Em 2020, porém, não se nota um saldo positivo: calcula-se um déficit de R$ 43,5 bilhões na Previdência dos militares, apenas R$ 2,5 bilhões abaixo do projetado para este ano. Entre os ministérios, o da Defesa é o que mais gasta com pessoal ativo e inativo — em 2019, estão autorizados desembolsos de R$ 81,1 bilhões.
Os valores de 2020 ainda não estão claros, porque grande parte deles depende de autorização especial do Congresso — em razão do atual descumprimento da regra constitucional que impede fazer dívida para pagar compromissos cotidianos da administração.
Entretanto o gasto adicional com as carreiras das Forças Armadas consta de um anexo sobre encargos com contratações e reajustes salariais. Trata-se de um caso raro, no primeiro projeto orçamentário de Bolsonaro, de elevação de uma despesa por iniciativa do Executivo federal.
Grandes rubricas, como a Previdência e os programas assistenciais, recebem mais verbas por imposições legais. Os benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), no exemplo mais importante, saltam de R$ 631 bilhões para R$ 683 bilhões, mesmo sem alta do salário mínimo acima da inflação.
Como há um teto para o gasto total inscrito em 2016 na Constituição, o governo é forçado a comprimir as atividades e programas não obrigatórios — efeito que tende a se tornar mais visível a cada ano.
As vítimas mais costumeiras são as obras públicas e outros investimentos, em queda desde o início do segundo mandato da petista Dilma Rousseff. Em 2020, eles contarão com R$ 19,5 bilhões, equivalentes a 0,26% do Produto Interno Bruto (PIB). Para manter o nível observado até 2014, próximo a 1% do PIB, seriam necessários R$ 75 bilhões.
A queda do investimento afeta, em especial, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), responsável pelas rodovias federais. Os comandos de Exército, Marinha e Aeronáutica também contabilizam redução expressiva de recursos.
O arrocho chega também ao custeio, categoria que engloba atividades tão diferentes quanto a manutenção da máquina administrativa — iluminação, limpeza, segurança — e bolsas de estudo.
Um dos cortes mais rumorosos se dá na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), cujas verbas de execução não obrigatória caem de R$ 4,1 bilhões para R$ 2,1 bilhões no próximo ano. Como no caso do contingenciamento imposto às universidades, a repercussão é amplificada pelas tensões entre o bolsonarismo e os setores de educação e ciência.