O jornalista Rafael Vigna colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
Detentora de marcas como Melissa, Ipanema e Rider, a companhia gaúcha Grendene vem driblando cenários econômicos interno e externo instáveis. No segundo trimestre de 2024, apesar de R$ 480,3 milhões em receita líquida, alta de 3,6% em relação ao segundo trimestre de 2023, o resultado líquido veio em baixa e totalizou R$ 61 milhões. À coluna, Alceu Albuquerque, diretor financeiro e de relações com investidores da Grendene, detalha as causas e efeitos do resultado. As fábricas no Ceará têm ociosidade, e a Grendene aguada uma melhora dos indicadores de juro e inflação para expandir, ainda que sem planos para o Rio Grande do Sul.
O que chama a atenção no resultado do segundo trimestre?
O segundo trimestre foi muito parecido com os últimos dois ou três trimestres. Ou seja, um cenário bastante desafiador, tanto nacional quanto internacional. No mercado inteiro, temos uma deterioração do cenário macroeconômico, que pressiona o consumo, a taxa de juro e a inflação de alimentos. Mesmo diante do cenário adverso, conseguimos registrar crescimentos em receita e lucro brutos e margem.
O Ebit recorrente aumentou 47,6% e o resultado líquido recorrente caiu 27,1% em relação ao segundo trimestre de 2023. Por que?
O aumento do Ebit recorrente é fruto do incremento da receita líquida, que cresceu 3,6%. É fruto também de uma redução de custos e despesas. Receita maior e menores custos e despesas ajudam o resultado operacional da empresa. Já a queda no lucro líquido recorrente é em função do resultado das nossas aplicações. A Grendene tem cerca de R$ 1,3 bilhão de caixa. Gerou menos resultado financeiro, porque em maio do ano passado fizemos uma distribuição extraordinária de dividendos em um montante de R$ 1 bilhão, o que fez o volume de caixa aplicado reduzir. Antes, era de cerca de R$ 2 bilhões.
Neste ano, a Grendene atingiu R$ 1 bilhão em receita líquida antes do ano passado, e ainda tem um crescimento de 9,2% em lucro bruto em relação ao primeiro semestre de 2023. O que mudou?
Reajustamos um pouco o preço, o que naturalmente leva a uma receita maior. Mas o que mais contribuiu para o aumento do lucro bruto foram aumento da receita e redução de custos. Observamos uma redução significativa nos custos das matérias-primas, principalmente de resina de PVC, que é a nossa principal matéria-prima. Neste ano, vem apresentando estabilidade. Mas, como existe uma demora entre a queda da matéria-prima no mercado e o impacto nos custos de produção, continuamos capturando os benefícios da redução de preços. Daqui pra frente, não vemos oportunidades significativas de ganho adicional no componente de matéria-prima.
Como está o desenvolvimento da Grendene em um período maior?
O volume de pares vendidos, especialmente no mercado interno, ainda está abaixo do pré-pandemia. Já o mercado internacional vem sofrendo com inflação alta e taxa de juro elevada, o que traz um desaquecimento da economia global e um consumo menor, especialmente nos Estados Unidos, que é um grande destino das exportações brasileiras e da Grendene. Mas cerca de 60% das exportações da Grendene vão para a América Latina. Vemos Argentina, Peru e Colômbia passando por problemas políticos e econômicos, o que vem impactando nos volumes exportados.
O cenário macro é o que mais impacta?
Sem dúvida. Hoje, a Grendene tem capacidade para produzir 250 milhões de pares por ano. E ano passado fizemos 150 milhões de pares. Ou seja, temos capacidade, temos produtos, falta o consumo deslanchar. O cenário macro vem atrapalhando bastante as vendas.
O que falta para as vendas deslancharem?
As condições macroeconômicas têm de melhorar. Taxa de juro e inflação recuarem. A confiança do consumidor tem de melhorar também, porque muita gente está deixando de gastar ou porque não tem dinheiro ou porque está insegura em relação ao futuro. Então, é muito mais uma questão macroeconômica do que da Grendene.
Como a Grendene foi afetada pela enchente no RS?
Fisicamente, não foi impactada. Toda a nossa produção está localizada no Ceará. Em Farroupilha, temos só as sedes administrativa e de desenvolvimento de produtos e a matrizaria. Ainda assim, a unidade de Farroupilha não foi impactada. Tivemos cerca de 15 colaboradores impactados. Ajudamos naquilo que era necessário. Auxiliamos também as vítimas da enchente com doações de calçados, vestuários, cestas básicas e água. Utilizamos as nossas unidades no Ceará para coletar doações e trazer para o Rio Grande do Sul. As vendas no Rio Grande do Sul representam historicamente no segundo trimestre cerca de 3,5% a 4%. Então, é um percentual relativamente baixo. Tivemos algum impacto nas vendas, mas não elevado.
Tem planos de expansão para o Rio Grande do Sul?
Não. A produção está no Ceará. Terminamos uma ampliação na unidade de Crato no início deste ano, que aumentou a nossa capacidade para produtos de EVA. Então, temos uma capacidade ociosa. Podemos crescer sem a necessidade de novos investimentos. No curto e médio prazo, para o Rio Grande do Sul, não temos nenhuma expectativa de novos investimentos.
*Colaborou João Pedro Cecchini