
A entrevista publicada pela coluna com o gaúcho Marcio Pochmann, presidente do IBGE, já mencionava as críticas dos servidores do órgão. Mesmo assim, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE (Assibge) fez questão de ser ouvido. O diretor da entidade, Bruno Mandelli, avalia que as mudanças pretendidas levantam dúvidas quanto futuro da instituição. A discordância mais recente, a proposta de mudança no estatuto, cria, segundo Mandelli, instabilidade que pode afetar a autonomia do corpo técnico, valor que considera inegociável.
Quem a Assibge representa?
É um sindicato nacional dos servidores do IBGE, representante tanto dos servidores ativos quanto dos aposentados e tanto dos efetivos quando dos temporários. Temos uma base de cerca de 6 mil filiados.
Qual o ponto de discordância em relação à mudança no estatuto?
Identificamos que as mudanças pleiteadas pela direção caminham no sentido de concentrar poder na presidência do IBGE em detrimento das áreas técnicas, que perderiam a autonomia. A minuta retira do estatuto a previsão de como seriam estruturadas as diretorias do IBGE. Hoje, são seis diretorias, com estrutura que é a mesma há mais de 30 anos.
Uma das propostas é criar uma diretoria-geral, certo?
Sim, criaria um degrau. E sem determinação, o presidente do IBGE teria liberdade para, a qualquer momento, criar novas diretorias, fundir, dividir, trocar atribuições, transferir cargos, por meio de portaria. A estrutura que há 30 anos é muito estável poderia ser trocada livremente pelo presidente do IBGE. Uma certa estabilidade é necessária para ter autonomia no trabalho técnico. O entendimento, não só nosso, é bastante consensual no corpo técnico da instituição, é de que as diretorias que representam as áreas técnica estão sendo fragilizadas, enquanto a presidência, fortalecida.
A Assibge é contra qualquer mudança no estatuto ou contra a proposta?
A proposta apresentada tem pontos muito graves. Então, não estamos trabalhando para emendar a proposta colocada. Mas não temos uma objeção, em geral, à mudança de estatuto. Se não houver elementos que concentrem poder na direção, estaríamos abertos a debater.
Não reconhecem a justificativa de que a revisão visa a permitir a modernização do IBGE, para que se torne coordenador do sistema estatístico nacional?
A mudança proposta não tem nenhum traço de modernização. É bastante arcaica. O presidente fala muito de era digital, mas não tem nada nesse sentido refletido na proposta. Entendemos que o IBGE deve ser fortalecido como coordenador do sistema nacional de estatística, mas, em grande parte, depende de orçamento, de quadro de pessoal e de arcabouço legal. O IBGE tem, de fato, dificuldades de exercer o papel de coordenador, mas a mudança de estatuto não é o caminho.
As discordâncias com a atual gestão afetam o trabalho do IBGE?
Entendo que os servidores seguem trabalhando com máximo esforço, mas cria clima ruim, institucionalmente, que, sim, tem impacto na instituição.
Há risco para a credibilidade?
Se houvesse qualquer indício de problema de credibilidade nos dados, nós apontaríamos. Não queremos que nossas críticas coloquem dúvida sobre os dados que são produzidos hoje pela instituição. Agora, o debate mais geral sobre a progressiva fragilização do IBGE, seja do ponto de vista institucional ou orçamentário, pode levantar dúvidas em relação ao futuro, que independe até do atual presidente. O processo de fragilização do IBGE pode gerar dúvidas sobre a qualidade dos dados no futuro.
Qual valor do IBGE é inegociável?
O princípio da autonomia.
*Colaborou João Pedro Cecchini




