O mais revoltante do escândalo das aposentadorias surrupiadas no Instituto Nacional do Seguro Social é ver integrantes do atual governo e apoiadores da administração anterior tentando jogar o abacaxi no colo do oponente. Ambos são responsáveis. Os descontos ilegais são antigos e vinham se avolumando ao longo dos anos sem que os gestores do INSS e do Ministério da Previdência tomassem qualquer providência para interromper o estelionato. Houve, no mínimo, má gestão, negligência e omissão imperdoável em relação a suspeitas e denúncias que já vinham ocorrendo há vários anos.
Na tentativa de manter o apoio do PDT, Lula nomeou como novo titular do Ministério da Previdência um diretor da autarquia que também teve conhecimento das irregularidades sem fazer qualquer esforço para corrigi-las
Nesse contexto, tardou demais a demissão do ministro Carlos Lupi, só confirmada na última sexta-feira, mais de uma semana depois da operação que escancarou as fraudes. Mesmo sem ser acusado de participação direta no esquema de descontos ilegais em favor de associações e sindicatos criminosos, ele reagiu com indiferença e, num primeiro momento, até tentou defender os assessores afastados pela ação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União. E acabou se desgastando irremediavelmente depois que o presidente da República nomeou um novo presidente para o INSS sem consultá-lo.
No caso específico desse estelionato praticado por associações e sindicatos desonestos contra beneficiários da Previdência Social, é elementar que os servidores indiciados e os administradores públicos omissos, inclusive o próprio ministro da pasta, deveriam ter sido afastados imediatamente de suas funções até que as investigações fossem concluídas e as responsabilidades, apuradas. Mas o atual chefe do Executivo, como a maioria de seus antecessores diante de situações semelhantes, hesitou, desconversou e fingiu ignorar até mesmo as chantagens explícitas.
Só na última sexta-feira substituiu o ministro. Mas a emenda não parece muito melhor do que o mau soneto. Na tentativa de manter o apoio do PDT, Lula nomeou como novo titular do Ministério da Previdência um diretor da autarquia que também teve conhecimento das irregularidades sem fazer qualquer esforço para corrigi-las. A solução improvisada evidencia também malefícios para a sociedade brasileira do arranjo político-institucional que se convencionou chamar de “presidencialismo de coalizão”.
Admitido pela própria classe política como necessário para garantir a governabilidade no país, este pacto espúrio vem se revelando inquestionavelmente nefasto ao exercício saudável da democracia representativa. Por conta dessa dependência para governar, sucessivos presidentes da República, de diferentes correntes ideológicas, acabam se transformando em reféns de lideranças políticas pouco escrupulosas, que, invariavelmente, exigem cargos, verbas públicas e nacos do poder em troca de um apoio parlamentar nem sempre confiável.
Além de frustrar os cidadãos, a submissão presidencial ao jogo de interesses políticos fragiliza o próprio governo, como se pode constatar na mobilização de oposicionistas pela abertura de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar os desmandos previdenciários. Também aí fica visível o oportunismo resultante da polarização radical que continua atrapalhando o país.