
Na busca de soluções para o problema do tabagismo, não faltaram queixas sobre a "perda da liberdade" dos fumantes, mas houve restrição na publicidade e na atividade com foco no benefício público. Conforme uma pesquisadora, esse é o caminho para enfrentar, também, os problemas criados pelas redes sociais.
— Começou com uma abordagem individual, era preciso ter "força de vontade" para parar de fumar. Mas era um problema coletivo que precisava de regulação, e se passou a proibir em determinados lugares porque é um comportamento tóxico e contagioso — lembra Marie Santini, fundadora e diretora do Netlab, o Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Com as redes sociais, afirma a pesquisadora, acontece o mesmo: um usuário contagia o outro e toda a sociedade é prejudicada.
— Havia todo um fetiche do cigarro, que não teria sido barrado sem regulação. Hoje existe o fetiche da rede social, as pessoas acham que não podem viver sem, existe um vício, a pessoa acorda e vai para as redes, dorme e faz isso, é muito parecido com o problema do cigarro — diagnostica Santini.
Conforme a pesquisasdora, até as estratégias das indústrias de cigarro são semelhantes às das big techs para evitar a regulação:
— É o lobby, a deslegitimação dos pesquisadores, a geração de falsos dissensos, enfim, são todas estratégias documentadas sobre cigarro que estamos vivendo de novo com a desinformação nas redes sociais.
Uma das diferenças, ressalva Santini, é a concentração, tanto em número de empresas interessadas em que nada mude e proporção entre fumantes e usuários de redes sociais. O que era minoria virou maioria.
— A gente pode aprender com a indústria do cigarro. Enfrentamos esse desafio que fazia milhares de pessoas morrerem de câncer de pulmão com um trabalho de anos, mostrando como era ruim, sempre baseado em ciência e em dados. Não foi retirada a liberdade de fumar das pessoas, mas não podem contagiar as outras com esse comportamento tóxico — projeta.
E se as redes sociais são um problema, a desinformação é ainda pior, compara Santini:
— É o equivalente ao cigarro falsificado. Vende produto de baixa qualidade, fazendo contrabandos e outros crimes. A desinformação está virando uma indústria em que estão envolvidas organizações criminosas, com ligações políticas. Só que elege candidatos, legitima pessoas.
A pesquisadora observa que as redes sociais têm pontos positivos, de aproximar pessoas, agilizar contatos, oferecer conveniências:
— Isso não significa que tudo será permitido. Porque é inaceitável enganar o consumidor, manipular pessoas e levá-las à morte e estimular comportamentos tóxicos, de ódio. Não podem ser as únicas empresas do mundo que não se responsabilizam sobre os produtos e serviços que vendem.