
O cessar-fogo é um alívio. Mas não é a paz. O passo seguinte é desafiador: o que acontece quando o poder local fica vazio? Sem um plano claro, o vácuo é um convite para que grupos mais radicais tomem o lugar do Hamas. Ou para que o próprio Hamas tente se recompor com métodos ainda mais brutais. É por isso que governos e especialistas falam em uma força internacional de estabilização: a ideia existe, mas ainda faltam mandato, composição e garantias claras.
No discurso feito ao parlamento israelense, Donald Trump, o patrocinador do acordo, agradeceu a países e pessoas, chegando a afirmar que “tivemos ajuda de gente que vocês nem imaginariam”. Estranho. Por que anonimato num gesto de paz? A questão revela algo maior: a diplomacia se faz nas sombras e, neste caso, gera desconfiança sobre quem decide e com que legitimidade.
O vácuo de poder em Gaza já mostra sinais perigosos. Em áreas das quais o exército de Israel se retirou, surgem execuções sumárias e disputas por controle. Sem um poder institucional legítimo, a ordem dá lugar à lei do mais forte.
Há, ainda, um problema mais profundo: parte do mundo árabe e muçulmano já reconheceu o direito Israel a existir — do Egito à Jordânia, dos Emirados Árabes Unidos e Marrocos a outros parceiros — mostrando que a convivência é possível e desejável. Mas regimes e redes que promovem a violência física e ideológica continuam atuantes, sob a influência de Teerã. Enquanto isso persistir, cessar-fogo é paliativo.
A assinatura do acordo deve ser o início de três imperativos. Primeiro, presença internacional robusta para estabilizar, proteger civis e prevenir o surgimento de novos grupos armados. Segundo, reconstrução e governança inclusiva, com participação palestina legítima e democrática. Terceiro, um trabalho de longo prazo sobre educação e liberdade civil na região, porque paz duradoura não nasce sem mudança cultural, que começa em casa e na escola.
Sem esses pilares, o mesmo ciclo tende a se repetir. A pergunta a fazer agora é simples e urgente: Como o cessar-fogo se transformará em paz? A resposta: passada a euforia pelo primeiro passo, compreender que a caminhada ainda é longa.




