
Dos 33 filmes brasileiros que competiram no prêmio Grande Otelo e participaram dos principais festivais internacionais nos últimos cinco anos, apenas 9% abordavam as mudanças climáticas. O dado é da pesquisa “Clima em Cena: A Emergência Climática em Filmes de Ficção Brasileiros”, coordenada pela Associação Brasileira de Autores Roteiristas (Abra).
A pesquisa avaliou longas-metragens de ficção que, desde 2021, foram indicados à premiação da Academia Brasileira de Cinema e/ou selecionados para cinco grandes festivais da categoria A, segundo a Agência Nacional de Cinema (Ancine): Cannes, Berlim, Veneza, Locarno (na Suíça) e Sundance (nos EUA). A organização foi do Projeto Paradiso, com as organizações norte-americanas Good Energy e Entertainment + Culture Pavilion.
Somente três filmes foram "aprovados" nessa avaliação: Homem Onça (2021), de Vinicius Reis; A Nuvem Rosa (2021), da gaúcha Iuli Gerbase; e A Flor do Buriti (2023), de Renée Nader Messora e João Salaviza.

A pesquisa foi baseada no teste The Climate Reality Check, desenvolvido por ativistas e pesquisadores dos Estados Unidos. São duas perguntas simples: a mudança climática existe no universo do filme? Um personagem tem conhecimento sobre isso?
Também segundo o levantamento, 57% dos filmes fazem alguma menção a consequências das mudanças climáticas, como fenômenos extremos.
— Nosso cinema está falando de problemas ambientais como enchentes, secas, falta de produtividade pela monocultura e os plástico nos oceanos. O que a gente ainda não está fazendo nas nossas narrativas é conectar isso como consequência de uma crise ambiental global — afirma a coordenadora chefe da pesquisa da Abra, Gisele Mirabai.
Foi a primeira aplicação do teste fora dos Estados Unidos. Por lá, a organização Good Energy já fez um grande estudo com as 250 obras mais populares segundo o IMDB lançadas entre 2013 e 2022. Anualmente, a organização também acompanha a lista de indicações ao Oscar.
A conclusão à qual a Good Energy chegou é semelhante à do estudo brasileiro: somente 9,6% dos filmes foram aprovados. Porém, apenas 12,8% faziam alguma menção à crise.

Para a roteirista Carmiel Banask, uma das desenvolvedoras da metodologia original, os resultados não são exatamente comparáveis, porque adotaram critérios diferentes. Mesmo assim, ela acredita que possam promover mais consciência:
— Nossos filmes não estão retratando nossa realidade. Aqui nos Estados Unidos, 72% dos americanos estão preocupados com as mudanças climáticas. O mesmo número passou por um desastre climático no último ano, mas só 40% dos americanos acreditam que outros americanos estão preocupados com o clima. Há uma grande desconexão — pontua.
Nesta semana, Carmiel estará em Porto Alegre, no 13° no Festival de Roteiro Audiovisual de Porto Alegre (Frapa). Ela participa do painel "Como Abordar a Emergência Climática em Narrativas Ficcionais Não Distópicas", nesta quarta-feira (5).
Depois, embarca para a COP30 junto com Gisele Mirabai. Elas apresentarão os resultados que obtiveram no pavilhão de entretenimento e cultura. Carmiel conclui:
— Dados não movem as pessoas. Histórias movem. Histórias criam as condições culturais para a mudança. Nós temos dados, temos políticas de soluções, sabemos as soluções, mas não temos a vontade política. Precisamos de histórias que verdadeiramente mostrem os impactos (das mudanças do clima) e conectem isso com a experiência das pessoas.
Os 3 filmes brasileiros que passaram no teste
A Flor do Buriti (2023)

De Renée Nader Messora e João Salaviza. Em 1940, duas crianças do povo indígena Krahô encontram um boi na escuridão da mata próxima a sua aldeia. Era o prenúncio de um massacre perpetrado por fazendeiros da região. Em 1969, os filhos dos sobreviventes são coagidos a integrar uma unidade militar, durante a ditadura militar (1964-1985). Hoje, o povo precisa lutar para para seguir caminhando sobre sua terra sagrada. (Netflix)
Homem Onça (2021), de Vinicius Reis

De Vinicius Reis. Pedro é funcionário de uma empresa estatal prestes a ser privatizada. No processo de reestruturação e contra a sua vontade, ele terá que demitir sua equipe e antecipar sua aposentadoria. Fora da empresa, Pedro decide voltar para sua cidade natal e descobre que a onça que habitava a floresta na sua infância segue viva. (Aluguel em Apple TV, Google Play e YouTube)
A Nuvem Rosa (2021), de Iuli Gerbase

De Iuli Gerbase. Na noite em que se conheceram, Giovana e Yago dormiram juntos. Na manhã seguinte, foram surpreendidos por uma nuvem rosa misteriosa que obriga a todos ficarem em suas casas. Essa convivência forçada se torna um desafio por dias, meses e anos seguintes. Yago vive sua utopia, enquanto Giovana não se conforma com a situação. (Telecine)
*Produção: Guilherme Freling



