- Comadre, me dê a pista: quero saber onde anda o meu xaxado?
- Nos xaxados e perdidos!
Esse diálogo gracioso entre Gilberto Gil e Marlui Miranda no começo da canção Onde o Xaxado Tá acabou batizando o projeto de garimpo musical que a cantora, pianista e compositora Simone Rasslan apresenta nesta quinta-feira à noite no Theatro São Pedro.
A música está no disco O Sol de Oslo, lançado por Gil em 1998 - mas, segundo Simone, a ideia de recuperar um cancioneiro meio esquecido é um "projeto de vida inteira":
- Sempre me interessei pela música de qualidade que está lá na lixeira cultural, no lugar onde as coisas estão perdidas e quase ninguém mais visita. Ninguém fica anunciando o guarda-chuva que está no canto da seção de achados e perdidos da rodoviária, né?
A ideia, porém, só começou a tomar forma em 2009, depois de nove anos com o espetáculo Rádio Esmeralda AM - e após a morte de Adriana Marques, parceira de Simone no musical dirigido por Hique Gomez. Se naquele espetáculo o foco eram os sucessos populares do rádio brasileiro nas últimas décadas, em Xaxados e Perdidos o interesse da artista se volta para ritmos, melodias e temas com sabor regional em arranjos semiacústicos burilados e sofisticados - um olhar cosmopolita para a música do país matuto.
- Eu queria um outro som, mais brejeiro, que estivesse na linha entre o popular e o erudito. Em 1998, fiz um projeto chamado O Mar Vai Virar Sertão, que tinha mais ou menos esse mote: olhar para dentro do Brasil e mostrar essa música diferente daquela que exportamos, mais espetacularizada - explica Simone.
O show que será apresentado amanhã dentro do 19º Porto Alegre Em Cena segue praticamente o mesmo roteiro do disco recém-lançado, misturando músicas como Baião de Quatro Toques (Zé Miguel Wisnik e Luiz Tatit), Ciranda (Moacir Santos e Gilberto Gil), Água e Vinho (Egberto Gismonti e Geraldo Carneiro) e Capim de Ribanceira (Almir Sater e Paulo Simões) com temas de domínio público _ caso de Cuitelinho e Canto das Fiandeiras. O repertório inclui ainda canções de autores gaúchos como as duplas Nico Nicolaiewsky e Silvio Marques (Flor) e Wanderlei Falkemberg e Giba Giba (Lugarejo) e parcerias da dupla de companheiros de Simone Rasslan em Xaxados e Perdidos: Álvaro RosaCosta e Beto Chedid.
- Convidei o Álvaro dentro de casa porque ele é meu marido. Respeito demais ele como autor e músico, o roteiro do disco e do show é dele, e tem a ver com a nossa experiência com teatro. Já o Beto foi um "xaxado": conheci-o durante o espetáculo infantil Arca de Noé, em 2009. Ele trouxe para o projeto uma sofisticação nos arranjos, veio com a informação do violão seresteiro - diz Simone, lembrando que a apresentação no São Pedro contará, além do trio, com as participações especiais de músicos como Jorge Matte, Mimmo Ferreira, Ronald Augusto, Álvaro VilaVerde e Fábio Mentz.
Formada em pedagogia e professora de música, a sul-matogrossense de 45 anos que veio estudar regência em Porto Alegre em 1988 e nunca mais saiu daqui preocupa-se também com a gurizada que só canta em inglês e não escuta, desconhece e torce o nariz para a música brasileira. A "tia do SOE" exige que seus alunos pré-adolescentes cantem em português - e quer despertar nos jovens e nos mais velhos, na sala de aula e no disco-show Xaxados e Perdidos, o prazer que sentia na infância em Dourados, vendo a boiada passar na frente de casa:
- Gosto da modinha que deixa o olho marejado, da música de sentar ao pé da mangueira para tocar viola. É o Brasil quieto, que não é visto.
Xaxados e Perdidos
De Simone Rasslan com Álvaro RosaCosta e Beto Chedid
18 músicas, R$ 20 (à venda no teatro durante o show).
Cotação: 3 de 5