
Sou uma noveleira confessa. Terminado o trabalho, sento-me no sofá para assistir ao Jornal Nacional, que continua sendo a melhor síntese do dia, e só levanto quando termina Vale Tudo — sem perder as cenas do próximo capítulo.
Desde que Débora Bloch foi escolhida para interpretar a vilã Odete Roitmann, nunca tive dúvidas de que ela daria conta de uma personagem tão inesquecível quanto repugnante. Débora é uma estrela versátil, carismática, capaz de interpretar qualquer personagem com a segurança dos que sabem fazer rir e chorar com a mesma competência.
Débora pode fazer série, filme, novela e programas de humor. Débora pode ser mocinha e pode ser vilã. Pode ser até coadjuvante, que vai iluminar a cena.
Que fique claro, não sou crítica de TV nem de cinema. Falo como espectadora.
Tinha dúvidas sobre Bella Campos no papel de Maria de Fátima, mas hoje tenho certeza de que ela está muito bem como a dissimulada filha de Raquel, que na primeira versão foi de Glória Pires.
Vilão que se preze tem de ser insuportável, e nisso Maria de Fátima consegue ser pior do que todos os outros candidatos ao posto. Porque Odete tem um lado divertido nas cenas calientes com namorados mais jovens, a quem ele compra com uma vida de luxo, sem sentimentalismo e sem autoengano.
Sua vida entre as quatro paredes da suíte do Copacabana Palace é mais convincente do que a da Odete de Beatriz Segall, que também se envolvia com rapazinhos, mas era mais contida. Maria de Fátima é malvada o tempo todo.
Aos meus amigos que insistem em fazer comparações com a primeira versão, querendo que tudo seja igual, recomendo sempre que relaxem. Novela é entretenimento. É para aliviar a tensão depois do trabalho. E se você quer que o remake seja igual, melhor assistir à versão original no Globoplay Novelas (o antigo canal Viva).
A trama de Gilberto Braga é de 1988. Logo, precisava ser atualizada com o que mudou no Brasil desde então, e Manuela Dias faz isso com maestria. É o caso das personagens Laís e Cecília, que agora adotam uma menina e mudam a vida de uma criança de orfanato. Na primeira versão, uma das duas teve de morrer porque o público não aceitava o casamento homoafetivo.
O que não mudou de 1988 para cá foi a percepção de boa parte da sociedade de que vale tudo para subir na vida — ainda que os vilões sejam punidos no final, mais para dar um recado do que por simetria com a realidade.
Um dos pontos altos de Vale Tudo, tanto na primeira como na versão atual, é mostrar que a corrupção e o preconceito não são exclusividade dos “vilões” do senso comum e de outras produções — o prefeito, o deputado, o senador. É como se os autores dissessem que esse desejo de se dar bem na vida privada, passando por cima dos outros, é o que explica as falcatruas na vida pública.