
Após seis anos de estudos, a formatura no curso de Medicina é uma festa muito esperada pelos alunos. Mas, no meio de uma pandemia, a situação mudou. Nesta terça-feira (21), um grupo de 36 estudantes coletou discretamente os aguardados diplomas na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), que estava vazia e silenciosa. Sem abraços nos professores nem nos parentes, que não puderam comparecer, os alunos tiveram rápidas cerimônias individuais entre as 8h e as 13h. Na sala, encontraram apenas poucas autoridades da universidade. Para deixar o processo menos frio, tudo foi transmitido ao vivo pela internet:
— Cada um higienizava as mãos, fazia o juramento e assinava a ata. Foi uma cerimônia simplificada, sem todos os atos. A transmissão a deixou um pouco mais calorosa e aconchegante, eles conseguiram se sentir abraçados e acolhidos — conta o coordenador acadêmico do Campus Passo Fundo, Leandro Tuzzin.
A UFFS foi a primeira instituição gaúcha a antecipar a formatura de seus estudantes de Medicina em prol do combate ao coronavírus. Dos 38 estudantes aptos a se formar, apenas dois não quiseram antecipar a colação de grau, que estava originalmente marcada para 10 de junho – eles permanecerão atendendo a população, mas na condição de estudantes e, quando possível, cumprirão o resto da carga horária, formando-se com histórico escolar normal. Segundo a UFFS, o grupo de formados já havia cumprido 92% do currículo, e seu histórico escolar refletirá isso.
Outras universidades do Estado planejam formaturas antecipadas para os próximos dias, uma providência autorizada pelo Ministério da Educação (MEC) para diferentes cursos da área da saúde. Tuzzin explica que a decisão de antecipar a formatura é complexa e envolve muita discussão:
— A medida provisória pegou todas as universidades de surpresa. Determinou que os graduandos de Medicina que estivessem com 75% do internato podiam abreviar o curso. É algo com o qual as universidades não concordam ao natural, então a gente estudou a nossa realidade, conversamos com os alunos, perguntamos se se sentiam preparados, olhamos as horas feitas, e, no final das contas, a ampla maioria dos alunos pediu para antecipar a colação e os docentes entenderam.
Pela portaria do MEC, os formandos não estão obrigados a atuar no combate ao coronavírus, mas, segundo Tuzzin, os alunos se comprometeram a ajudar. Oriundos de diferentes cidades, alguns planejam retornar e já têm inclusive vaga de trabalho garantida.

Com o diploma em mãos, Natália Bender Führ, 25 anos, planeja retornar à cidade natal, São Leopoldo, para continuar estudando para as provas de residência ao final do ano e trabalhar:
— Existem muitas frentes de combate ao coronavírus, desde triagem até o atendimento aos pacientes graves. Acredito que neste momento os novos formandos devem atuar em linhas de frente de menor complexidade, até que tenham experiência. Precisamos ser cautelosos para não virarmos estatística nesta pandemia — opina a médica recém-formada.
Natália se sente preparada para o desafio, especialmente porque os últimos dois anos de faculdade são destinados ao estágio prático. Mesmo assim, o processo de se formar foi desafiante:
— Mas quando houve a proposta de nos formarmos mais cedo, inicialmente, pra mim, foi bastante angustiante, porque em um dia recebíamos notícias do governo federal que nos formaríamos e no dia seguinte era um incerteza. Quando foi autorizada a formatura, a sensação foi de alívio. Seguida de algumas incertezas, dúvidas, por não haver nenhuma experiência similar aqui no Estado, e tristeza, pois todos nós estaríamos longe da família nesse momento que eles tanto nos deram suporte. Nossos professores sempre nos deram suporte e apoio. Sendo cautelosos nas decisões e nos aconselhando, mas jamais nos incitando medo. Então, hoje, a sensação de alegria prevaleceu, porque, apesar de tudo, tivemos uma formatura e hoje realizamos um sonho.

Natural de Passo Fundo, Vanessa Damini, 24 anos, permanecerá na cidade e pretende trabalhar numa unidade básica de saúde. Segundo ela, é o caminho natural da maioria dos formados:
— Ao se formar, a gente entra numa unidade básica de saúde ou emergência, que são as portas de entrada para a população que acessa o sistema de saúde. Hoje, com o aumento de casos e a transmissão cada vez maior, a gente se põe realmente na linha de frente para entrar no combate.
