
Pista Livre, o terceiro disco da Cachorro Grande, ganhou forma a partir de uma farsa. No entanto, essa foi uma mentira tão bem contada que se tornou uma verdade, consolidando o trabalho que lançou o grupo gaúcho ao cenário nacional.
Para celebrar os 20 anos do álbum, a banda promove um show que será realizado única e exclusivamente em Porto Alegre neste sábado (21), no Auditório Araújo Vianna (confira o serviço completo abaixo).
Com Beto Bruno (vocal), Marcelo Gross (guitarra), Gabriel “Boizinho” Azambuja (bateria), Pedro Pelotas (teclado) e Eduardo Barreto (baixo), a Cachorro Grande tocará Pista Livre na íntegra – o que inclui clássicos que se eternizaram no repertório, como Você Não Sabe o que Perdeu, Desentoa, Bom Brasileiro e Sinceramente. Além destas, hits de outros álbuns também farão parte do show.
Com as participações de Duda Calvin, Rafael Malenotti e Carlinhos Carneiro, o show comemorativo será apresentado apenas na Capital, terra natal da banda. Após esse evento, haverá continuidade da turnê de 25 anos, conforme explica o guitarrista Marcelo Gross:
— É um presente para os fãs celebrarem esse momento. É um disco emblemático, que mudou as nossas vidas. Retomar esse repertório, tocar o álbum inteiro vai ser uma alegria.
Tínhamos mentido para a gravadora que a gente já tinha as músicas e íamos entrar em estúdio vinte dias depois
BETO BRUNO
Vocalista
Além da turnê, a Cachorro Grande tem preparado novas composições para um disco que deve ser produzido em 2026. A banda chegou a anunciar o término em 2019, mas se reuniu esporadicamente para alguns shows três anos depois. Agora, o grupo deve solidificar esse retorno com material inédito.
— Foi muito difícil para cada um — diz Beto Bruno — Quando a gente fez o primeiro show no Araújo (em 2022), na segunda música eu pensei: “É isso que estou sentindo falta na minha vida”. Havia um vazio. É por isso que preciso tocar com esses caras e tenho que estar em cima do palco com eles.
A mentira que virou verdade
Tudo aconteceu muito rápido. Em 2004, a Cachorro lançou As Próximas Horas Serão Muito Boas, álbum gravado no ano anterior. Mas, devido a divergências com a então gravadora da banda, Orbeat Music, o disco foi distribuído como um encarte na revista de variedades OutraCoisa à época.
O trabalho chamou a atenção da gravadora Deckdisc, que decidiu fechar com o grupo. Com isso, a matilha transferiu a residência para São Paulo. Beto e Gross se reuniram com o produtor Rafael Ramos, que os colocou contra a parede: "Vamos gravar um disco! Vocês já têm composições". Em poucas semanas, a banda entraria em estúdio para gravar as demos do que viria a ser o Pista Livre.
Só que era mentira. A banda não tinha mais de quatro canções inéditas. Às pressas, Beto e Gross se trancaram em um quarto de hotel durante alguns dias, com pizza e cervejas, para compor um número de canções suficiente para preencher o disco.
— Engraçado, é o disco que mais fez sucesso da banda, mas foi feito totalmente às pressas. Tínhamos mentido para a gravadora que a gente já tinha as músicas e íamos entrar em estúdio vinte dias depois. Total pressão — relembra Beto.
Cumprido o objetivo, as canções foram apresentadas e Rafael aprovou. Porém, ele fez uma ressalva: faltava uma balada. Gross tinha uns esboços de Sinceramente, mas em outro ritmo. Tendo Paul McCartney como influência, a faixa foi reformulada.
— A gente não esperava que ela fosse ser uma música que cairia tanto no gosto do pessoal — confessa o guitarrista.
Aliás, quando a música ficou pronta, Beto lembra que não gostou:
— Falei algo como “galera, foi legal o esforço, mas eu não estou curtindo, acho que está levando a banda para um outro caminho”. Mal imaginava que era o caminho que o grupo tinha que seguir para crescer. Até hoje o Gross joga na minha cara: “Ó, não queria a música, mas agora canta em todos os shows”. De fato, não pode faltar.
O álbum carrega uma sonoridade roqueira, que estava em alta naquele momento por conta da nova leva de bandas do começo dos anos 2000 — como The Strokes e The Hives —, mas que também espelhava o entusiasmo da “cachorrada”.
Em Pista Livre, há influências em maior ou menor grau de The Kinks e The Sonics (Você Não Sabe o Que Perdeu), The Stone Roses (Velha Amiga), Jet e Oasis (Agora Eu Tô Bem Louco), Television (Novo Super-Herói) e Beatles (Bom Brasileiro), entre outras.
— Reflete bastante a empolgação que estávamos de subir mais um degrau da nossa carreira, da perspectiva de ter uma gravadora, ter condições melhores, de se tornar uma banda não só de rock gaúcho, como de circulação nacional. Foi o que acabou acontecendo com esse disco — avalia Gross.
Um ano na pressão
Foi um um ano intenso aquele de 2005. No período de Pista Livre, tudo acontecia para a Cachorro Grande com uma velocidade que beirava à rispidez.
Por exemplo, às vésperas de a banda fazer uma apresentação do novo disco para a imprensa, o então baixista Jerônimo Bocudo deixou o grupo. Rodolfo Krieger foi recrutado às pressas, tendo de aprender em poucas horas as canções para o show.
Também foi o ano em que a matilha participou do Acústico MTV: Bandas Gaúchas, que teve considerável projeção nacional, e estrelou o Família MTV, reality show que acompanhava os integrantes.
É, 2005 foi o ano da Cachorro Grande. Aproveitamos bastante. Foi um momento bem quente, e a gente lidou com isso com muita alegria e cerveja
MARCELO GROSS
Guitarrista
A Cachorro passou a viajar o país, sendo atração principal em festivais e atendendo a uma extensa agenda de divulgação do disco em programas de TV e rádio. Além disso, Sinceramente furava a bolha roqueira e era constante nas emissoras FMs. Foi um momento de forte presença da banda, mas também de pressão.
— Era a primeira vez que tinha uma gravadora falando “precisamos de hits!” Até então, a produção era nossa, a gente fazia o que queria — sublinha Beto. — Também não estávamos acreditando no que estava acontecendo e não tinha tempo para ficar pensando. Tanta mudança, tanta coisa boa acontecendo ao mesmo tempo. Quando a gente chegava em Porto Alegre, Sinceramente tocava ao mesmo tempo em três rádios.
Gross complementa:
— É, 2005 foi o ano da Cachorro Grande. Aproveitamos bastante, estávamos com muita sede daquilo que trabalhamos para acontecer. Foi um momento bem quente, e a gente lidou com isso com muita alegria e cerveja (risos).
Com o estouro do Pista Livre, Beto lembra que voltou o interesse nos dois primeiros discos da Cachorro Grande, que, posteriormente, seriam relançados.
— Aquelas musiquinhas que a gente fez ali no corre, no desespero, depois tinha 30 mil pessoas cantando. Era um sonho que a gente não queria acordar — conclui o vocalista.
Cachorro Grande — 20 anos de Pista Livre
- Quando: sábado (21)
- Horário: às 22h
- Onde: Auditório Araújo Vianna (Avenida Osvaldo Aranha, 685).
- Abertura da casa: 20h30min
- Ingressos: a partir de R$ 60 (solidário, mediante doação de 1kg de alimento não perecível). Desconto de 50% de desconto para sócios do Clube do Assinante RBS e acompanhante.
- Pontos de venda sem taxa: Loja Planeta Surf Bourbon Wallig (Av. Assis Brasil, 2.611), das 10h às 22h, somente em dinheiro; e bilheteria do Araújo Vianna, somente no dia do evento, duas horas antes do show. Ponto de venda com taxa: pela plataforma Sympla.
- Classificação: 16 anos. Menores de 16 anos acompanhados por responsável. Crianças até 24 meses não pagam entrada e ficam no colo dos responsáveis durante a apresentação. A partir de dois anos e um dia, a criança paga meia-entrada mediante apresentação da carteira de identidade ou certidão de nascimento.