BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A fim de defender a proposta de endurecimento nas regras para aposentadoria rural, o governo reuniu dados para sustentar que os trabalhadores do campo não precisam manter as atuais especificidades na hora de pedir o benefício.
Técnicos da equipe econômica fizeram um levantamento e concluíram que, após os 65 anos de idade, pessoas na cidade e no setor rural recebem a aposentadoria por quase o mesmo tempo, sendo que, segundo eles, os trabalhadores do campo ainda vivem mais.
Líderes de partidos aliados ao governo dizem, contudo, que o Congresso deve modificar a proposta de reforma da Previdência do presidente Jair Bolsonaro e aliviar as alterações para o setor rural.
O governo quer elevar, de 15 anos para 20 anos, o tempo mínimo de contribuição para que os trabalhadores do campo possam se aposentar. Além disso, passar de 55 anos para 60 anos a idade mínima para mulheres - mesmo patamar exigido atualmente para homens.
Para os trabalhadores da cidade, a proposta prevê idade mínima de 65 anos, se homem, e 62 anos, se mulher, além dos 20 anos de contribuição.
Integrantes da Secretaria Especial de Previdência do Ministério da Economia pesquisaram quanto tempo uma pessoa com mais de 65 anos de idade recebe a aposentadoria.
No caso dos homens, o benefício é encerrado por morte, em média, aos 78,7 anos quando o aposentado é do setor urbano. Para quem é da zona rural, o resultado foi de 80,8 anos; portanto, maior.
Há pouca diferença na análise entre mulheres do campo e da cidade. As aposentadas do setor rural recebem o benefício, em média, até o 81,1 anos; enquanto que as da zona urbana morrem aos 81,5 anos.
Os dados não consideram pensões, mas apenas as aposentadorias pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) a partir dos 65 anos de idade.
É no Nordeste do país onde há maior concentração de aposentadorias rurais. Por isso, a bancada regional reagiu contra a proposta de mudar os requisitos para os trabalhadores rurais.
Entre os parlamentares do agronegócio, que somam quase 230 deputados e senadores, a proposta de Bolsonaro também não foi bem recebida.
Já há um movimento no Congresso para abrandar as mudanças e prever 57 anos de idade mínima para trabalhadoras do campo ou manter o patamar atual (55 anos).
O governo, por outro lado, tentará, com o apoio de técnicos, do secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, e da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, preservar o texto da reforma.
Marinho é ex-deputado e Cristina se licenciou da Câmara para assumir o ministério em janeiro. Ex-líder da bancada ruralista, ela se declarou a favor da idade mínima de 60 anos para homens e mulheres do campo.
Um dos diretores da Secretaria Especial de Previdência, Leonardo Rangel, argumenta ainda que ter critérios diferentes para trabalhadores urbanos e rurais é algo raro no mundo.
"Mesmo nossos países vizinhos aqui da América Latina, que são pobres, com população rural alta, informalidade alta, já estão extinguindo essa diferença, tentando deixar mais delimitado o que é Previdência e o que é assistência".
O governo diz que a reforma prevê recursos assistenciais para a população carente, mas quer deixar claro que, no caso da Previdência, o sistema tem que ser sustentável.
Rangel afirmou também que as regras atuais para benefícios rurais foram definidas em 1988 e precisam ser atualizadas, pois houve melhoria nas condições de vida da população. Além disso, os dados levantados contradizem a ideia de que os aposentados do campo vivem menos.
"Os resultados que a gente mostra são completamente contraintuitivos e vão contra o senso comum".
Apesar de o meio rural ter salários mais baixos, vida laboral iniciada mais cedo e condições de trabalhos mais penosas, o governo defende que os critérios previdenciários para o meio rural precisam mudar, já que as pessoas estão vivendo mais.
Para Matheus Stivali, assessor da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, as diferenças sociais no país devem ser resolvidas por meio de políticas do Estado focadas nesses problemas.
"A Previdência tem que ser justa. Agora, o quanto a gente consegue convencer [os parlamentares] é difícil falar".
Na reforma da Previdência proposta pelo ex-presidente Michel Temer, que fracassou, foram sugeridas regras mais rígidas para aposentadorias rurais.
Com a rejeição dos parlamentares a esses pontos, a versão final do projeto mantinha os atuais requisitos para os trabalhadores do campo.
Na base aliada de Bolsonaro, como no DEM e no Podemos, também já há parlamentares contrários a qualquer mudança para a aposentadoria rural.
O líder do DEM, Elmar Nascimento (BA), declarou que a bancada do partido quer manter a idade mínima para trabalhadoras rurais em 55 anos.
"Essas pessoas do campo precisam de mais proteção. Isso não passará [por aprovação] da Câmara".