
Convém o governo e os empresários brasileiros não cultivarem ilusões em relação aos gestos de aproximação do presidente Donald Trump. A porta está aberta para a revisão do tarifaço — não por amor, mas por dinheiro. Trump defende os interesses dos Estados Unidos e o presidente Lula, os do Brasil. Cada um tentará puxar a brasa para o seu assado, porque assim são as negociações internacionais.
Na conversa de 30 minutos com Lula e com três ministros na sala da videoconferência (Mauro Vieira, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad), Trump disse que os americanos estão sentindo falta do café brasileiro. O café é simbólico, porque é consumido em larga escala — e em canecas.
Os Estados Unidos também importam café de outros países, como Colômbia, Vietnã, Indonésia, Etiópia, Índia e Honduras, mas o Brasil é o maior produtor. E por se tratar de um produto que não pode ser produzido nas condições climáticas do hemisfério norte, é provável que as tarifas sejam reduzidas, até para conter a inflação.
No que interessa ao Rio Grande do Sul, vale a mesma lógica. Se for do interesse dos Estados Unidos, questões ideológicas serão deixadas de lado para atender aos consumidores que reclamam dos efeitos do tarifaço, seja pelo aumento de preços, seja pela escassez. É o caso da madeira para a construção de moradias e das tradicionais cerquinhas brancas de um país que não tem muros em volta das casas. Vale o mesmo para os móveis, uma indústria em que o Brasil se tornou competitivo e levou essa rasteira com a sobretaxa de 40% (a tarifa anterior era de 10%).
A primeira conversa foi importante para fornecer informações corretas a um presidente que não preza pela precisão das informações. Trump havia dito que a relação comercial com o Brasil era injusta (ele usa e abusa da classificação justo e injusto, mas sempre de acordo com seus critérios particulares). Lula mostrou que não. Que na relação comercial entre os dois países, os Estados Unidos têm superávit.
Na mesa de negociação, o vice-presidente Geraldo Alckmin terá oportunidade de detalhar com seus pares, produto por produto, o que o Brasil gostaria de reduzir, se não for possível baixar as tarifas no atacado. Trump não tem como pedir ao Brasil, como fez com a Argentina, que reduza as vendas para a China, por exemplo. Porque o Brasil não está de pires na mão precisado de empréstimo — e não pode abrir mão da pluralidade comercial que construiu nos últimos anos, até para reduzir a dependência de um único país.
Quando chegar a hora dos minerais críticos e das terras raras, a negociação muda de patamar. Entram no jogo interesses estratégicos para a indústria do futuro e não para a que sustentou o comércio bilateral até aqui.
ALIÁS
Além dos interesses econômicos, há um ponto que pode ajudar o Brasil na negociação com Trump. É o índice de desaprovação do presidente dos Estados Unidos nas pesquisas, que pode prejudicar os republicanos nas eleições legislativas e abrir caminho para a volta dos democratas à Casa Branca.




