Toma proporções alarmantes o impasse entre o governo federal e o Congresso em torno das medidas necessárias para frear a trajetória explosiva dos gastos e da dívida pública brasileira. Há poucos dias parecia existir um alinhamento entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre, para o endereçamento de providências consistentes para atingir as metas fiscais de 2025 e 2026 e sinalizar, para os próximos anos, um itinerário mais sustentável das contas.
A relutância de governo e Congresso em assumirem responsabilidades eleva os riscos à frente de uma crise econômica
No domingo, após uma reunião do trio com líderes partidários, foi anunciado um acordo para um pacote alternativo à elevação original do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que teve forte resistência de congressistas e empresários. Alcolumbre classificou o encontro como histórico e assegurou que o Legislativo estava "junto para buscar uma solução estrutural em relação às contas do Brasil e ao equilíbrio fiscal".
Menos de 24 horas depois o clima já era outro e o presidente da Câmara dizia inexistir compromisso do Congresso em aprovar as novas medidas. Em novo capítulo da escalada do dissenso, Motta avisou ontem que vai pautar o pedido de urgência para o projeto que derruba o novo decreto do governo, que mantém a elevação do IOF, mas em percentuais mais brandos, e traz outras iniciativas, como a tributação de 5% para as letras de crédito imobiliárias (LCIs) e agropecuárias (LCAs) e a majoração de alíquotas das bets de 15% para 18%.
Oficialmente, a razão da revolta dos congressistas reside na insistência do governo em tentar o equilíbrio apenas com mais arrecadação, sem um corte robusto de gastos. O Planalto resiste, sim, em discutir medidas duras mas que parecem inescapáveis, como as relacionadas aos pisos constitucionais da saúde e da educação e à vinculação de despesas previdenciárias ao salário mínimo. Teme pela popularidade às vésperas de um ano eleitoral. Sem rever de forma estrutural o crescimento das despesas, o aumento das receitas só com mais impostos _ opção cada vez mais rechaçada pela sociedade _ é apenas um paliativo. Chama atenção, ainda, o alheamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mais envolvido com viagens internacionais do que nos problemas internos urgentes.
Mas há também flagrante dissimulação do Congresso, que da mesma forma obstaculiza iniciativas que significariam racionalização de despesas, como os projetos para reduzir os supersalários e reformar a previdência dos militares, ambos parados no Legislativo. Senadores e deputados igualmente não cogitam abrir mão do excrescente volume de emendas parlamentares. O atraso da liberação de dinheiro deste ano, aliás, é outro fator por trás da revolta dos congressistas. Com tantos desacertos, é de se desconfiar se será levada adiante a ideia que parecia consensual de cortar 10% dos incentivos fiscais vigentes, que hoje chegam a R$ 587,4 bilhões.
A relutância de governo e Congresso em assumir suas responsabilidades eleva os riscos à frente de uma crise econômica conjugada com inflação pressionada e juro nas alturas. Passa da hora de encerrarem o jogo de empurra que disputam à beira do abismo.