
A Portela anunciou, nesta sexta-feira (13), que o enredo para o Carnaval 2026 irá celebrar a negritude gaúcha: "O mistério do Príncipe Bará: a oração do Negrinho e a ressurreição de sua coroa sob o céu aberto do Rio Grande". O fio condutor será o Príncipe Custódio — líder de origem africana que chegou a Porto Alegre no início do século XX e se tornou uma figura de grande influência religiosa e política.
Respeitado por sua sabedoria e capacidade de articulação, teve papel fundamental na consolidação das religiões de matriz africana no Estado. A narrativa também abordará personagens como o Negrinho do Pastoreio — símbolo do sincretismo religioso e da tradição oral gaúcha —, além de outras personalidades marcantes da história afro-gaúcha.
As articulações com autoridades do Rio Grande do Sul começaram em abril, ainda durante o período eleitoral da escola. A negociação avançou e foi concluída após a escolha de Júnior Escafura como novo presidente da Portela, no fim de maio.
O valor do investimento do governo estadual no enredo ainda não foi divulgado. A escolha do tema abre caminho para o resgate de uma trajetória pouco conhecida fora do território gaúcho. O enredo será desenvolvido pelo carnavalesco André Rodrigues.
Nascido em 1841, Custódio Joaquim de Almeida — conhecido como Príncipe Custódio — viveu os últimos 30 anos de sua vida no RS, com forte presença na sociedade porto-alegrense. Estabeleceu-se na região da Cidade Baixa, onde sua residência se tornou um espaço de encontros religiosos e articulações políticas.
Custódio foi essencial na preservação das religiões de matriz africana em espaços públicos da Capital, com presença no Mercado Público e até no Palácio Piratini. Babalorixá e líder espiritual, era respeitado por autoridades da época, como Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros, que buscavam seus conselhos e reconheciam sua influência.
O anúncio do enredo nesta sexta-feira (13) carrega forte simbolismo religioso. A data é dedicada ao Bará, orixá dos caminhos, das encruzilhadas e do movimento — justamente o orixá de Príncipe Custódio.
Sincretizado com Santo Antônio, Bará é uma divindade reverenciada por abrir caminhos e remover obstáculos. A escolha do dia reforça o sentido espiritual da homenagem, e o orixá terá papel importante na narrativa que será levada à Marquês de Sapucaí.
Um clipe com a apresentação do enredo foi divulgado nas redes sociais da Portela. O vídeo contou com as participações dos atores Lázaro Ramos e Sheron Menezzes. As imagens incluem cenas gravadas no Mercado Público de Porto Alegre, onde está localizado o “Bará do Mercado” — um mosaico de pedras e bronze com sete chaves, instalado no cruzamento dos corredores centrais. O local é símbolo da ancestralidade negra na cidade. A gravação também contou com a participação de artistas gaúchos.
A escola já iniciou a fase de pesquisa, com apoio de instituições e especialistas do Estado. Para a próxima semana, está prevista uma visita ao RS do carnavalesco André Rodrigues e de pesquisadores da agremiação. A comitiva deve passar por Pelotas, Rio Grande e Porto Alegre. Na Capital, Custódio se fixou por volta de 1901, onde viveu até sua morte, em 1935.
Antes da Portela, outras escolas de samba do Rio de Janeiro já levaram elementos históricos do Rio Grande do Sul para a Marquês de Sapucaí. Em 1999, a Viradouro homenageou Anita Garibaldi com o enredo “Anita Garibaldi – Heroína das Sete Magias”, destacando sua trajetória ligada à Revolução Farroupilha.
Já em 2005, a Beija-Flor conquistou o título com o enredo “O Vento Corta as Terras dos Pampas… Sete Missões de Amor”, que abordou as missões jesuíticas no território gaúcho.
Com 22 campeonatos conquistados, a Portela é a escola com mais títulos no Carnaval do Rio de Janeiro. Em 2026, a azul e branca de Madureira será a terceira a desfilar no domingo, 15 de fevereiro, na Marquês de Sapucaí.