
Há uma lei federal nos Estados Unidos que limita o poder do presidente de iniciar ou escalar conflitos militares sem autorização do Congresso. Chama-se War Powers Resolution (Resolução dos Poderes de Guerra). O objetivo principal da lei é evitar que o chefe do Executivo envolva os EUA em guerras sem consentimento explícito do parlamento, como ocorreu com o Vietnã. A legislação de 1973 obriga o presidente a notificar deputados e senadores até 48 horas após o início de uma ação militar.
Conforme o secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, afirmou neste domingo (22), os parlamentares americanos foram comunicados do bombardeio às instalações nucleares iranianas, no sábado (21), somente após os aviões B-2 terem deixado o espaço aéreo do país atacado — o que coloca Trump dentro das 48 horas previstas em lei.
Ainda assim, a oposição democrata tem criticado a falta de aprovação do Congresso. Os deputados Chuck Schumer e Hakeem Jefries afirmaram que o ataque seria "inconstitucional", exigindo votação no Congresso.
Alexandria Ocasio-Cortez, uma das principais vozes jovens do partido, chegou a afirmar que o ato poderia ser base para abertura de um processo de impeachment. Até entre republicanos houve críticas, baseadas na divergência com o estilo "America Firt", slogan do presidente — ou seja, que os assuntos internos americanos devem ser prioridades, não os do outro lado do mundo.
Sejamos sinceros: Trump repete George W. Bush, que foi à guerra com o Iraque, em 2003, sem a autorização do Congresso americano — e tampouco do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Foi uma operação diferente do ataque ao Afeganistão, que teve o aval do parlamento (também não teve autorização do órgão máximo da ONU, mas havia, naquele momento, uma legitimidade internacional implícita após os atentados de 11 de setembro de 2001). Pode-se argumentar legítima defesa. As ações militares contra o Iraque e, agora, ao Irã, são diferentes.
Há dois pontos interessantes na política doméstica americana a partir da ação de Trump. O primeiro é que, embora agrade à ala conservadora da Casa Branca, o presidente deixa de ser coerente com a doutrina "MAGA" (Make America Great Again), que defende o o isolacionismo e o não envolvimento dos EUA em problemas "alheios".
Mas também provoca críticas dos "falcões", que desejariam o envolvimento americano até a derrubada do regime dos aiatolás — algo que, até o momento, foi descartado pela fala do secretário de Defesa. Ficou claro que o objetivo não é uma mudança de regime, mas a neutralização da capacidade iraniana de produzir armamento nuclear.
Vale sempre lembrar que Trump se elegeu em 2016, prometendo acabar com as "guerras eternas" dos EUA — leia-se Afeganistão e Iraque. E, principalmente, não envolver os americanos em novos conflitos. Sua chegada ao poder representou uma guinada na doutrina estratégica, de maior isolacionismo e não envolvimento do país em temas globais — de forma mais radical do que o habitual, com a saída da Organização Mundial da Saúde (OMS), Acordo de Paris, e outros.
Sendo assim, por outro lado, ao atacar o Irã, Trump desagrada também àqueles eleitores que desejavam o não engajamento dos EUA em assuntos internacionais — aqueles que queriam que o foco fosse principalmente a política doméstica.
Trump agradou Benjamin Netanyahu, mas se afastou de boa parte de seus eleitores — os que querem um passo a mais (a mudança de regime) e aqueles que defendem o recuo, o não envolvimento.