
EUA e Irã, país atacado neste sábado (21) com a mais potente bomba americana — com exceção das nucleares —, nem sempre foram inimigos. O ponto de inflexão foi a Revolução Islâmica, em 1979, quando o xá Mohammad Reza Pahlavi, aliado estratégico do Ocidente, foi deposto por uma revolta popular liderada pelo aiatolá Ruhollah Khomeini. O mundo vivia a Guerra Fria, e o contexto da época só pode ser compreendido dentro dessa lógica: o Irã, embora não comunista, passou a se alinhar politicamente de forma autônoma e antiocidental, o que alarmou Washington. Além disso, emergia como uma República Islâmica xiita, num Oriente Médio dominado por potências sunitas, como a Arábia Saudita. A rivalidade entre Irã e sauditas daria início a uma espécie de Guerra Fria regional, que perdura até hoje.
Um dos episódios mais dramáticos da era pós-revolução foi a crise dos reféns, quando militantes iranianos invadiram a embaixada dos EUA em Teerã, mantendo 52 americanos como reféns por 444 dias — o que levou à ruptura oficial das relações diplomáticas entre os dois países. Ainda no contexto da Guerra Fria, e sob a lógica de que “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”, os Estados Unidos apoiaram tacitamente Saddam Hussein na Guerra Irã-Iraque (1980–1988). Ironias da política internacional: Saddam, o aliado de então, viraria o vilão dos anos 2000, sendo deposto e executado com o apoio direto de Washington.
Essa história, porém, está longe de ser linear — e menos ainda coerente. Em 1986, durante o governo Ronald Reagan, os EUA venderam armas secretamente ao Irã, apesar das sanções vigentes, usando os recursos para financiar guerrilheiros anticomunistas na Nicarágua, no escândalo conhecido como Irã-Contras. Nos anos 1990 e 2000, houve um recrudescimento da política americana: o Irã foi classificado como Estado patrocinador do terrorismo, recebeu duras sanções econômicas e foi isolado internacionalmente. Após os atentados de 11 de setembro de 2001, George W. Bush incluiu o Irã no chamado "Eixo do Mal". Curiosamente, a Al-Qaeda, autora dos ataques, nada tinha a ver com o Irã (xiita) ou o Iraque (laico), mas sim com o radicalismo sunita. Mesmo assim, o Irã tornou-se alvo da nova doutrina de segurança americana.
Sob o comando dos aiatolás — hoje representados por Ali Khamenei, herdeiro político de Khomeini —, o regime iraniano mantém como objetivo declarado a destruição do Estado de Israel. Por isso, é considerado por Tel Aviv como a cabeça do "Eixo da Resistência", uma aliança assimétrica que inclui grupos como o Hamas (em Gaza), o Hezbollah (no Líbano) e os Houthis (no Iêmen). Todos recebem apoio militar e financeiro do Irã, e são classificados por EUA, UE e Israel como organizações terroristas.
A controvérsia sobre o programa nuclear iraniano é menos antiga que a revolução, mas não menos explosiva. Em 2006, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) apontou evidências de atividades nucleares não declaradas pelo regime — levantando a suspeita de que o enriquecimento de urânio pudesse ter fins militares. Em 2015, no governo Obama, foi firmado o Acordo Nuclear (JCPOA) com seis potências mundiais (EUA, Reino Unido, França, Rússia, China e Alemanha), em que o Irã se comprometia a não ultrapassar os níveis de enriquecimento que permitiriam produzir uma bomba.
Quando assumiu, Donald Trump abandonou o acordo e retomou a política de "pressão máxima", impondo sanções e intensificando o confronto retórico e militar com Teerã. O alinhamento ideológico com o premiê israelense Benjamin Netanyahu acentuou o desgaste. Em 2020, os EUA ordenaram a eliminação de Qasem Soleimani, general iraniano de alto escalão, em um ataque de drone no Iraque.

O massacre de 7 de outubro de 2023, perpetrado pelo Hamas contra civis israelenses, tornou-se um novo ponto de inflexão. Em resposta, Israel bombardeou Gaza, atacou posições do Hezbollah e caçou líderes iranianos na Síria e no Líbano. Com o agravamento das tensões e novos relatórios da AIEA indicando que o Irã estaria perigosamente próximo de adquirir capacidade nuclear, Israel decidiu avançar numa estratégia de ataque preventivo. Mas, para alcançar Fordow — a instalação de enriquecimento de urânio construída sob uma montanha no centro do Irã —, era necessário o poder de destruição de uma bomba que apenas os Estados Unidos possuem: a GBU-57A/B MOP (Massive Ordnance Penetrator), a mais potente bomba antibunker não nuclear já construída.