
Causou indignação entre juristas gaúchos a rejeição da proposta de concessão do título de doutor honoris causa da Universidade Federal Fluminense ao ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim. Um movimento de desagravo foi iniciado pelo ex-governador Tarso Genro e ganhou a adesão de advogados e juristas de peso, que assinaram nota de protesto.
A proposta de conceder o título de doutor honoris causa a Jobim foi apresentada pelo Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos, da UFF, mas o Conselho Universitário rejeitou a proposta por 49 a 13. O conselho é presidido pelo reitor, Antônio Carlos Nóbrega, e tem como membros representantes dos professores, dos alunos e dos funcionários.
Ninguém colocou em dúvida os conhecimentos jurídicos de Jobim. A justificativa pela posição contrária foi de que o ex-ministro fez oposição à Comissão da Verdade e à mudança na Lei da Anistia. Em 2010, Jobim disse que “não se poderia rever o acordo político que deu a possibilidade da transição política no Brasil, mudando a Lei da Anistia”.
— Me perguntaram por que fiz isso com outros advogados, juristas e professores. Eu disse que fiz isso porque o Jobim foi meu companheiro de governo, uma pessoa leal. Eu tenho certeza de que ele faria o mesmo se eu tivesse sofrido um ataque da extrema-direita dentro de um contexto de disputa política. Então, é uma forma de solidariedade e uma visão de mundo que me leva a ter solidariedade em momentos como esse — disse Tarso à coluna.
Confira a íntegra da nota
"Nota de Desagravo
A recente decisão do Conselho Universitário da Universidade Federal Fluminense, que negou a concessão do título de Doutor Honoris Causa ao ex-ministro Nelson Jobim, é motivo de profunda preocupação e merece ser revisada pelo colegiado acadêmico institucional competente.
Nelson Jobim tem uma trajetória pública amplamente reconhecida em defesa da democracia brasileira. Sua atuação como deputado constituinte foi fundamental na elaboração da Constituição Federal de 1988. Como Ministro do Supremo Tribunal Federal, contribuiu sem vacilação para o fortalecimento das instituições republicanas.
À frente dos Ministérios da Justiça e da Defesa, em Governos democráticos eleitos diretamente pelo voto popular, demonstrou compromisso inequívoco com a democracia, agindo com notável probidade diante de desafios complexos em momentos decisivos da nossa longa e incompleta transição.
A justificativa apresentada para a negativa do título, centrada em posicionamentos específicos de Jobim em relação à Comissão da Verdade e à Lei da Anistia, que alguns de nós podemos até discordar, faz uma leitura limitada e equivocada de questões complexas e multifacetadas, às quais suas atitudes como ministro ajudaram, nos respectivos governos a que serviu, a superar por dentro da normalidade institucional. Ignorar a amplitude de sua contribuição para a democracia e para a proteção dos direitos fundamentais é incorrer em uma injustiça histórica, que inclusive enfraquece o campo democrático, hoje mundialmente assediado por facções criminosas do neofascismo.
Consideramos que essa atitude não apenas desrespeita a trajetória e os relevantes serviços prestados por Nelson Jobim ao país, mas também enfraquece o papel das universidades como espaços de reconhecimento e valorização das contribuições democráticas fundamentais para a nossa sociedade.
É muito importante que as instituições acadêmicas sejam capazes de reconhecer, independentemente de divergências ideológicas e partidárias, figuras públicas que trabalham pela consolidação democrática do país. Nesse sentido, manifestamos nossa inconformidade com a decisão tomada, reafirmando a importância de manter vivos os valores democráticos e o compromisso com uma reflexão histórica mais justa e equilibrada.
Tarso Fernando Herz Genro – Ex-Governador do RS e ex-ministro de Estado
Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo – PPGCCrim PUCRS
Ingo Sarlet – Desembargador TJRS e PPGDir PUCRS
Lênio Luiz Streck – Advogado, PPGDir UNISINOS
Melissa Pimenta – Coord. PPGSeg UFRGS
Aury Lopes Jr. – Advogado, PPGCCrim PUCRS
Eduardo de Lima Veiga – Ex-procurador-geral de Justiça do MPRS
Marlene Inês Spaniol – PPGSeg UFRGS e ex-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Jayme Weingartner Neto – Desembargador do TJ-RS e PPGCCrim PUCRS
Arminio Jose Abreu Lima da Rosa – Desembargador do TJRS, ex-Presidente do TJRS e TRERS
Renato Sérgio de Lima – Diretor Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública"