
O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Os Estados Unidos, que até então não haviam se envolvido militarmente no conflito entre Israel e Irã, passaram a participar de forma ativa na noite de sábado (21), com um bombardeio a três instalações nucleares: Fordow, Natanz e Isfahan.
A coluna conversou com especialistas sobre quais as intenções dos americanos e como essa investida vinha se desenhando nos últimos dias.
Para o professor de Relações Internacionais na UniRitter, João Gabriel Burmann, o envolvimento dos americanos era esperado, porém, ela acreditava que o apoio se daria de outra forma e não por meio de ataque:
— Era esperado? Era. Mas acho que não dessa maneira, não com os ataques diretos às instalações nucleares, que acho que se concluiu um dos piores cenários que poderíamos ter. Um cenário pior do que esse, eu conseguiria imaginar só um ataque nuclear de Israel. Sem o auxílio dos Estados Unidos para conseguir desabilitar essas instalações nucleares, seria utilizar uma munição de uso tático, de rendimento menor nuclear. Não chegamos a esse caso, mas tivemos um dos piores cenários, que é a ação direta dos Estados Unidos.
Para o professor de Relações Internacionais da ESPM-SP, Roberto Uebel, a participação americana era aguardada e tem relação com os interesses de Trump na indústria bélica:
— Era esperado porque os Estados Unidos são o grande aliado de Israel, isso é evidente. E tem outro ponto: por que uma guerra agora? Indústria militar. Os Estados Unidos precisam de guerras a cada 10 ou cinco anos para continuar gerando sua indústria bélica. Acho que o envolvimento dos EUA não é apenas uma questão geopolítica, até porque contradiz um pouco o Trump. Ele disse na campanha que não ia entrar em conflito. Entrou em menos de meio ano. Mas acho que tem uma pressão também da indústria bélica norte-americana para entrarem na guerra.
O professor Vitelio Brustolin, especialista em relações internacionais e pesquisador de Harvard, destaca que nos últimos dias os Estados Unidos já apresentavam movimentações que poderiam indicar envolvimento no conflito, com informações do serviço de inteligência alertando para os planos de Israel de atacar instalações nucleares e a intensificação de presença militar e de porta-aviões americanos na região:
— Agora, o timming exato e a coordenação específica com Israel só se tornaram públicos na última semana. O Trump tinha anunciado que tomaria uma decisão em até duas semanas, mas não sabíamos exatamente se os Estados Unidos passariam apenas da defensiva para a ofensiva ao lado de Israel, se forneceriam outros meios. Eu mesmo já tinha feito análises, e outros também, de que os Estados Unidos poderiam fazer um ataque pontual, bombardeio das principais instalações para as quais Israel não tem os meios necessários para atingir profundidade.
O que mudou no discurso de Trump

Na quinta-feira (19), Trump havia dito que decidiria a entrada efetiva em duas semanas. Contudo, 48 horas após o anúncio, os americanos entraram no conflito. Burmann pondera:
— Acredito que internamente tem toda uma correlação de forças que Trump não conseguiu segurar. Além disso, temos que considerar a força do próprio Netanyahu, que tem as suas maneiras de pressionar internamente. Existe todo um bloco, não só legislativo, mas da sociedade, de empresas que são bem relacionadas com o governo de Israel nos Estados Unidos, que têm essa capacidade de fazer alguma pressão. E outra hipótese, muito importante que sempre consideremos, que são as negociações, que elas tenham dado certo, mas não diretamente com Israel, tenham ocorrido com a Rússia, eventualmente também com a China, e tenha sido dado um sinal verde para esse ataque.
Já Uebel acredita que os americanos viram uma possibilidade de desestabilizar o regime iraniano.
— É um objetivo desestabilizar o regime? Pode ser que seja. Assim como pode ser um objetivo também acabar com o programa nuclear iraniano e isso ser uma consequência. O governo dos Estados Unidos não é ingênuo, eles sabem que o Irã poderia fechar o Estrito de Ormuz. Provavelmente eles já conseguiram algum estoque de petróleo, têm as outras fontes, mas me parece que eles vão apostar o máximo que puderem na queda do regime. Isso me ficou muito claro na fala do presidente de Israel, Isaac Herzog, que disse que não concorda que a operação seja para mudar o regime do Irã, mas que se isso for uma consequência, é uma consequência abençoada.
Brustolin relembra que, na quinta-feira, Trump disse que tomaria uma decisão em até duas semanas:
— Ele foi pressionado por conselheiros como o Steve Bannon e o Tucker Carlson. Bannon era contra esse ataque, por causa das experiências negativas no Iraque e no Afeganistão. Inclusive, o Trump era um crítico. Agora, o que o ele está fazendo? Tentou por cinco rodadas de negociação pressionar o Irã para fazer um acordo. Mas Trump queria um acordo em que o Irã abrisse mão do seu programa nuclear e também, provavelmente, de parte dos seus mísseis, porque o Trump alegava já no primeiro mandato que o programa de mísseis do Irã era imenso, de fato se mostrou um programa efetivo, tem pelo menos três mil mísseis e o Irã já vai chegar a 10 mil mísseis. 10 mil mísseis seria um poder idêntico equivalente a duas bombas atômicas de médio porte.