
Nos dias úteis, evito escrever na primeira pessoa — porque importam os fatos, a análise, a opinião e os protagonistas, sempre figuras públicas. Aos domingos, a cada 15 dias, publico em GZH uma crônica sobre assuntos amenos. Hoje abro uma exceção porque não quero esperar 10 dias para compartilhar as emoções desta quarta-feira, 15 de outubro, Dia do Professor.
Comecei o programa Gaúcha Atualidade saudando os professores e professoras em geral e destaquei duas em particular — Celmira Barbosa Maganini e Inês Bauermann. Celmira foi minha primeira e única professora no ensino primário, hoje equivalente ao Fundamental 1, e me preparou para o exame de admissão ao ginásio. Inês foi minha inesquecível professora de português, na 1ª série do ginásio. Fiz a homenagem, falei da importância das duas e seguimos com as entrevistas agendadas, com duas autoridades que não se poderia chamar de fluentes.
Quando Andressa Xavier retomou o assunto dos professores e me perguntou sobre o que eu diria hoje à professora Celmira, falei de novo da importância dela na minha formação e do quanto deveria ser difícil lecionar para alunos do 1º ao 5º ano na mesma sala. Andressa disse que eu podia falar isso diretamente para a minha querida professora, que estava conectada em áudio e vídeo.
Foi uma surpresa total, ideia da Andressa para homenagear os professores e que a nossa produtora Kyane Sutelo colocou em prática com a competência que lhe é peculiar. Tanta emoção serviu como um teste para o meu sistema cardiovascular.
A professora então fez uma viagem no tempo e compartilhou com os ouvintes da Rádio Gaúcha as memórias da minha passagem pela Escola São Judas Tadeu, na Volta Vitória, interior de Campos Borges, desde o primeiro dia, com cinco anos, pequena e magrinha, levada pela mão do pai. Como não tinha idade para me matricular, ela autorizou que assistisse às aulas — só no ano seguinte eu poderia ser matriculada na primeira série.
Enquanto Celmira falava, eu e dezenas de amigos que estavam na escuta chorávamos. Pela emoção de ouvir uma professora apaixonada pelo ofício que exerceu enquanto a saúde permitiu e que se orgulha de ter alfabetizado todos os seus alunos na idade certa. Menos eu, que já cheguei sabendo ler e escrever, porque meu pai me ensinou em latas de óleo do trator do vizinho, caixas de remédio, embalagens de querosene e, por fim, no jornal que chegava na nossa casa enrolando as bananas que ele comprava quando ia à cidade.
Minha professora contou que, ao final do ano, ela não se conformou com o fato de eu ser matriculada na primeira série e pediu uma autorização especial à Secretaria da Educação de Espumoso para me promover direto para o segundo ano. Diz ela que a secretária Íris Brancher (eu sempre achei que fosse a dona Mery Rotta Colossi) condicionou a autorização à realização de uma prova. E que eu gabaritei.
Relatou também que eu era uma aluna exemplar. Que não conversava durante a aula, fazia todas as tarefas e por isso era a sua preferida, ao lado do Antônio Nereu (Pereira de Oliveira), um guri tímido, de letra miudinha, que não se envolvia em brigas.
Citou outros alunos, episódios que não esqueceu em 60 anos, como o dia em que eu fui a Chapeuzinho Vermelho numa peça de teatro. Lembramos que fiquei assustada com o “sangue” do lobo interpretado pelo Moacir Soares, feito de Ki-suco de groselha, a escorrer pelo assoalho quando a “vovó” dava a facada mortal e furava o saquinho de plástico.
Minha professora disse que se orgulha de mim, por ter estudado e conseguido reconhecimento profissional graças ao envolvimento da família.
Ainda agora, tarde da noite, enquanto escrevo este relato, escorrem lágrimas dos meus olhos lembrando do pai visionário que, mesmo iletrado, sonhava ver os cinco filhos formados na universidade — e viveu para nos ver a todos togados. Daqui a 10 dias vou encontrar a professora Celmira e contar dos relatos dos ouvintes que se emocionaram com sua entrevista e sua crença de que só a educação muda o mundo.




