Reza a lenda que quem gosta de nadar fica contando os azulejos no fundo da piscina enquanto se movimenta. Essa experiência fica ainda melhor no hotel Clara Arte Resort, inaugurado junto ao Instituto Inhotim, o maior museu a céu aberto da América Latina. Lá, é possível admirar as pastilhas de cerâmica em 22 tons de cinza, feitas pelo artista pernambucano José Patrício, enquanto se nada na piscina coberta com uma raia de 25 metros. O custo dessa obra de arte submersa? Nada menos que "o preço de um Porsche", garante a CEO do grupo Clara Resorts, Taiza Krueder.
Localizado no coração de Brumadinho, em Minas Gerais, o hotel Clara Arte Resort foi inaugurado em dezembro de 2024, em uma área de 12 hectares adquirida pelo grupo hoteleiro do empresário siderúrgico Bernardo Paz – o colecionador de arte que idealizou e fundou o museu, que hoje é uma organização sem fins lucrativos mantida por doações e leis de incentivo.
— O nosso maior propósito para ter um hotel dentro de Inhotim é, antes de mais nada, aproximar as pessoas da arte, com muita natureza, porque acho que criança tinha que comer arte no café da manhã com sucrilhos, e os adultos também. O Clara Arte Resort é, com certeza, um novo pulmão para Inhotim — afirma Taiza.
Mistura de luxo com arte
Os investimentos no hotel, que é o primeiro construído junto a um museu, simbolizam bem sua proposta: uma mistura de turismo de luxo com arte contemporânea, em meio à exuberância do jardim botânico mantido pelo Instituto Inhotim e à vastidão dos 144 hectares de verde que compõem a área do parque.
De uma obra inacabada e paralisada há 10 anos, nasceu o Clara Arte Resort — com 46 bangalôs espaçosos e aconchegantes, construídos sobre palafitas entre árvores e jardins. As estruturas oferecem privacidade e sofisticação, com varanda, lareira, copa e banheiro que impressiona pela banheira feita em pedra-sabão esculpida. Nas suítes presidenciais, há sala, cozinha, sauna e jacuzzi externa.
Para se hospedar, a diária dos bangalôs varia entre R$ 2.250 e R$ 4.435, a depender da temporada e do tipo de acomodação. As unidades comportam de quatro a cinco pessoas.
Áreas atrativas
Ao chegar ao Clara Arte, a sensação é de entrar em um cenário peculiar, que não necessariamente faz sentido — talvez porque a arte não tenha esse compromisso. Longos corredores de pedra, móveis de madeira e elementos de paisagismo acentuam a ideia de que o hóspede está no meio da floresta.
O projeto arquitetônico, assinado pelas mineiras Joana Magalhães e Sofia Lobato, foi pensado para respeitar o desenho original de Freusa Zechmeister, interrompido em 2014. Os interiores das áreas comuns e dos quartos são assinados pela arquiteta Marina Linhares.
As áreas comuns, inclusive, estão entre os principais atrativos do hotel, com sauna, spa, academia, entre outros espaços. A piscina externa climatizada, por exemplo, tem borda infinita e uma vista incrível do horizonte.
As crianças são muito bem-vindas e podem aproveitar tanto as áreas rasas de cada piscina quanto a brinquedoteca, com peças assinadas pelo artista visual Artur Lescher.
Gastronomia mineira e internacional
A culinária do Clara Arte é, sem dúvida, um dos pontos altos do hotel, que oferece pensão completa. A própria CEO é chef de cozinha e confiou ao chef Gabriel Sodré — com passagem por casas estreladas, como o Enigma, de Albert Adrià, em Madri — a responsabilidade de comandar a cozinha do resort, que proporciona uma experiência imersiva nos sabores de Minas Gerais com toques internacionais.
Há um restaurante à la carte à beira da piscina e outro em formato buffet, ambos com cardápio baseado em ingredientes orgânicos. O happy hour diário com espumante e pipoca gourmet, sempre às 18h30min, convida os hóspedes a desacelerar e socializar, como em um vernissage informal.
Paradas obrigatórias
Hospedar-se no Clara Arte é estar dentro do acervo — tanto no sentido geográfico quanto simbólico —, já que a entrada do Instituto Inhotim está a poucos minutos de distância. Um dos maiores benefícios é poder explorar tranquilamente essa curta caminhada do hotel ao museu, com acesso exclusivo nos dois dias em que ele permanece fechado ao público geral: segunda e terça-feira, das 10h às 13h.
Dificilmente o museu é visto por completo em apenas um dia, por isso a recomendação de Taiza é se hospedar por alguns dias no hotel, para visitá-lo com calma e evitar uma experiência maçante:
— Tinha gente que fazia esse parque inteiro em um dia, mas saía exausta e com a cabeça explodindo, porque é muita informação, a arte dá o que pensar. Então a ideia é que o nosso hóspede vá às galerias, volte, pense um pouco, reflita e possa realmente degustar Inhotim.
Conforme o visitante segue o caminho construído na mata — o local é rico em biodiversidade, por estar situado numa transição entre o Cerrado e a Mata Atlântica —, vão se revelando imensas construções, que compõem as 25 galerias do museu.
Uma das que fazem mais sucesso é a galeria permanente dedicada a Yayoi Kusama, que abriga duas instalações emblemáticas da artista japonesa: I’m Here, But Nothing (2000), um cômodo doméstico preenchido por incontáveis pontinhos em cores neon, que brilham sob a luz negra; e Aftermath of Obliteration of Eternity (2009), uma sala de espelhos iluminada por luzes douradas que remetem a lanternas japonesas, criando uma atmosfera única e infinita.
Outra parada obrigatória é a galeria da carioca Adriana Varejão, que impressiona tanto pela força das obras quanto pela arquitetura brutalista do prédio suspenso sobre um espelho d’água, encravado entre jaboticabeiras — projeto de Rodrigo Cerviño. Algumas das obras resguardadas em seu interior são Linda do Rosário (2004), uma parede em ruínas que parece recheada de vísceras, e Celacanto Provoca Maremoto (2004–2008), inspirada na azulejaria barroca portuguesa.
Na Galeria Fonte, a instalação Homo sapiens sapiens, da suíça Pipilotti Rist, propõe um mergulho audiovisual na relação entre corpo, natureza e feminino. A obra poderá ser visitada somente até agosto de 2026.
— A obra mostra que a vida vem do feminino e que o animal homem não só está na natureza, mas é a natureza — descreve o guia Junio César, um grande apaixonado pelo local, onde vive desde a época em que a área ainda era uma fazenda.
Além de arte, o museu também é palco para música – a segunda edição do festival Jardim Sonoro, que será realizado nos dias 12 e 13 de julho. Em 2024, o evento recebeu cerca de 9 mil pessoas.
Inhotim não é só arte
O Instituto também abriga um dos maiores jardins botânicos do Brasil, com curadoria científica de Juliano Borin, que atua na conservação de plantas e na pesquisa científica do espaço. No Viveiro Educador, o “QG” do botânico, o destaque é o Jardim dos Sentidos, onde chás, pimentas e ervas despertam tato, olfato e paladar.
Embora a estufa e o banco de sementes presentes no local não sejam abertos ao público, saber que eles existem — e que alimentam projetos de reintrodução de espécies nativas e arborização urbana — reforça o propósito ambiental de Inhotim.
Novo capítulo
A chegada do Clara Arte marcou um novo momento para Inhotim e para a comunidade local, duramente afetada pelo rompimento da barragem de Brumadinho, em 2019. Mais do que uma hospedagem, o hotel se posiciona como parceiro da região, incentivando doações e estabelecendo parcerias com trabalhadores e fornecedores locais.
Com 130 empregos diretos e dezenas de indiretos, o hotel já atrai hóspedes de todo o Brasil — em especial paulistas, mineiros e cariocas —, e deve, nos próximos anos, espelhar mais o perfil do público do museu, que conta com 80% de visitantes estrangeiros.
No horizonte, está a promessa de expansão: até 2029, o Clara Arte deverá se transformar em um resort completo, com 150 acomodações e um novo spa no meio da floresta. Mas, por ora, a experiência proposta ali é um equilíbrio entre arte, arquitetura, natureza e contemplação — com o luxo de ter tempo para parar e admirar os azulejos.
*A jornalista viajou a convite do E-mundi e do Clara Arte Resort