
Nada pode ser mais óbvio na declaração final da cúpula do Brics, realizada no Rio de Janeiro, do que a defesa do multilateralismo. Essa é uma das razões de existir esse acordo entre países que têm mais diferenças do que semelhanças entre si. O texto final é um arranjo diplomático que tenta marcar posição sem avançar demais para não contrariar os interesses dos sócios desse clube.
O comunicado final defende a solução de dois Estados (Israel e Palestina) para acabar com a crise no Oriente Médio. É uma posição histórica e confortável pelo Brasil, mas não para o Irã dos aiatolás, contrários à existência do Estado de Israel — e essa pode ser considerada a boa surpresa do documento.
Os líderes condenaram os ataques ao Irã (sem citar Estados Unidos e Israel), mas não falaram da da guerra da Ucrânia, país que vem sendo sistematicamente bombardeado pela Rússia (O R da sigla Brics) e resiste graças ao apoio da União Europeia.
A cúpula do Brics não tinha como fazer a defesa incondicional da democracia, porque parte desse aglomerado é formado por ditaduras. Tampouco conseguiria fazer uma declaração mais consistente sobre meio ambiente e sustentabilidade, porque dois deles, a China e a Índia, estão entre os maiores poluidores e do planeta — e outros, como Irã e Arábia Saudita, vivem da exploração do petróleo.
Cautelosos, os líderes do Brics evitam atacar abertamente e guerra comercial de Donald Trump, já que cada um negocia individualmente com os Estados Unidos uma forma de evitar o tarifaço, que está para entrar em vigor depois dos adiamentos.
Tampouco avançaram na ideia de substituir o dólar por outra moeda de referência nas negociações internacionais, para reduzir a dependência dos Estados Unidos. Trump ameaçou taxar em 100% das exportações dos países que aderirem à ideia de uma moeda própria do Brics para concorrer com o dólar.