
A oposição já descobriu que o melhor jeito de irritar o presidente Lula é falar mal de sua esposa Janja. A primeira-dama muitas vezes dá margem para as críticas, como fez em um encontro paralelo da reunião do G20, ao pronunciar o célebre "fuck you, Elon Musk".
No caso da suposta gafe cometida em Pequim, não foi a oposição externa, mas o "fogo amigo" que colocou Janja nas manchetes e nas redes sociais. A versão que que chegou à imprensa por linhas tortas dizia que Janja quebrou o protocolo para pedir que o presidente Xi Jinping controlasse o TikTok, porque estava permitindo a expansão da extrema-direita.
No dia seguinte, questionado sobre o episódio em uma entrevista coletiva, Lula se irritou com o vazamento e disse que foi ele quem puxou o assunto das redes sociais, pedindo a Xi Jinping que mandasse um homem de sua confiança ao Brasil para discutir a regulação das redes sociais. Nesse momento, Janja teria dito que a falta de controle nas redes está servindo como instrumento da violência contra crianças e adolescentes. E citou o caso da menina de Brasília que morreu depois de ser desafiada na internet a inalar desodorante.
Como um homem apaixonado pode editar uma cena para poupar a mulher amada, quem não estava lá precisou escolher uma das versões. Nesta terça-feira (20), o chanceler Mauro Vieira contou o que aconteceu em uma audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, onde esteve a convite dos senadores Espiridião Amin (PP-SC) e Sergio Moro (União PR).
— Foi dito o seguinte: que não é possível que se deixe, em plataformas digitais, que haja divulgação de temas de pornografia, de pedofilia e dos famosos desafios que correm nas redes digitais, e que levaram à morte de uma criança de 8 anos, há pouco tempo, em Brasília. Um desafio para inalar desodorante. Tem que haver algum tipo de controle. As plataformas têm que ter algum tipo de responsabilidade. Foi nesse sentido, única e exclusivamente, que se mencionou a questão na China — disse Mauro Vieira.
Janja pode ter ferido o protocolo ao usar a palavra, mas no mérito a primeira-dama tem razão. Já passou da hora de as plataformas digitais assumirem a responsabilidade pelos conteúdos criminosos que circulam em suas redes.
O caso da menina de Brasília não é o primeiro nem último de criança que morre por topar um desafio nas redes sociais. O estuprador de Taquara, que fez centenas de vítimas, também usava as redes para conquistar a confiança de meninas e depois as chantageava. Há casos de adolescentes que se suicidam por não conseguir lidar com o cyberbullying.
Lula não precisa de autorização de Xi Jinping nem da vinda de um homem de confiança dele para propor uma legislação sobre redes sociais. O que valer para o Instagram ou para o X valerá também para o TikTok e para redes que ainda nem nasceram. O que o presidente precisa é envolver o Congresso num debate responsável e conseguir os votos necessários para aprovar uma legislação que preserve a liberdade de expressão sem permitir o vale-tudo nas plataformas digitais.
Menos, Lula. Menos
No afã de homenagear a esposa, Lula repete o erro de Jair Bolsonaro, que concedeu uma série de medalhas à esposa Michelle. Lula condecorou Janja por mérito cultural, ao lado Alceu Valença, Fernanda Torres, Walter Salles, Xuxa, Marcelo Rubens Paiva, Chitãozinho e Xororó, Alcione e os falecidos Aldir Blanc, Beth Carvalho e Paulo Gustavo. Mérito cultural? Menos, Lula. Menos.